A herança deixada pelos invasores de pelo menos quatro terrenos particulares ocupados em janeiro - e reintegradas aos donos pela Justiça - é preocupante: centenas de árvores nativas derrubadas, escombros de barracas, vertentes poluídas e muito lixo espalhado.
O terreno da família Pozzer, na 3ª Légua, por exemplo, é o mais devastado. Dos nove hectares invadidos, o proprietário Ademir Pozzer calcula que cinco foram desmatados. No dia seguinte à saída dos invasores, em 21 de março, ele reconstruiu a cerca, mas ela foi novamente derrubada por pessoas em busca de lenha.
- Acho que vou construir um portãozinho para quem quiser roubar lenha. Pelo menos não terei de ficar consertando a cerca toda hora - diz, resignado.
Ontem (29/3), ao percorrer o terreno para recolher os dejetos, o agricultor alisava os troncos das árvores que restaram e apontava para os tocos das que foram cortadas.
- Olha só isso (referindo-se a um toco): uma cerejeira dessas demora décadas para crescer. Eles vieram com o machado e destruíram tudo em um mês - reclama.
O cenário é parecido nas demais ocupações reintegradas. Gelson Adamatti, dono de seis hectares invadidos no Santa Corona, reclama que 80 eucaliptos foram cortados e vendidos pelos invasores. Além disso, relata que sete pinheiros foram derrubados, bem como o mato que delineava o terreno.
- Não podemos nem podar um pinheiro. Eles (os invasores) podem cortar à vontade que não acontece nada - avalia.
Na invasão do bairro Consolação, o estrago não foi diferente. Antônio Nelmo Castilhos, da ANC Empreendimentos Imobiliários, conta que os ocupantes deixaram em seu terreno uma grande quantidade de lixo, cortaram mata nativa e aterraram vertentes.
Quem teve menos trabalho foi o dono da área no São Vitor Cohab. O terreno foi terraplenado, cercado e gramado. Como originalmente não haviam árvores, apenas a retirada do lixo garantiu a recuperação.
Órgãos ambientais ainda pesquisam os danos
Apesar da visível destruição causada pelos invasores, os órgãos de fiscalização ambiental ainda trabalham no levantamento dos danos nas quatro áreas reintegradas. Aguardando laudos técnicos, o Ministério Público (MP) pretende responsabilizar penalmente tanto os líderes dos invasores quanto pessoas ligadas à União das Associações de Bairros (UAB), denunciadas por incentivar os movimentos.
Segundo a promotora Janaína de Carli dos Santos - titular da 1ª Promotoria de Justiça Especializada e responsável por denunciar crimes ambientais na cidade -, as áreas desmatadas terão de ser recuperadas por quem for responsabilizado. Caso isso seja impossível, os donos das terras podem ser indicados para reflorestar as terras.
De acordo com o comandante do pelotão da Polícia Ambiental de Caxias do Sul, tenente Aécio Ramos Mendonça, as áreas já foram examinadas, mas ainda não há dados conclusivos. O número de árvores cortadas, por exemplo, será calculado estatisticamente com a ajuda de técnicos do Inventário Florestal do Estado. O comandante pretende concluir o inquérito nas próximas semanas e entregá-lo ao MP.
- Além da análise do dano ambiental, no inquérito também vamos apontar os responsáveis, que são os líderes das invasões - relata o tenente.
O que diz a lei
Confira o que diz a Lei nº 9.605, a Lei dos Crimes Ambientais
Art. 38 - Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação (...).
Pena - Detenção de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas.
Art. 50 - Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues, ou objeto de especial preservação.
Pena - Detenção, de três meses a um ano, e multa.
Art. 51 - Comercializar motosserra ou utilizá-la em florestas e nas demais formas de vegetação, sem licença ou registro da autoridade competente.
Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.
Art. 54 - Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora.
Pena - Reclusão de um a quatro anos e multa.
MP estuda processos semelhantes
Segundo a promotora Janaína de Carli dos Santos, no Ministério Público (MP) de Caxias do Sul há vários processos semelhantes aos que serão abertos em função das recentes invasões. Um deles é referente à área onde hoje é o loteamento Monte Carmelo, invadida no final de 2003.
De acordo com a promotora, o processo ainda não foi encaminhado à Justiça porque a área ainda não foi regularizada pela prefeitura.
- O poder público será solicitado a sanar o dano ambiental causado pelo desmatamento do Monte Carmelo. Pediremos que plantem árvores no local e também recuperem outras áreas - adianta Janaína.
O secretário municipal do Meio Ambiente, Ari Dallegrave, disse que o plantio de árvores faz parte da política ambiental do município e que não haverá problema em cumprir o pedido do MP.
(Jornal Pioneiro, 30/03/2007)