Sob o sol escaldante do meio-dia, na cidade de Lins, interior de São Paulo, o operador de colheitadeira Marcio Araújo faz sua estréia no mar de cana-de-açúcar. Sem saber, ele deu a largada para a maior safra de cana que o Brasil já colheu. Embora a safra comece em maio, a moagem na Usina Lins, uma das novas produtoras de álcool do País, começa nesta segunda-feira (12/03).
Será uma safra de recordes: 415 milhões de toneladas de cana serão colhidas e moídas no Centro-Sul (principal região produtora) ante 372,67 milhões da safra anterior. Ela vai permitir que a produção pule de 16,05 bilhões de litros de álcool para 18,57 bilhões, que substituirão a gasolina no Brasil e em outros países. A previsão é de que a safra 2007/2008 movimente R$ 40,6 bilhões, quase R$ 3 bilhões mais que na safra anterior.
A supersafra de cana vai contribuir para elevar os números de outra conta, igualmente relevante. Pelos cálculos da Datagro, consultoria que acompanha o setor e de onde saíram as previsões para este ano, o álcool combustível, em sua história de pouco mais de 30 anos, contribuiu para o País economizar US$ 185,9 bilhões. Foi quanto o Brasil deixou de gastar com o consumo do petróleo.
O cálculo considera o valor, no mercado internacional, da gasolina não consumida entre 1975 e 2006 e os juros evitados numa eventual dívida externa com a compra de petróleo que seria convertido em gasolina.
O álcool combustível também permitiu que o Brasil deixasse guardado no fundo da plataforma oceânica nada menos que 11,5% de suas reservas petrolíferas. Com a decisão de criar um substituto para a gasolina, o País economizou 1,58 bilhão de barris de petróleo. As reservas nacionais em águas profundas e sob chão firme são de 13,7 bilhões de barris.
'Não é por acaso o interesse dos Estados Unidos pelo etanol brasileiro. São esses números que dão ao álcool relevância como combustível alternativo', diz Plínio Nastari, da Datagro. Hoje, 40% da demanda de combustível líquido no Brasil é suprida pelo etanol. Nos Estados Unidos, o governo tenta elevar esse porcentual para 15% em 10 anos, o que exigirá 132 bilhões de litros de etanol. A produção mundial hoje não chega a 50 bilhões de litros.
Segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), representante dos usineiros, nos próximos seis anos surgirão 73 novas usinas, média de uma por mês. A expansão da demanda sustenta os projetos, que vão consumir US$ 14,6 bilhões no período. São números que revelam a situação atual, mas nada impede que o mercado acelere essa corrida, o que deve dar ao Brasil uma rotina de recordes, ano após ano.
O ano
Segundo Nastari, o Brasil terá uma safra em que se privilegiará a produção de álcool. A produção de açúcar, em torno de 25 milhões de toneladas, deverá ser mantida. A previsão é que 52,1% da cana seja convertida em etanol. Dessa forma, a produção de 18,5 bilhões de litros de álcool na região Centro-Sul será suficiente para abastecer o mercado nacional e as exportações, que, segundo Nastari, serão iguais às de 2006, ou 3,6 bilhões de litros.
O cenário traçado pela Datagro para este ano considera a elevação da mistura dos atuais 23% para 25% de álcool anidro na gasolina (decisão que o governo deverá tomar até meados do ano), além da manutenção, em níveis elevados, do consumo de álcool pelos carros bicombustível. Na média, a consultoria acredita que neste ano mais de 80% dos carros vendidos continuarão a ter motores flexíveis, para uso de gasolina e a maior parte do tempo álcool. A frota brasileira de carros bicombustível já era de 2,63 milhões em dezembro. 'Uma frota que é acrescida de 1,5 milhão de veículos por ano', explica.
(Por
Agnaldo Brito,
O Estado de S. Paulo, 11/03/2007)