Colômbia: Lucro e perigo que vêm do carvão
2007-03-21
A Colômbia recebeu em 2006 mais de US$ 1,3 bilhão com a venda de carvão. Mas os trabalhadores do setor têm empregos temporários, insuficiente proteção sanitária e muito pouca segurança trabalhista. Segundo o Ministério de Minas e Energia, em 2004 foram atendidos 17 acidentes nas minas de carvão; em 2005 foram 40 e no ano passado 44. Em fevereiro passado, 40 pessoas morreram em duas explosões, uma em Sardinata, no departamento Norte de Santander, no nordeste, e outra em Gámeza, Boyacá, no centro-leste do país. O número de acidentes pode superar as estatísticas do ministério.
“Calcula-se dois acidentes diários, a maioria não informada por medo da suspensão dos trabalhos nas minas e conseqüente ausência de recursos econômicos”, sobretudo “no caso dos mineiros de pequena escala”, disse à IPS Tatiana Roa, diretora da organização não-governamental Censat-Água Viva. “Nos mesmos dias dos acidentes em Santander e Boyacá ocorreram outros dois que não conseguiram repercussão na imprensa”, disse à IPS o advogado Francisco Ramírez, secretário-geral do Sindicato de Trabalhadores Mineiros, da Energia, Metalúrgicos, Químicos e de Indústrias Similares.
As razões das explosões em Sardinata e Gámeza seguem sob investigação do estatal Instituto Colombiano de Geologia e Mineração, que já determinou a ilegalidade do sistema de túneis boyacense. Em igual condição se encontra uma quantidade indeterminada de minas de carvão, admitiu o ministro do setor, Hernán Martinez, perante o conselho comunal de 24 de fevereiro no município mineiro de Ubaté, 112 quilômetros a nordeste de Bogotá, em Cundinamarca. A ausência de estatísticas confiáveis impede saber quantas pessoas trabalham nas minas, incluindo menores de 18 anos.
“A tradição da exploração carbonífera de pequena escala no centro do país, o crescimento do preço internacional do mineral e a necessidade de renda dos mineiros pobres motivam a exploração ilegal com participação de crianças e jovens nos túneis, pois a pouca largura das minas muitas vezes impede a entrada de adultos”, explicou Roa. As mulheres, seguindo crenças ancestrais, não entram. “Afirma-se que elas trazem maus augúrios, por isso cuidam da alimentação dos trabalhadores, do serviço domestico e cuidam das hortas”, acrescentou.
A Organização Internacional do Trabalho o escritório na Colômbia do Fundo das Nações Unidas para a Infância desenvolveram jornadas educativas sobre o perigo que correm as crianças que trabalham nas minas, espcialmente em Boyacá, onde é mais forte a tradição mineira por meio de túnel. “Isto foi mudando com o tempo de maneira favorável. Onde há escolas, as crianças freqüentam as aulas em um período e trabalham na mina no outro”, disse Ramírez. “Vou à escola pela manhã e vou à mina quando não tenho tarefa... e quando me pagam”, disse à IPS Roberto Morales, de 11 anos, no perímetro urbano de Ubaté. “Eu ajudo meus país nos fins de semana”, acrescenta seu irmão, Miguel, de 9 anos.
O trabalho infantil “se relaciona com a idiossincrasia da região. Em Boyacá existe um tradição de unidade familiar muito forte, enquanto em Antioquia (norte), por exemplo, prevalece o desejo de obter renda”, explicou Roa. Mas, em todo o país “a mineração por túneis está desprotegida”, acrescentou Ramírez. Em 2001, foi expedido o Código de Minas, ou Lei 685, para fomentar a atividade, e em 2004 o governo de Álvaro Uribe liquidou a estatal Empresa Nacional Mineira (Minercol) também encarregada de desenvolver as políticas do setor.
Estes passos “suprimiram quase completamente as medidas de segurança dos trabalhadores e favoreceram a intervenção internacional”, continuou Ramírez. “Na Minercol realizávamos trabalho de prevenção. Tínhamos uma unidade de resgate, zonas de treinamento e convidávamos especialistas poloneses para treinarem nossos funcionários da área de salvamento”, disse o sindicalista. A Colômbia possui as maiores reservas carboníferas da América Latina ocupa o quinto lugar mundial em exportação de carvão térmico, de grande pureza, pois contém menos de 1% de enxofre.
Este mineral é usado sobretudo para a geração térmica de eletricidade, competindo no mercado internacional com os combustíveis refinados do petróleo, gás natural e lenha. No extremo norte, em La Guajira, fica o complexo mineiro a céu aberto maior do mundo, Carbones El Cerrejón, com 69 mil hectares e produção diária de 80 mil toneladas do mineral. Propriedade das multinacionais BHP Billiton, Anglo American e Glencore – de capitais britânicos, australianos, norte-americanos e suíços – sua renda no ano passado foi 15% maior do que em 2005.
Ao sul de La Guajira, o departamento do César também possui grandes extensões carboníferas exploradas pela norte-americana Drummond. Nestes departamentos se concentram 83% da riqueza carbonífera colombiana. Ali se aplica uma tecnologia que remove a camada vegetal e perfura terra e rocha até atingir a profundidade necessária. O restante das minas de carvão está espalhado em grande parte do território, especialmente nas cordilheiras ocidental e oriental que cruzam o país de sul a norte.
Ali a exploração é feita em túneis de até 600 metros de profundidade, na maioria sem condições apropriadas de segurança pela falta de controles estatais e de recursos dos pequenos mineiros para investir em máquinas e equipamentos que medem o acúmulo de gases responsáveis pelas explosões. Os trabalhadores do sistema de túneis ou a céu aberto são inclinados a sofrer doenças respiratórias pela continua aspiração de gases ou pó. Outros males comuns são os fungos na pele e problemas na coluna devido ao esforço físico, como hérnia de disco.
Os contratos de trabalho são temporários. No melhor dos casos, a cobertura de saúde só vigora durante o período da contratação. “Muitos são contratados por períodos de três meses, e depois saem, ficando desprotegidos em matéria de assistência de saúde”, afirmou Ramíerez. Os salários nem sempre superam o mínimo legal, que não chega a US$ 200. Mas, novamente por falta de estatísticas, não se tem com saber quantos estão nessa situação.
(Por Helda Martinez, IPS, 20/03/2007)
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