Deputados podem votar plano para salvar Velho Chico, enquanto Governo caminha com a transposição
2007-03-15
Manifestantes continuam reunidos no acampamento Pela Vida do Rio São Francisco e do Nordeste Contra a Transposição, em Brasília, pedindo a revitalização do rio e o fim do projeto de transposição de suas águas. Representantes do movimento reuniram-se ontem (14/3) com o presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia; com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e, à tarde, participaram de audiências no Ministério Público Federal e no Supremo Tribunal Federal (STF).
Chinaglia recebeu a comissão do acampamento às 14h30, em seu gabinete. Segundo os acampados, o presidente da Câmara afirmou não ter elementos suficientes para se posicionar em relação à transposição, mas é favorável à revitalização do rio. Ele reconhece que é um projeto que divide a Câmara, e a necessidade de ampliar o debate. Chinaglia se comprometeu em aprofundar essa discussão na Casa.
A ministra Marina Silva disse, aos representantes do acampamento, que as licenças ambientais são emitidas de acordo com o parecer técnico do Ibama. “Se os técnicos avaliam que, do ponto de vista ambiental, o projeto é viável, concedemos a licença”, afirmou, ressaltando que não vai discutir politicamente o projeto de transposição. “É uma decisão técnica”, enfatizou.
O grupo criticou o fato do MMA desconsiderar estudos que alertam para os impactos negativos do projeto, como o da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Em relação ao Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) do Ibama, os movimentos questionam que só foram considerados os impactos sobre a bacia receptora (Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte). Mesmo assim, “dos 36 impactos apontados no EIA/RIMA, 24 foram negativos”, destaca Rubem Siqueira, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da coordenação do acampamento. A ministra não respondeu.
Segundo Marina Silva, não há data prevista para liberar a licença de instalação, a última que falta para deflagrar o início das obras.
Equívocos do EIA/RIMA
Na avaliação do time contrário ao projeto de transposição, o estudo não aprofunda o risco de salinização de solos e açudes, não identifica áreas potenciais de desertificação, a possibilidade de início ou aceleração de processos erosivos, a possibilidade de redução de geração de energia elétrica e o risco de eutrofização dos reservatórios. O EIA ainda apresenta deficiências no diagnóstico da vegetação, na previsão de impactos e na indicação de Unidades de Conservação. Traz ainda dados insuficientes sobre a fauna. Medidas de proteção ambiental são apresentadas de forma superficial.
Alheio a qualquer protesto, o Governo Federal fazia publicar na terça-feira, no Diário Oficial da União, um aviso alvissareiro para as empreiteiras nacionais: as estrangeiras estão excluídas de participar deste super negócio. Assim, sobrarão às brasileiras disputar R$ 3,3 bilhões para executar as obras da transposição do rio São Francisco, divididas em 14 lotes, com valores estimados entre R$ 136 milhões e R$ 287 milhões. No conjunto, a concretização do projeto deverá custar R$ 3,267 bilhões.
Desde seu anúncio, já no nascedouro do Governo Lula, a transposição vem dividindo o país entre os times contra e a favor. Governadores como o ex de Sergipe, João Alves Filho, e o reeleito de Minas Gerais, Aécio Neves, tomaram para si a luta para barrar o projeto, perspectiva que também impulsionou o bispo da Diocese de Barra (BA), dom Cappio, a fazer uma greve de fome visando convencer o Governo ao menos a reabrir o diálogo sobre a obra.
O fato é que valor infinitamente inferior aos previstos para as licitações poderiam ser gastos no plebiscito nacional sobre a transposição, proposto pelo senador Antônio Carlos Valadares (PSB/SE) e empacado numa avaliação a passo de tartaruga na Comissão de Justiça do Senado. “Não há interesse que ele ande”, resumiu o parlamentar a AmbienteBrasil.
Bem provável. Se o plebiscito revelasse um “não” ao projeto, ficaria bastante desconfortável ao presidente Lula agir como o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que declarou à Agência Brasil: "Não podemos achar que se vai fazer uma obra desse tamanho com 100% das pessoas concordando”.
Mas outra idéia do senador Valadares parece prestes a sair do papel para a prática. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de sua autoria, que propõe a criação de um fundo para revitalização do São Francisco, foi incluída na pauta de votações desta semana pelo presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e pode alterar a forma de destinar recursos para a bacia hidrográfica.
O Programa de Aceleração do Crescimento – PAC - do Governo prevê o investimento de R$ 1,3 bilhão em ações de recuperação do rio, sendo, este ano, destinados R$ 260 milhões para o Programa de Revitalização da Bacia Hidrográfica do São Francisco.
Aprovada a PEC, o fundo teria validade de 20 anos e poderia chegar a R$ 300 milhões por ano. Os recursos viriam de várias fontes, como União, estados e emendas orçamentárias. O prazo de duas décadas garantiria que, sob qualquer governo ou matiz partidária, a saúde do rio tivesse esses investimentos.
A PEC tem tudo para passar no plenário da Câmara. “Já está acordada a aprovação com as lideranças, inclusive do Governo”, diz o senador Valadares. “A proposta se tornou um consenso nacional”, festeja.
(Por Mônica Pinto, AmbienteBrasil, 15/03/2007)
http://www.ambientebrasil.com.br/noticias/index.php3?action=ler&id=30042