Quatro anos depois da invasão do Iraque , o país permanece afundado em um desastroso pesadelo ambiental
2007-03-20
Quatro anos depois da invasão do Iraque pelos Estados Unidos, e apesar dos
US$ 22 bilhões gastos na reconstrução, o país está afundado em uma
desastrosa situação ambiental. “Os rios Tigre e Eufrates são esgotos a céu
aberto”, disse ao Terramérica o ativista Azzam Alwash, presidente da
não-governamental Nature Iraque, com sede em Bagdá. Dejetos industriais,
hospitalares e agrícolas, e vazamentos de petróleo são vertidos nesses dois
enormes rios que definem a região da Mesopotâmia e fornecem boa parte da
água para irrigação e para a população beber.
“Herdamos uma terrível situação ambiental”, disse a ministra do Meio
Ambiente do Iraque, Narmin Othman, em entrevista ao Terramérica, da capital
de seu país. O entorno natural iraquiano foi devastado pelas três guerras
que esse país travou desde 1980 e pelo abandono e má administração do regime
de Saddam Hussein (1979-2003). Então, “as leis ambientais eram motivo de
riso. As indústrias estatais contaminavam à vontade”, disse Alwash. Muitas
dessas indústrias produziam material militar e foram bombardeadas e
saqueadas, deixando o país cheio de áreas industriais muito tóxicas. Outras
áreas contaminadas correspondem às indústrias do petróleo e metalúrgica.
O conflito atual – iniciado a partir da invasão militar liderada pelos
Estados Unidos, no dia 20 de março de 2003, e que derivou em ações contra a
ocupação e em violência sectária – também deixa montanhas de escombros de
edifícios, veículos e equipamentos bélicos destruídos, que se deve limpar e
colocar em algum lugar. Em 2005, um estudo do Ministério do Meio Ambiente do
Iraque e do Programa das Nações Unidas para o Oriente Médio identificou 50
pontos críticos no país e pediu urgência para limpar os cinco piores.
Dois deles foram saneados, assegurou a ministra Othman. Trata-se da usina
metalúrgica de Al Quadissiya, com resíduos tóxicos, bombardeada e saqueada,
e da abandonada fábrica de pesticidas de Al Suwaira, perto de Bagdá. São
necessários, pelo menos, US$ 40 milhões para cumprir plenamente as
recomendações daquele informe. “É preciso limpar mais de 500 fábricas
estatais, cada uma equivalente a um dos 1.240 locais de lixo perigoso que os
Estados Unidos têm em seu território, chamados Superfunds (pelo programa
federal de mesmo nome para eliminá-los), nos quais são gastos bilhões de
dólares em limpeza”, explicou Alwash.
Sua pasta carece de fundos, equipamento e pessoal treinado, afirmou a
ministra. Existe há apenas três anos e tem muito pouca capacidade, concordou
Alwash. A informação ambiental é pouco confiável e existe uma grande
necessidade de controles e medições elementares, além de estudos e
pesquisas, acrescentou. Até mesmo a coleta de amostras de água e ar é
perigoso devido à insegurança reinante. O mesmo se aplica às normas
ambientais, pois em boa parte do país a lei não vigora. “Dirigindo, passo
por fábricas de tijolos que soltam uma densa fumaça negra, porque usam
‘petróleo negro’ ilegal como combustível barato”, afirmou a ministra.
No outono passado, foi informado que milhões de barris de petróleo negro –
um derivado do processo de refino – foram bombeados para valas abertas e
para depósitos com perdas, próximo ao Rio Tigre, e incendiados. A
contaminação aérea já era séria e piorou nos últimos três anos, reconheceu
Othman. Embora o serviço de eletricidade tenha melhorado, a proliferação de
geradores movidos a gasolina e óleo combustível agrava a situação. O
tratamento dos esgotos registra melhorias.
A Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (Usaid)
garante ter reabilitado estações de tratamento de água, expandindo o acesso
ao saneamento para cerca de 5,1 milhões de moradores urbanos, em um país de
26 milhões de habitantes. Isto significa que “cerca de 2,3 milhões de
iraquianos, que em 2002 não tinham água limpa para beber, agora têm”, disse
a Usaid.
Porém, os esforços norte-americanos para a reconstrução se reduzirão no
próximo ano e meio, disse, em uma declaração por escrito, Michael J. Walsh,
comandante do Corpo de Engenheiros do Exército da Divisão da Região do Golfo
(Pérsico ou Arábico). Os US$ 3,5 bilhões que restam dos fundos de
reconstrução terão de ser gastos em água, saneamento e produção de petróleo.
Porém, o tempo dos grandes projetos terminou, asseguraram oficiais do Corpo
de Engenheiros.
Os cálculos do custo total da reconstrução do Iraque oscilam entre US$ 80
bilhões e US$ 100 bilhões. Apesar das más notícias, foram aprovadas leis
ambientais mais rígidas e outros ministérios se conscientizaram sobre estes
temas, afirmou Othman. A principal boa notícia é que voltaram a inundar os
pântanos mesopotâmicos, drenados pelo regime de Saddam Hussein nos anos 80,
o que destruiu até 90% dos nove mil quilômetros quadrados desse ecossistema.
Em 2003, um programa de reinundação patrocinado por Canadá, Itália e
organizações conservacionistas internacionais começou a regenerar entre 25%
e 35% dos pântanos, junto com muito de sua fauna e flora. A ministra Othman
admitiu a necessidade de melhorar a segurança e a economia. Entretanto, “o
meio ambiente deveria ser uma prioridade para os iraquianos, mas não é”. A
contaminação prejudica a saúde da população, afirmou Alwash. “Mas esse não é
um assunto importante quando uma bala pode furar sua cabeça ao sair de
casa”, acrescentou.
(Por Stephen Leahy, Terramérica, 19/03/2007)
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