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2007-04-02

Por Lúcio Flávio Pinto*

A importância do assunto me impôs publicar fora da seção específica uma segunda mensagem que me foi enviada por Johannes van Leewen. Ela foi motivada por matéria da última edição do Jornal Pessoal, que "tocou diversos aspetos da ocupação (invasão, conquista) agrícola da Amazônia". O Coordenador do Núcleo Agroflorestal do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), de Manaus, decidiu se manifestar por achar que "o melhor entendimento de certos aspectos técnicos pode melhorar o debate". Em seu entendimento, o dendê "dá verdadeiras possibilidades para a inclusão social. Os casos da Malásia e Indonésia mostram isso claramente. Acredito que no Brasil as grandes empresas não são a favor, mesmo que algumas já trabalhem parcialmente com agricultores familiares. Do outro lado há o Ministério de Desenvolvimento Agrícola, que pressiona, e pode dar incentivos fiscais". Mas, lamenta o pesquisador, "o MDA não parece ser uma organização muito eficaz. Por isso o debate público é muito importante". Ele constatou, surpreso, "que no CPATU (Embrapa-Belém), com tantos especialistas agroflorestais (meus colegas), ninguém parece estar estudando as opções para o dendê na pequena propriedade".

Segue-se a carta de Leewen e, em seguida, minha resposta.

O último Jornal Pessoal (edição 387) é muito feliz quando chama a atenção para as importantes mudanças que começam a ocorrer na agricultura da Amazônia. Neste contexto gostaria de comentar a "onda de energia verde" (artigo Energia e o plantio da seringueira, mencionado na mesma edição. O Jornal Pessoal enumera criticamente diversas razões para o entusiasmo pela crescente onda de energia verde, uma delas: "as plantas locais serão privilegiadas".

De fato, não há espécies locais para privilegiar nos plantios para energia verde. Apenas há fundos para pesquisar espécies nativas de possível interesse no futuro, um futuro provavelmente bem distante, se chegar. No atual estado de conhecimento, as únicas espécies de interesse para a energia verde são duas exóticas: o dendê, para o biodiesel, e a cana-de-açúcar, para o etanol. O dendê possibilita a participação da agricultura familiar, a cana-de-açúcar não. O dendê é uma palmeira africana (não é nativa como escreve a mesma edição do Jornal Pessoal comentando um artigo de Hélio Jaguaribe), que chegou ao Brasil junto com os escravos. Desde então, foi cultivada na Bahia, por agricultores familiares.

Faz meio século que começou o cultivo do dendê no Pará, em grande escala, por empresas que combinam extensas plantações com fábricas para a extração do óleo. (Originalmente considerava-se que uma fábrica precisava de uma plantação de pelo menos cinco mil hectares, atualmente admitem-se também "mini-usinas" abastecidas por áreas de 500 hectares de dendê.) O exemplo da Ásia (e o da Bahia) mostra que é possível, ou até melhor, que a empresa se limite à extração do óleo dos cachos de dendê produzidos por agricultores familiares. Isso se explica pelo tipo de planta usada neste caso.

O dendê é uma palmeira de grande porte para a qual a colheita e a manutenção do plantio não se prestam facilmente à mecanização. Sem mecanização, grandes áreas contíguas não resultam, necessariamente, em uma economia de escala. Pelo contrário, grandes áreas de monocultura facilitarão a propagação de doenças e pragas. Além disso, as palmeiras são plantadas com grande distância entre elas (na ordem de nove metros). Nos primeiros anos, as plantas jovens não ocupam esse espaço todo. O agricultor familiar sabe usar esse espaço ocioso bem melhor que a grande empresa especializada. A cana-de-açúcar é um caso bem diferente.

Aqui não se trata de plantas muito grandes, separadas umas das outras, que precisam de um tratamento individualizado, mas de uma cobertura vegetal fechada e contígua, que facilita o tratamento e a colheita mecanizados. Assim sendo, a participação de agricultores familiares, em novos plantios de cana-de-açúcar, é pouco provável. Neste aspecto, a cana-de-açúcar não é diferente da soja, outra cultura que avança na Amazônia e que aumenta a exclusão social.

O artigo "Látex invisível", do mesmo Jornal Pessoal, parece crítico acerca do plantio da seringueira "fora da terra nativa da Hevea brasiliensis" "no Maranhão ou no Espírito Santo". Infelizmente, a experiência ensina que, salvo raras exceções, as plantações de seringueira não dão certo em sua área de ocorrência natural, a Amazônia. Os programas PROBOR (1972-1986) que financiavam o plantio da seringueira na Amazônia resultaram num fracasso retumbante, equívoco que, segundo o falecido professor Benchimol (1989, p. 95), custou um bilhão de dólares ao erário.

Nunca vou esquecer o que vi durante uma visita a um plantio de seringueira, próximo a Manaus, propriedade de uma empresa que levou muito a sério seu projeto agrícola, que lhe permitia certos incentivos fiscais. Visitei uma área de 1.000 hectares, com manutenção impecável, o solo coberto, por completo, por uma leguminosa, assistência técnica de alto padrão, administração séria (um dos dirigentes da empresa passava a cada semana alguns dias no empreendimento agrícola) e outras atividades agrícolas muito bem sucedidas. A plantação não produzia nada, só havia, a perder de vista, seringueiras minguando e morrendo.

A explicação: com algumas centenas de árvores por hectare - o normal para uma plantação de seringueira - a doença chamada mal-das-folhas torna-se muito grave e condena a produção. Na floresta natural, onde há apenas algumas seringueiras por hectare, a doença está presente, mas não causa danos graves. Temos aqui o lado difícil da tão jubilada biodiversidade: muitas espécies da floresta diversificada não se prestam bem para a monocultura, uma vez que a monocultura facilita sobremaneira a atuação de seus inimigos naturais. Conseqüentemente, as principais plantações de seringueira se encontram fora de sua área de ocorrência natural, em países onde essa doença não ocorre (Ásia) ou em locais, onde a menor umidade do ar dificulta o ataque deste fungo, como nos estados de São Paulo e Mato Grosso.

Benchimol, S.. 1989. Amazônia: planetarização e moratória ecológica. São Paulo: CERED, 144p.

Minha resposta
Convém esclarecer, desde logo, que Hélio Jaguaribe foi quem nacionalizou o dendê, planta africana para cá transplantada. Apenas o citei, sem me ater a algumas barbaridades que ele cometeu, devidamente corrigidas em alguns artigos, como o de Aníbal Beça.

Há muito tempo deixei de ter qualquer ilusão sobre o plantio homogêneo de seringueira na Amazônia, capaz de ter escala comercial competitiva, conforme verificará quem consultar a coleção deste jornal (tenho batido continuamente no mito de que perdemos a hegemonia no setor porque os ingleses contrabandearam as sementes do Tapajós, quando a saída pelo porto de Belém foi regular, legal).

Nesse campo, acho que a ecologia derrotou a região: embora nativa da Amazônia, a seringueira só é viável na terra nativa no grau de dispersão natural da floresta nativa heterogênea. Warren Dean demonstrou essa verdade no livro sobre a borracha, que comentei na mesma época em que foi lançado, no final da década de 80. Portanto, não reivindiquei na nota o cultivo racional de seringueira na Amazônia. Pelo contrário: procurei indicar que o projeto em Carajás não tem base sólida. São sementes ao vento. Os industriais do látex não olham mais para a Amazônia. No caso, olham para o Maranhão e Espírito Santo.
* Jornalista, editor do Jornal Pessoal
(Adital, 30/03/2007)
(*) Nota da redação: O referido artigo pode ser lido em: * Jornalista

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