O controle eficaz da produção de plutônio em reatores nucleares é uma maneira de se restringir o uso deste elemento radioativo para a construção de armas nucleares. Mas os métodos de monitoramento geralmente dependem da presença de inspetores, que nem sempre têm acesso completo às usinas.
Uma alternativa, no entanto, prescinde dos inspetores e fornece um retrato fiel do que se passa dentro do reator, flagrando qualquer possível desvio de plutônio para outros fins: o uso do detector de neutrinos. E é precisamente nessa área que o Brasil se prepara para dar sua primeira contribuição ao controle do uso militar da energia nuclear.
O Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) acaba de anunciar a construção de um detector de neutrinos nas proximidades das usinas de Angra dos Reis (RJ). O detector terá financiamento de R$ 1 milhão da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e será a primeira aplicação na área de neutrinos no país, de acordo com João dos Anjos, pesquisador do CBPF e coordenador do projeto, que deverá ser concluído em dois anos.
O equipamento será instalado em um laboratório subterrâneo a cerca de 60 metros da usina. O projeto também é coordenado pelos pesquisadores Marcelo Guzzo e Ernesto Kemp, da Universidade Estadual de Campinas, e terá participação da Universidade de São Paulo, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, da Universidade Federal da Bahia e da Universidade Estadual de Feira de Santana.
“É muito importante que o Brasil, como um país que assinou o tratado de não-proliferação de armas nucleares, mostre, com esse projeto, que está empenhado em ajudar no controle do uso militar do plutônio. Além disso, estaremos participando de pesquisas em uma área emergente, com grande potencial de desenvolvimento científico”, disse Anjos.
Segundo o pesquisador, os problemas relacionados ao aquecimento global aumentarão a necessidade de usinas nucleares no planeta, agravando a possibilidade de desvios de plutônio para fins militares. “Atualmente, há cerca de 400 reatores no mundo e esse número deverá dobrar em dez anos. Isso implica que as salvaguardas em relação ao uso do plutônio precisam ser mais restritas”, afirmou.
Os neutrinos, de acordo com Anjos, praticamente não interagem com a matéria, podendo atravessar uma hipotética parede de chumbo com 9,5 trilhões de quilômetros de espessura sem se chocar com um único átomo. Por isso, saem do reator nuclear levando informações sobre o que se passa em seu interior.
“Há uma relação linear entre a potência térmica do reator e a quantidade de neutrinos gerada. Como cada elemento tem um espectro de energia diferente, ao analisar a produção de neutrinos, podemos determinar a quantidade de plutônio presente no combustível nuclear”, explicou o professor do CBPF.
Segundo João dos Anjos, o detector é feito com um cintilador líquido. Os neutrinos saem do reator, chegam ao detector, no qual interagem com os prótons, e geram pulsos luminosos. “Nós analisamos os espectros de luz e descobrimos qual a mistura de elementos combustíveis que está sendo empregada na fissão nuclear”, disse.
(Por Fábio de Castro,
Agência Fapesp, 30/03/2007)