ARTIGO: VOTAÇÃO SIMULADA DA ALTERAÇÃO DO CÓDIGO FLORESTAL
2001-10-29
Por Edélcio Vigna
Nas votações da Câmara dos Deputados, a orientação de voto das lideranças partidárias, em geral, é seguida pelas respectivas bancadas. O trabalho de Limongi&Figueiredo indica que estamos longe de observar o comportamento partidário caótico e desordenado vislumbrado pela literatura especializada. A atuação dos partidos políticos brasileiros em plenário segue um padrão ideológico bastante definido. É essa premissa que orienta os exercícios sobre a votação do substitutivo do deputado federal Moacir Micheletto (PMDB-PR) ao projeto de lei que dispõe sobre o Código Florestal. Conforme a pesquisa de Limongi&Figueiredo, de um total de 1.317 votações, apenas em 33 as orientações dos líderes partidários não foram seguidas. Quanto à coesão partidária, o estudo revela que a unidade interna dos partidos de esquerda independe de como votam os demais partidos. Já a disciplina dos partidos de centro e de direita varia amplamente de acordo com a posição assumida pelo outros partidos. Essa informação revela uma variável a ser considerada na votação do substitutivo de Micheletto. Em uma interpretação aberta, podemos avaliar que os partidos de centro e de direita tendem a se fracionar em menor grau nos casos de uma aliança entre eles próprios (continum ideológico) e em maior grau nos casos de aliança com a esquerda. A votação do substituto Micheletto é uma disputa atípica. Há uma situação na qual a base de sustentação do Governo (centro e direita) alia-se aos partidos de esquerda, tendo como adversários a Bancada Ruralista, cujos membros integram as bancadas governistas. Dessa forma, o que se manifesta não é uma disputa ideológica no sentido de existirem posições divergentes, mas uma disputa na qual está em jogo o interesse particular de um setor da sociedade - os ruralistas -, contra a ampla maioria dos partidos que compõem o Congresso Nacional. Mesmo considerando a atipicidade e a inconsistência da votação, pode-se antecipar o seu resultado com razoável grau de segurança. Os poucos estudos sobre os Ruralistas diferem quanto ao número de membros da Bancada. Tomamos por base três pesquisas: a do INESC, a do DIAP-Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar- e a da PATRI-Consultoria em Relações Internacionais. A primeira detectou 85 deputados; a segunda, 169 e a terceira, 189. As duas últimas aproximam-se, mas nada garante que estejam corretas, assim como a do INESC. O diferencial é que o INESC considerou como critério de classificação a principal fonte de renda do deputado, enquanto os outros Institutos não explicitaram a metodologia. Assim, o parlamentar que tem renda, inclusive secundária, proveniente de relações patronais rurais, foi listado como ruralista ou aliado potencial. Considerando o resultado destas pesquisas, foi organizado um grupo de trabalho (GT INESC/ISA ), que reavaliou os números e realizou novas consultas. Chegou-se ao número de 175 deputados que, em princípio, votarão contra o Substitutivo Micheletto. A pesquisa de Limongi&Figueiredo, em 1999, analisou o comportamento em plenário dos sete maiores partidos da época (PFL, PTB, PDS, PMDB, PSDB, PDT e PT). O então PDS tornou-se o PPB, e os pequenos partidos não foram considerados, porque se comportam como os grandes partidos correspondentes, além de não terem poder de veto ou de chantagem. Houve um crescimento expressivo das representações evangélicas, que se filiaram ao PL, PST e PSL. Esses três partidos possuem hoje 31 deputados e formam a sexta bancada da Câmara. É certo que nem todos os deputados desses partidos são evangélicos, mas provavelmente são maioria. O estudo de Limongi&Figueiredo utilizou o índice de Rice para determinar, a partir das votações pesquisadas, o Desvio-Padrão (DP) por partido. De acordo com esses índices, fizemos um exercício sobre um possível resultado. Tomando como base as identidades ideológicas dos partidos, fizemos alguns ajustes para simular a votação do Código Florestal. Por exemplo, utilizamos o mesmo desvio-padrão do PFL para os partidos de centro e de direita que não estavam na pesquisa original. Utilizamos, da mesma forma, o índice do PT para os partidos de esquerda. O que nos permitiu essa generalização é a afirmação de que - a disposição dos partidos no continuum ideológico direita-esquerda emerge de maneira nítida. Para elaborar o cenário Sertões, somou-se o número de ruralistas ao número de dissidentes, obtendo os votos favoráveis ao Substitutivo (175). Depois, foram subtraídos os votos favoráveis do número total de deputados (513), obtendo o número de votos contra a proposição:338. Este primeiro exercício aponta para uma rejeição do Substitutivo Micheletto por 338 contra 175 votos. Temos, neste caso, já definidos pouco menos de 2/3 do total dos votos (Plenário:513). Há, no entanto, outro terço de deputados que não quiseram manifestar o seu voto (Desconhecidos:182). Sobre esse grupo aplicamos o desvio-padrão para estipular o número de dissidentes (49), que somados aos favoráveis revelará, em tese, o número de votantes para aprovação do Substitutivo. Este segundo exercício aponta para uma rejeição do Substitutivo Micheletto por 289 contra 224 votos. Para elaboração deste cenário, o GT INESC/ISA mapeou, a favor do Substitutivo, 171 deputados governistas e 4 da oposição. Contra o Substitutivo, 103 da oposição e 53 deputados de partidos da base parlamentar do Governo. Não se manifestaram sete deputados da oposição e 175 da base do Governo. Essas simulações apontam para a necessidade de um grande trabalho de pressão por parte das organizações da sociedade civil, para melhorar a performance do cenário Veredas e proporcionar um ambiente que possibilite atingir, pelo menos, uma média entre as duas simulações. Se a primeira simulação (Cenário Sertões) indica uma rejeição do Substitutivo Micheletto por uma grande margem de votos (162), na segunda (Cenário Veredas) temos a rejeição por uma pequena diferença de votos (66).