Mulheres da Via Campesina mobilizadas na luta contra o deserto verde no RS
2007-03-08
Sob o argumento de que não há desigualdade de gênero no tratamento com "invasores" a Brigada Militar do Rio Grande do Sul mobilizou grande efetivos para reprimir as ocupações de terra realizadas pelas mulheres da Via Campesina no estado. Na manhã de terça-feira (06/03), cerca de 1.300 mulheres da Via Campesina, a maioria vinculada ao MST, ocupou quatro latifúndios com monoculturas de eucalipto e pinus. O objetivo das mobilizações foi denunciar que as empresas do deserto verde estão se apropriando de milhares de hectares de terras no Rio Grande do Sul, impedindo a reforma agrária, inviabilizando a agricultura camponesa e provocando enormes desequilíbrios ambientais que já vem sendo sentidos pela sociedade como a seca, a elevação das temperaturas e a destruição da biodiversidade.
As lideranças da Via Campesina lamentam que o governo do Rio Grande do Sul, que é tão ágil para reprimir as mobilizações sociais, não tenha o mesmo rigor para combater o deserto verde, que avança ignorando limites de faixa de fronteira, desconsiderando legislações ambientais, entre outras ilegalidades. Na avaliação da Via os governos federal e estadual deveriam incentivar a reforma agrária e agricultura camponesa porque é isso que gera trabalho, comida e dignidade no campo, garantindo a preservação da biodiversidade e dos hábitos alimentares de cada região.
Ontem (07/03) pela manhã um grupo de mulheres da Via Campesina, a maioria vinculada ao Movimento de Mulheres Camponesas – MMC e ao Movimento de Pequenos Agricultores – MPA, iniciou um acampamento de formação em Canoas. O objetivo é debater os impactos do deserto verde e lançar uma campanha de produção de alimentos saudáveis. Essa mobilização também faz parte da Jornada Nacional de Luta das Mulheres da Via Campesina que este ano tem como lema "Mulheres na luta por Soberania Alimentar, contra o Agronegócio".
Segue abaixo informações sobre as mobilizações no interior na manhã de quarta-feira:
- Eldorado do Sul – Por volta das 11 horas as mulheres e crianças desocuparam a área saindo em marcha para um acampamento que fica cerca de 5 km do latifúndio ocupado. Elas foram notificadas da reintegração esta manhã e não foi possível nenhuma negociação com a brigada que já tinha mais de uma centena de policiais prontos para realizar o despejo. A reintegração de posse foi pedida pela Aracruz celulose, mas estranhamente nas enormes plantações de eucalipto da região tem placas da Boise, por isso as mulheres suponham ser esta a empresa proprietária. Nesta ocupação as mulheres enfrentaram momentos de muita tensão e repressão da Brigada Militar. Já no início da manhã de ontem um grande efetivo foi deslocado para a área, com camburões, cavalos, avião da Brigada sobrevoando. Todo esse clima de horror sem nenhuma autorização judicial para a retirada das mulheres. No período da tarde a brigada militar "congelou a ocupação" impediu a entrada e saída de pessoas, incluindo jornalistas. Nem mesmo a entrada de água potável para as mulheres e crianças foi permitida. A continuidade da mobilização das mulheres vai ser definida após a chegada no acampamento, localizado no trevo entre Eldorado e Charqueadas.
- Santana do Livramento - As mulheres e crianças foram despejadas da fazenda Tarumã ontem ao meio-dia sob forte chuva. A área da Stora Enso tinha interdito proibitório e a brigada mobilizou forte aparato militar ainda no meio da manhã, não permitiram nem que as pessoas almoçassem na área. As mulheres tentaram argumentar com a brigada que a Stora Enso é uma empresa sueco-finlandesa, e pela lei brasileira estrangeiros não podem ter terras na faixa de fronteira, como é o caso do município de Livramento que fica na divisa com o Uruguai, mas isso foi ignorado. Desde terça-feira (06/03) a tarde as mulheres estavam acampadas em um assentamento a cerca de 50km da área ocupada. A programação das mulheres desde ontem (07/03) é de estudos sobre os impactos do deserto verde.
- São Francisco de Assis/ Santa Maria – No início da tarde de terça-feira (06/03) as mulheres da Via Campesina decidiram sair da área da Stora Enso em São Francisco de Assis ocupada nas primeiras horas do dia. Em assembléia elas avaliaram que já tinham feito a denuncia do deserto verde na região e era importante fazer uma homenagem ao bispo Dom Ivo Lorscheiter, que estava sendo velado em Santa Maria. A caravana das mulheres foi detida pela brigada militar na BR 287 na entrada de Santa Maria pouco antes das cinco da tarde. Aí começou a sessão de tortura psicológica e verbal que se prolongou por 4 horas. Os ônibus foram revistados, as mulheres foram identificadas sob ameaças. Enquanto durou esse processo a imprensa foi impedida de falar com as mulheres, a brigada militar montou barreira isolando as mulheres da Via. Depois de todo esse constrangimento as mulheres seguiram para o cemitério onde prestaram homenagem a Dom Ivo e depois foram para o assentamento no município onde permanecem acampadas.
- Pinheiro Machado – as mulheres permanecem acampadas na área da Votorantim ocupada dia 06/03 de manhã no município de Pinheiro Machado divisa com Candiota. Elas tem prazo para sair da área até o dia 8 as quatro da tarde. Aquela foi a única região em que o poder judiciário concedeu prazo para a reintegração de posse. Hoje as mulheres devem receber a visita do Defensor Público da União em Bagé, Robson de Souza, que está indo na ocupação ouvir as denúncias das mulheres. Ele também se mostrou preocupado com os impactos que as monoculturas de eucalipto estão provocando na região.
(Via Campesina, 07/03/2007)