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2007-03-20
O presidente da Votorantim Celulose e Papel chegou ao Rio Grande do Sul na última quinta-feira (15/03) afirmando estar “surpreso e revoltado”. José Luciano Penido se referia à destruição de 68 hectares de eucaliptos cultivados por 114 famílias em assentamentos no município de Pedro Osório desde o ano passado.

A produção fazia parte do programa Poupança Florestal que a empresa mantém com os assentados. "É a única empresa no Brasil a estabelecer este tipo de diálogo e todas as plantações estão licenciadas pela Fepam em conjunto com o projeto da VCP", ressaltou.

Penido classificou a atitude como um ato de agressão à propriedade. Mas livrou a barra dos assentados. Ele culpa a Superintendência do Incra no Rio Grande do Sul. No mês passado, o Incra enviou uma correspondência aos colonos, na qual classifica o plantio de eucalipto em terras de reforma agrária como uma atividade irregular e passível de punição. Além disso, o documento argumenta que os assentados não podem assinar nenhum tipo de contrato de arrendamento das terras recebidas pela União.

O documento assinado pelo superintendente Mozar Artur Dietrich sugeriu que o órgão poderia inclusive retomar as propriedades cedidas em 1999. “Com medo de perder suas terra e inflamados pelo MST, os agricultores arrancaram as árvores”, comentou Penido.

Procurado pelo Ambiente JÁ o Incra se negou a dar entrevistas. Alegou que tudo o que tinha a informar já havia feito em nota oficial. Na nota, o Incra garante que cumpre o que determinam as licenças ambientais dos assentamentos, expedidas pela Fepam e fiscalizadas pelo Ministério Público, que proíbem florestamento com espécies exóticas. Afirma que não foi consultado em relação aos contratos de florestamento firmados com os assentados, nem solicitou, concedeu ou autorizou qualquer procedimento para licenciamento ambiental para esse uso. Assegura que "sua atuação neste caso é no exato cumprimento dos mandamentos legais".

O presidente da VCP rebateu o argumento da Superintendência do Incra, dizendo que, de acordo com o Plano Regional de Reforma Agrária do Rio Grande do Sul, Estatuto da Terra e Constituição Federal, os assentados estão agindo dentro da lei. Segundo ele, não existe contrato de arrendamento ou parceria entre a empresa e os agricultores para uso da terra. O que existe são contratos de compra e venda da produção de madeira, no prazo de sete anos a 14 anos. “Não é contra a lei, portanto, plantar qualquer tipo de árvore em assentamento, quaisquer que sejam elas”, afirma.

A coordenadora do MST em Pedro Osório, Irma Ostroski, tem outra versão para o ocorrido. Ela lembra que o movimento sempre foi contrário à monocultura do eucalipto, e que quando souberam da ameaça do Incra, as famílias, que fazem parte do MST, decidiram promover assembléias para decidir o que fazer. “Não foi uma decisão impensada e tampouco influenciada pelo movimento”, garante Irma. De acordo com a líder dos sem-terra no município, a ação foi acertada após três assembléias com a participação de todas as famílias. Ela ainda denuncia que existe uma pressão por parte dos técnicos da Emater e das prefeituras para que os assentados plantem eucalipto.

O MST aproveita para também criticar o modelo de financiamento proposto aos assentados. Irma diz que o movimento tirou do próprio site da VCP na internet a informação de que, para cada hectare plantado, o assentado receberia apenas 32 reais.

Banco Real financia plantio
O financiamento é feito através do Banco Real a juros de 9% ao ano e a empresa garante a compra da produção de madeira no prazo de sete a 14 anos. "Não há contrato de arrendamento com a VCP. Nós apenas nos comprometemos a comprar a produção. E 5 % dela ainda pode ser vendida para terceiros", explicou Penido.

O diretor-florestal da empresa, José Maria Mendes garante que é sugerido ao produtor que ele plante o eucalipto de modo consorciado com outras culturas. “O contrato com o Banco Real estipula que a propriedade não pode ter mais do que 20% da área plantada com eucalipto”, diz.

Mendes cita como exemplo o modelo aplicado em São Paulo nos assentamentos com plantações de cana-de-açúcar. "A diferença é que lá eles vendem para as usinas de álcool".

Garantiu ainda que muitas ONGs conhecem e apoiam a parceria com os assentados. As duas mais expressivas são a paulista SOS Mata Atlântica e a gaúcha, ligada ao setor florestal, Amigos da Floresta.

E os colonos que arrancaram seus pés de eucalipto, como pagarão sua dívida com o banco? Penido não deixou claro se a empresa ajudará. Limitou-se a afirmar que, como trata-se de um ato involuntário e criminoso, talvez os assentados possam ficar livres da dívida. Mais solidário, o MST promete colocar seus advogados para defender os colonos. " A empresa não fez e nem vai fazer nada", dispara Irma, ao afirmar ainda que esses 100 hectares de Pedro Osório não fazem diferença para a VCP. "Esse programa deles é para envolver pequenos numa propaganda social".

MST X ONGS
Questionado sobre qual seria hoje o "pior inimigo" do setor florestal, Mendes foi diplomático com os movimentos sociais. "Vivemos numa democracia e a empresa entende que eles (MST) são legítimos, dentro da lei". Para as ongs ambientalistas, o diretor-florestal manda o recado: "Elas se apóiam em argumentos ultrapassados". Segundo ele, teses como a de que o eucalipto seca o solo já foi derrubada há muito tempo por estudos científicos.

Não é o que pensa a turma da Biologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, capitaneada pelo mais famoso combatente do eucalipto no RS, professor Ludwig Buckup. Em diversas ocasiões, sempre que pode, faz questão de mencionar o quão prejudicial seria o plantio maciço de eucalipto ao meio ambiente.

Na sexta-feira (16/03), a direção da VCP relatou o fato ao procurador-geral de Justiça, Roberto Bandeira Pereira. Um dia antes, a cúpula da empresa já havia se encontrado com a governadora Yeda Crusius para garantir a continuidade do projeto no Estado. Claro que aproveitou a ocasião para tocar no assunto. “A governadora é solidária, disse que analisará a questão e tomará um posicionamento em breve”, revela Penido.
(Por Carlos Matsubara, Ambiente JÁ, 19/03/2007)

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