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2007-03-07
O verão destaca ainda mais um grave problema de saúde pública: a dengue. Apenas nos primeiros meses do ano foram notificados 67.840 casos da doença no país, sendo os Estados com maior número o Mato Grosso do Sul, com 35.863, seguido de Mato Grosso (4.350), Rio de Janeiro (4.196) e Minas Gerais (2.499), segundo dados da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), do Ministério da Saúde.

Um passo importante para o controle da doença foi dado por pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, e da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista. A partir de uma planta nativa brasileira e pouco conhecida, a Piper solmsianum, eles criaram um biocida, um inseticida natural capaz de eliminar todas as larvas do mosquito transmissor da dengue, o Aedes aegypti, em um reservatório de água.

O trabalho, conduzido pela bióloga Marise Maleck e pelo entomologista Anthony Érico Guimarães, pesquisadores do Laboratório de Díptera do IOC, teve como ponto de partida o estudo das lignanas, moléculas lipídicas produzidas pela atividade metabólica de plantas. As plantas naturalmente eliminam tais substâncias para a defesa contra inimigos, como insetos que as têm como fonte de alimentação.

Primeiramente, os pesquisadores atestaram a alta toxicidade das lignanas produzidas pela Piper solmsianum, especificamente contra as larvas do Aedes aegypti. “A planta passou por um processo conhecido como maceração, que consiste em extrair quimicamente seus princípios ativos. O produto final desse processo fitoquímico é um líquido oriundo das lignanas”, disse Guimarães.

“Fizemos testes com diferentes dosagens desse líquido até chegar à formulação ideal. Ao utilizarmos 100 microlitros em um litro de água contendo larvas do Aedes aegypti, a mortalidade da larva foi de 100% em 24 horas”, afirmou.

Segundo o pesquisador, por serem químicos ou biológicos (feitos com bactérias), os larvicidas utilizados atualmente contra o mosquito da dengue apresentam algum grau de toxicidade, seja para humanos ou para outras espécies animais e vegetais que dependem da água onde eles são aplicados.

“Além de ser produzido a partir de uma planta nativa e extremamente abundante na Mata Atlântica, a maior vantagem do biocida é sua capacidade de matar as larvas do mosquito sem deixar qualquer tipo de resíduo tóxico no meio ambiente”, explicou.

Tanto a molécula que tem ação biocida contra a larva do Aedes aegypti como seu processo de isolamento foram patenteados. Os dados estão em fase de publicação. “Estamos terminando a revisão final de um artigo que deverá ser encaminhado nos próximos dias para o Journal of Medical Entomology”, disse Guimarães.

O professor Massuo Jorge Kato, do Instituto de Química da USP, foi o coordenador do grupo responsável pelo trabalho de isolamento da lignana da Piper solmsianum, nos laboratórios da instituição paulista.

Reações adversas
Anthony Guimarães disse que, em estudos anteriores realizados pela equipe, a mesma lignana que teve efeito contra as larvas do mosquito da dengue foi testada contra o Trypanosoma cruzi, protozoário causador do mal de Chagas.

“No caso, foi comprovado que as lignanas não tiveram ação tóxica contra o barbeiro, que é o vetor da doença, e sim contra o Trypanosoma cruzi, fato que comprometeu sua eficácia. Como não têm efeito para o combate direto ao barbeiro, as lignanas teriam que ser primeiro ingeridas pelo inseto para depois matar o Trypanosoma, um caminho bem mais complicado de ocorrer”, explicou.

A próxima etapa dos trabalhos para o combate a dengue será a realização de testes em campo, em condições diferentes das encontradas em laboratório. “Iniciaremos os testes para comprovar a eficácia do biocida na natureza. Sabemos que existe a possibilidade de as lignanas serem produzidas em larga escala de maneira sintética. Se os resultados forem positivos, estaremos bem mais próximos de um produto industrial”, disse.

A dengue tem o Aedes aegypti como principal vetor dos quatro tipos de vírus causadores da doença: Den-1, Den-2, Den-3 e Den-4. O ciclo de transmissão ocorre quando a fêmea do mosquito deposita seus ovos em recipientes com água. Ao saírem dos ovos, as larvas vivem na água por cerca de uma semana antes de se transformarem em mosquitos adultos.

A maior preocupação dos gestores em saúde pública no país atualmente, segundo Guimarães, é com o Mato Grosso do Sul. “Os grandes centros urbanos, como São Paulo, Vitória e Salvador, já tiveram epidemias causadas especialmente pelo vírus do tipo 3”, explicou. Segundo o pesquisador da Fiocruz, com exceção de bairros isolados, esses grandes centros estão isentos de grandes epidemias a médio prazo.

“Mas no Mato Grosso do Sul, onde o vírus foi introduzido recentemente e as pessoas ainda têm contato intenso com o mosquito, é alta a probabilidade de termos grandes epidemias nos próximos anos”, alertou.
(Por Thiago Romero, Agência Fapesp, 07/03/2007)

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