Ao contrário da euforia dos produtores e do governo com a perspectiva de produção recorde e crescimento na exportação do etanol, pesquisadores reunidos no 1º Simpósio Brasileiro de Mudanças Climáticas, realizado neste domingo (11/03), no Rio de Janeiro, vêem com cautela a expansão da lavoura da cana-de-açúcar, por causa das implicações ambientais de longo prazo.
Logo na palestra de abertura do evento, o físico Luiz Pinguelli Rosa, ex-presidente da Eletrobrás, alertou para o risco de o país voltar a ser uma "monocultura da cana".
Apesar de emitir menos gases causadores do efeito estufa, o etanol produzido a partir da cana também emite gás carbônico quando queimado. "É bom que os Estados Unidos saiam do álcool de milho, mais poluente, para o álcool da cana, mas temos que cuidar para não sermos pressionados a voltar a ser uma monocultura da cana", disse Pinguelli. O agroclimatologista da Empresa Brasileira de Pesquisa em Agropecuária, Eduardo Assad, demonstrou preocupação com o fato de os estudos de viabilidade para plantação de novos canaviais estarem se concentrando no sul do Mato Grosso, mas precisamente na região do Pantanal Matogrossensse.
"Etanol é muito bom, mas quando aparecerem as células de hidrogênio, fonte alternativa de energia que já vêm sendo pesquisada nos países desenvolvidos, vamos perder mercado", advertiu o pesquisador.
Biodiversidade
Além do impacto na biodiversidade, ele adverte para o fato de que, devido ao clima do local, a produção de cana no pantanal tende a ser de baixa qualidade e de valor comercial inferior ao da cana plantada em regiões mais favoráveis. Segundo ele, o clima do Pantanal é semelhante ao do semi-árido, porém com forte nebulosidade. "O calor e a umidade provocam a floração, processo que gasta muita energia da planta, reduzindo a produção de sacarose", explicou.
De acordo com Assad, as outras áreas para onde estão ocorrendo a expansão dos canaviais, como o sul dos Estados do Maranhão, Piauí e Tocantins são mais adequadas para o cultivo e teriam menos impacto no meio ambiente.
A melhor solução a longo prazo, segundo ele, é a produção de biodiesel, aproveitando o conhecimento da população local, como o dendê no norte, o babaçu no nordeste, e outras oleaginosas, como o girassol.
Mudanças climáticas
Assad acaba de concluir um estudo sobre o impacto do aquecimento global na plantação de cana-de-açúcar. A pesquisa, ainda não publicada em revistas científicas, aponta poucas alterações, já que é uma planta muito resistente ao calor e à seca. A principal mudança seria em São Paulo, onde o cultivo teria passar da região oeste para o leste do Estado.
Anteriormente, Assad já havia estudado as alterações climáticas no cultivo do arroz, feijão, soja milho e café. Agora, com a divulgação dos resultados do estudo do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), que prevê uma alteração de 1,8 ºC a 5 ºC até 2100, ele refez os modelos, com conclusões pessimistas.
Segundo o estudo, um aumento de 1ºC na temperatura mínima - a previsão mais favorável, de acordo com o IPCC -, traria um prejuízo de US$ 375 milhões no plantio de café. Um aumento de 5ºC provocaria o fim da produção do café em São Paulo.
Os cultivos mais atingidos com o aceleramento do aquecimento global são o de café e o de soja. Os Estados mais prejudicados seriam os do Nordeste e o Rio Grande do Sul. "O grande problema é o que fazer com o Nordeste. O Sul se adapta, em vez de plantar uva, pode plantar soja, por exemplo", disse Assad.
Quinze centros da Embrapa pelo País e sete universidades parceiras estão estudando genes tolerantes ao calor, para fabricar sementes.
(Por
Fabiana Cimieri,
O Estado de S. Paulo, 11/03/2007)