Lei de florestas pára na regulamentação
2007-03-19
Sancionada há um ano e 17 dias, a Lei de Gestão de Florestas ainda não saiu do papel. O decreto de regulamentação da lei, que estabelece três formas de gestão das áreas florestais públicas (unidades de conservação, uso comunitário e concessões públicas), aguarda aprovação da Casa Civil. Sem o decreto, nenhum edital de licitação pôde ser aberto para o Distrito Florestal Sustentável da BR-163, área-piloto da lei.
Organizações ambientais que apóiam a lei reclamam da lentidão da sua aplicação. Citam a falta de fiscalização e a incompatibilidade entre os projetos de assentamento do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) com as propostas de ocupação do Ministério do Meio Ambiente para áreas na Amazônia.
Sérgio Leitão, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace, disse que, nesse ritmo, só "veremos as madeiras da área nas prateleiras em 2009". Para as ONGs, a lei serviria para frear o comércio ilegal de madeira e promover o desenvolvimento sustentável na região.
A demora na regulamentação, segundo Tasso Azevedo, diretor-geral do SFB (Serviço Florestal Brasileiro), órgão criado pela lei, se deve à prioridade do governo na aprovação do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e à complexidade da regulamentação.
Na licitação pública, por exemplo, o vencedor deve ser definido mais pelos aspectos ambientais do que sociais e econômicos. A previsão do SFB é que a primeira licitação ocorra ainda no segundo semestre.
No momento, há dez contratos temporários com planos de exploração aprovados até 2 de março de 2006, quando Lula sancionou a lei. O único distrito florestal criado é o da BR-163.
Para Azevedo, a falta de Orçamento próprio em 2006 não colaborou com a lentidão da regulamentação. No ano passado, o Serviço Florestal operava com recursos do Programa Nacional de Florestas. A previsão para 2007, segundo Azevedo, é de R$ 25 milhões, sendo R$ 15 milhões do Tesouro Nacional e R$ 10 milhões de arrecadação com os planos de manejo.
Não só os atrasos na execução da lei preocupam as ONGs. André Lima, do ISA (Instituto Socioambiental), afirma que esperava uma regulamentação demorada, já que a implementação da lei exigia uma série de consultas às entidades. "[Mas] não deixa de ser um contra-senso, já que a lei foi aprovada em caráter de urgência."
Para Sérgio Leitão, o problema mais grave está nas ações incompatíveis entre o Incra, com os projetos de assentamento na Amazônia, e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente que fará a fiscalização.
Anos 1970
"Não somos contra a reforma agrária, mas só se pode fazer isso com um jogo de comunicação. Como você vai oferecer a concessão de uma área ao mesmo tempo que o Incra está com um projeto de assentamento? Aí você tem uma situação grave, que ocorreu também nos anos 70, quando dois terços da reforma agrária eram feitos na Amazônia para suplantar os problemas sociais do Brasil."
Tasso Azevedo diz que está caminhando para a convergência de ações entre o Incra e o Ibama. Mas é taxativo: "Caso não aconteça, inviabiliza o programa de gestão de florestas".
Críticas à lei
O projeto de lei começou a ser elaborado em dezembro de 2003 e foi aprovado na Câmara e no Senado depois de extenso processo de consulta. Com a lei, foram criados o Serviço Florestal Brasileiro e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal. As concessões seriam feitas por até 40 anos.
O geógrafo Aziz Ab'Sáber é contrário à lei. "Alugar uma floresta biodiversa? Se o governo não sabe como explorar a floresta de maneira sustentável, como os vencedores das licitações saberão?"
Azevedo rebate as acusações de que a lei seria uma forma de privatizar as florestas. "A lei é o oposto disso. O processo que tinha era o reconhecimento de posse. Você titula a terra e ela é privatizada. O que essa lei fez foi definir as florestas como um patrimônio público. Ela prevê que a floresta pode ser utilizada para gerar bens e serviços".
(Por Carolina Rangel, Folha de S. Paulo, 17/03/2007)
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u16132.shtml