Se apaga o coaxar das rãs: extinção de anfíbios na América Latina adquiriu dimensões alarmantes
extinção de espécies
2007-03-06
Rãs e outros anfíbios estão se
extinguindo rapidamente em todo o mundo, sobretudo em países da América
Latina. No Caribe, até 80% das espécies estão em risco de desaparecer,
enquanto a Colômbia registra 209 espécies ameaçadas e o México 198. A
degradação ambiental, junto com a perda de hábitat, a radiação ultravioleta,
as doenças e a mudança climática são todos fatores envolvidos nestas perdas
sem precedentes. Pelo menos 43% das espécies de anfíbios estão em redução no
planeta. Calcula-se que 170 espécies de rãs, sapos e salamandras podem ter
sido extintas nas últimas duas décadas.
“Os anfíbios estão nos dizendo que há algo errado com nossos ecossistemas”,
disse ao Terramérica Robin Moore, encarregado da Conservação de Anfíbios na
não-governamental Conservação Internacional, com sede nos Estados Unidos. Os
anfíbios têm pele muito porosa, que os tornam mais vulneráveis às mudanças
ambientais do que os mamíferos, pássaros ou répteis. Alguns cientistas os
consideram uma espécie de barômetro da saúde da Terra.
Segundo a Avaliação Global de Anfíbios, que analisou a situação dos quase
seis mil anfíbios conhecidos, a situação mais grave é registrada no Caribe,
onde mais de 80% dos anfíbios estão ameaçados na República Dominicana, Cuba e
Jamaica, e um surpreendente 92% no Haiti. O Equador também registra um
panorama preocupante, com 163 espécies ameaçadas. “Há enormes quantidades de
anfíbios que nem mesmo conhecemos”, disse Moore. Encerrada em 2004, a
Avaliação Global de Anfíbios é o maior esforço já feito para determinar o
status dos anfíbios.
Apesar deste esforço, regiões como a América Latina podem ter duas ou três
vezes mais espécies não descritas de anfíbios do que as cientificamente
reconhecidas, disse o especialista. Os anfíbios são importantes
particularmente em zonas tropicais, onde são tão numerosos que têm um papel
essencial no controle de insetos que causam doenças nos humanos. Várias
espécies de rãs são pesquisadas por seu potencial medicinal. Durante muito
tempo as rãs venenosas (Dendrobatidae) proporcionaram a caçadores das
Américas Central e do Sul uma toxina que agora é transformada em novos
calmantes.
No ano passado, cientistas e organizações conservacionistas exigiram a
criação de uma Aliança de Sobrevivência de Anfíbios, uma rede global para
deter a diminuição de exemplares antes que outras centenas se extingam. O
esforço incluiria pesquisas, programas de campo, criação em cativeiro e
proteção do hábitat. Consumiria cinco anos e custaria US$ 400 milhões. Mas
ainda tem de decolar. A Aliança, que é coordenada pela Conservação
Internacional e pelo Grupo Especialista em Anfíbios da Comissão de
Sobrevivência das Espécies da União Mundial para a Natureza (UICN), espera
contratar um diretor-executivo de tempo integral nas próximas semanas.
“Arrecadamos algum dinheiro, mas de modo algum é a quantia que precisamos”,
afirmou Moore.
Há alguns dias, especialistas em anfíbios reunidos na cidade de Atlanta, nos
Estados Unidos, convocaram os zoológicos, aquários e jardins botânicos do
mundo a criarem uma Arca Anfíbia. Pediram às instituições que colaborem com
pelo menos 500 rãs de uma espécie ameaçada para protegê-las de fungos
quitridiais, de impacto mortal nos anfíbios. Cada rã será limpa para garantir
que não haja introdução dessa doença na área protegida. A organização calcula
que completar o projeto custará entre US$ 400 milhões e US$ 500 milhões.
A diminuição dos anfíbios é um problema muito maior do que um fungo perigoso,
segundo Alan Pounds, ecologista residente no Centro Científico Tropical da
Reserva Biológica Bosque Nublado Monteverde, na Costa Rica. “Não há evidência
sólida de que o fungo seja a única razão”, disse Pounds ao Terramérica. A
própria pesquisa de Pounds mostra que a mudança climática está afetando a
ecologia das encostas cobertas de neblina das Américas Central e do Sul, e
que precipitou uma redução das coloridas rãs arlequim (Atelopus), com o
desaparecimento de dois terços das mais de cem espécies
existentes desde a década de 80.
Segundo Pounds, a mudança climática parece ter criado condições mais
favoráveis para a propagação do fungo quitridial, já que o aumento das
temperaturas potencializou a camada de nuvens que cobre as montanhas,
tornando mais frescos os dias e mais quentes as noites. As rãs também são
sensíveis aos pesticidas, à má qualidade da água, à chuva ácida e a outros
contaminantes ambientais. Ao acrescentar-se a mudança climática, que altera
processos ecológicos complexos, incluindo a dinâmica das enfermidades, haverá
impactos às vezes significativos sobre as espécies.
“Parece surpreendente e escandaloso que as espécies desapareçam de reservas
naturais aparentemente virgens. Mas não há nenhum lugar do planeta que seja
virgem”, disse Pounds. O atacante global e a variedade das mudanças
ambientais fazem com que para a ciência seja muito difícil determinar
exatamente a razão de todos os membros de uma espécie de rã se extinguir após
viver na Terra por milhões de anos. É necessário manejar melhor, com
urgência, o hábitat, incluindo uma compreensão do que ocorre nos
ecossistemas, junto com uma ação sobre a deterioração ambiental e a mudança
climática para minimizar a perda de anfíbios e outras espécies, continuou
Pounds. “Deveríamos ouvir a mensagem das rãs. Elas nos alertam sobre a
deterioração ambiental que ameaça todas as espécies e o nosso próprio
bem-estar”, concluiu.
(Por Stephen Leahy, IPS, 05/03/2007)
http://envolverde.ig.com.br/materia.php?cod=28647&edt=1