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2007-03-06
A temperatura média no Chile pode aumentar até quatro graus e o mapa das chuvas sofrer uma alteração, entre 2070 e 2100, diz um estudo que o governo utilizará para elaborar ações contra os efeitos da mudança climática. Necesita-se de maior diligência, reclamam cientistas e ecologistas. “O governo tem uma atitude de reação, não pró-ação” neste assunto, disse à IPS Manuel Baquedano, presidente do não-governamental Instituto de Ecologia Política (IEPE), pois ainda não se elabora o plano de ação correspondente à Estratégia Nacional de Mudança Global, aprovada em janeiro de 2006.

O doutor em meteorologia Jorge Carrasco, que participou da redação do último informe do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC), divulgado dia 2 de fevereiro em Paris, acredita que o Executivo fez um trabalho correto, e chegou a hora de agir. “O governo chileno está em dia com a assinatura de tratados e protocolos internacionais sobre mudança climática, proteção da camada de ozônio e biodiversidade. Também aprovou uma Estratégia Nacional de Mudança Global e encomendou um estudo para determinar a variação que terão temperatura e chuvas no território. Agora, é necessário criar políticas de médio e longo prazo”, explicou Carrasco.

O plano de ação estará pronto somente no segundo semestre deste ano, informaram à IPS porta-vozes da governamental Comissão Nacional do Meio Ambiente (Conama). O plano irá considerar a identificação dos setores mais vulneráveis, medidas de adaptação e minimização e fomento da educação formal e informal em mudança climática. Também incluirá o fortalecimento das capacidades institucionais, sistêmicas e individuais, o reforço da pesquisa científica e a atualização do inventário nacional sobre emissões de gases causadores do efeito estufa, considerados responsáveis pelo aquecimento do planeta.

O órgão encarregado de sua elaboração é o Comitê Nacional Assessor sobre Mudança Climática, criado em 1996 e integrado por ministérios e serviços públicos, e pelo Comitê Técnico da Estratégia Nacional de Mudança global, formado pelo Executivo, instituições científicas e organizações não-governamentais. A Conama apresentou no dia 22 passado as conclusões do “Estudo da Variabilidade Climática no Chile para o século XXI”, encomendado à estatal Universidade do Chile, com o objetivo de estimar as mudanças de temperatura e precipitações que se registrarão no território chileno por causa dos efeitos do aquecimento global entre 2071 e 2100.

Para isso foi usado o modelo regional Precis (Porviding Regional Climates for Impact Studies), desenvolvido pelo Escritório Meteorológico da Grã-Bretanha. Este projeto apresenta dois cenários possíveis: um moderado e outro severo. No primeiro, estima-se aumento da temperatura entre um e três graus em todo o território, e no segundo o aumento ficaria entre dois e quatro graus. Devido à sua extensão, o Chile possui uma grande variedade de climas, que podem basicamente ser agrupados em três: árido desde o norte até o centro do país, temperado nas zonas centro e sul, e frio no extremo austral.

A maior variação de temperatura se daria no chamado norte grande (regiões de Tarapacá e Antofagasta) e no norte pequeno (regiões de Atacama e Coquimbo), principalmente nas zonas próximas à Cordilheira dos Andes. Também são elaborados mapas de precipitação para as quatro estações. No norte grande, especificamente no setor altiplano, as chuvas aumentariam na primavera e no verão, potencializado o fenômeno do “inverno boliviano”, chuvas de verão que às vezes causam estragos no altiplano. Por outro lado, no norte pequeno as chuvas aumentariam no inverno.

Baquedano alerta para a necessidade de adaptar as casas de toda a região norte – muitas feitas de adobe – para que possam suportar novos índices de chuva e, assim, evitar alguma catástrofe. Na zona central, entretanto, se prevê uma redução nas chuvas no verão e outono. No setor Sul, entre a região do Bío-Bío e a de Los Lagos, o índice pluviométrico baixaria 40% no verão e 25% na primavera. E nas duas regiões mais austrais, de Aysén e Magalhães, as chuvas diminuiriam 25% no verão, mas, se manteriam normais no inverno. Quanto ao nível do mar, o cenário moderado contempla uma elevação entre 14 e 24 centímetros das águas, enquanto no severo o aumento ficaria entre 16 e 28 centímetros.

O IPCC, máximo organismo que atua no contexto da Organização das Nações Unidas e é formado por cientistas e representantes de 110 países, ratificou em fevereiro que a mudança climática é causada pela atividade humana, responsável pela emissão de gases que causam o efeito estufa, como dióxido de carbono, metano e óxido nitroso, os quais intensificam a retenção do calor do sol na atmosfera. A temperatura da Terra poderia súber até quatro graus até o final deste século, modificando o regime de chuvas e o nível do mar, o que intensificaria catástrofes climáticas como ondas de calor, inundações e secas. Da mesma forma, prosseguiria o derretimento das geleiras e a destruição da diversidade biológica, afirma o IPCC.

A chilena Estratégia Nacional estabelece que este é “um país social, econômica e ambientalmente vulnerável ao fenômeno, por possuir zonas costeiras baixas; zonas áridas e semi-áridas; áreas susceptíveis ao desmatamento ou erosão, aos desastres naturais, à seca e à desertificação; áreas urbanas altamente contaminadas e ecossistemas frágeis”. As conclusões do estudo serão incluídas na Segunda Comunicação nacional que o Chile deve fazer à Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, ratificada em 1994, e que já recebeu um primeiro relatório do país em 2000.

Segundo projeções do IPCC e o estudo da Conama, Carrasco acredita que o principal impacto do aquecimento global no território chileno será o progressivo retrocesso e desaparecimento das geleiras, principalmente na zona norte. Coincidentemente, Baquedano considera indispensável contar com uma lei de proteção das geleiras, já que cerca de 60% da água doce disponível no país provêm destas massas de gelo, afirmou.

O IEPE, o também não-governamental Programa Chile Sustentável e a sindical Sociedade Nacional de Agricultura apresentaram em janeiro ao governo de Bachelet uma proposta a respeito, que esperam seja acolhida e enviada ao parlamento para ser discutida, embora prevejam um forte debate com o setor de mineração público e privado, grande consumidor de água. A Conama estima que outros setores prioritários que podem ser afetados pela mudança climática são “agricultura, geração de energia e área florestal”. No caso da agricultura, será necessário estudar eventuais modificações nos períodos de plantio e colheita, bem como os produtos que serão potencializados de acordo com as condições do outono, disse Carrasco.

Enquanto é elaborado o plano de ação, o governo trabalha em uma estratégia nacional de proteção de bacias, informou a Conama. Baquedano acredita que este ano será fundamental na luta contra o aquecimento global. Por isso, decidiu trabalhar pela candidatura do ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, ao prêmio Nobel da Paz, concedido em outubro. Gore, que visitará o Chile em maio, é protagonista do documentário “Uma verdade incômoda”, baseado nas conferências que fez em todo o mundo alertando sobre os devastadores efeitos da mudança climática, e que acaba de receber o Oscar.
(Por Daniela Estrada, Envolverde, 05/03/2007)
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