Iema confessa à Justiça Federal que deixa Vale do Rio Doce funcionar sem licença
cvrd
2007-03-02
A Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) vem funcionando, pelo menos em parte, sem licença ambiental. A informação está contida no parecer técnico do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) e é feita à própria Justiça Federal, em resposta a processo aberto contra a empresa, uma das responsáveis pela poluição do ar na Grande Vitória.
Na ação, a Associação Nacional dos Amigos do Meio Ambiente (Anama) requer a condenação da Vale ao pagamento de R$ 500 milhões, a título de indenização à comunidade, pela poluição que promove. Requer ainda a condenação de órgãos públicos, como a União - Ibama, Governo do Estado - Iema e Prefeitura de Vitória, todos por omissão.
Ao se manifestar no dia 22 deste mês ao juiz da 4ª Vara Federal "em réplica" à resposta do Iema no processo, o advogado Antenor Vinícius Caversan Vieira, que defende a Anama, afirma que o parecer técnico juntado pelo Iema aponta que o órgão não exigiu licença ambiental para a central de prensa e mistura das Usinas de Pelotização de I a IV e VIII, assim como para a Usina de moagem de carvão e respectivo sistema de transporte.
Também não tem licença ambiental a ampliação do pátio ferroviário intermediário de carga, o sistema de descarga de granéis sólidos, virador de vagões, pátios primários L e M, segunda peneira da usina de pelotização IV. "O que demonstra que a CVRD vem funcionando, ao menos em parte, sem licenças ambientais", comenta o advogado.
A omissão do Iema em fiscalizar a empresa é desta forma confirmada à própria Justiça Federal. Em relação à contestação do Governo do Espírito Santo, diz o advogado Antenor Vinícius Caversan Vieira: "O Estado do Espírito Santo não invocou preliminar de ilegitimidade. Todavia, o mesmo raciocínio que se fez em relação à situação da União - Ibama se aplica aqui: o fato de o Estado ter delegado a uma autarquia estadual, o Iema, a execução da política ambiental, não retira sua responsabilidade, nos termos do art. 23, VI, da Constituição Federal".
E quanto à contestação do Iema? Ele afirma: "A preliminar invocada pelo Iema confunde-se com a discussão de mérito. Alega o Iema, em preliminar, que estaria exercendo devidamente o seu poder de polícia e fiscalizando, matéria cuja discussão pertence ao mérito da causa".
Além de observar que o próprio Iema juntou documentos que comprovam que "a CVRD funciona sem determinadas licenças ambientais", diz o advogado que "Por outro lado, os pareceres técnicos acostados pelo órgão são absurdamente simplistas, não fizeram sequer análises à luz da medicina das partículas emitidas pela CVRD. Os documentos sequer esclarecem os limites impostos à referida Companhia, o que demonstra o total descaso e abandono para com as necessidades da população e dos seres vivos".
Em outro trecho afirma que "ao que se percebe, o órgão público é ineficiente, e desta ineficiência se vale a CVRD para continuar poluindo. Ao que é do conhecimento da autora (a Anama), o Iema sequer contava com quadro próprio de servidores, sendo que os monitoramentos ambientais eram realizados por pessoal contratado a prazo determinado ou "emprestados" de outros órgãos, podendo inclusive haver conflitos de interesses".
No processo "determinados profissionais que prestam serviços ao Iema (serão servidores concursados do órgão?) confessam que sequer existe um padrão fixado para medição de partículas submicrômicas. E que estaria celebrando um convênio com a Ufes para que, 'uma vez concluídos os trabalhos, será possível a verificação e a determinação da origem dos particulados para que, a partir daí, sejam estabelecidas metas de redução para cada um dos setores responsáveis pela sua geração!'"
O advogado Antenor Vinícius Caversan Vieira afirma que "em outras palavras: o Iema confessa que, até o presente momento, não fez absolutamente nada no que diz respeito ao assunto. Como seus técnicos não conseguem sequer chegar a uma conclusão a respeito do padrão para medir as partículas, obviamente não as está medindo. A população está entregue à própria sorte. E há décadas de total descaso."
Considera "curioso que o laudo técnico referido sequer é assinado por um médico. Os profissionais que o assinam não possuem competência técnica para determinar aquilo que é ou não nocivo à saúde. Aliás, não é assinado sequer por um engenheiro ambiental!"
No raciocínio do advogado; "Logo, mesmo superficialmente, verifica-se a gravidade da situação, motivo pelo qual a autora roga a este Juízo que profira o despacho saneador, assegurando às partes a produção das provas que o direito lhes assegura".
A Anama "requer a produção da prova pericial, a ser realizada por uma equipe mista indicada pelo Juízo, que avalie o aspecto médico, de engenharia ambiental, biólogo marinho e avaliação imobiliária. Pode ser necessário, ainda, que o engenheiro ambiental necessite da colaboração de químico e engenheiro mecânico ou metalúrgico".
A Anama "afirma na inicial que as rés, pessoas de direito público, são omissas e, além disso, autorizam a poluição e não tomam providências suficientes para evitar o prejuízo à saúde da população, à poluição das residências e da Baía de Vitória".
Por isso requereu a condenação tanto da CVRD, como da União - Ibama, quanto do Governo do Estado - Iema, e prefeitura de Vitória. Os órgãos públicos pela omissão, exceto a prefeitura de Vitória que se comprometeu em Juízo a participar na ação junto com a Anama, e não como ré, o que foi aceito pela Anama.
(Por Ubervalter Coimbra, Século Diário - ES, 01/03/2007)
http://www.seculodiario.com.br/arquivo/2007/marco/01/noticiario/meio_ambiente/01_03_09.asp