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novas espécies
2007-03-02
O colapso das barreiras de gelo da Antártida, devido às mudanças climáticas, permite à ciência dar uma olhada sobre formas de vida submarina ocultas por mais de cinco mil anos. Porém, a luta pela sobrevivência tem nessa região dimensões épicas. Uma expedição internacional de 10 semanas, para esquadrinhar os segredos desta região, se antecipou ao grande esforço científico que representará o Ano Polar Internacional, que começou na última segunda-feira. Um dos locais de interesse é o maciço de gelo de um quilômetro de espessura que cobre o continente austral, que inclui grandes áreas diretamente sobre o mar.

Debaixo dessa coberta, nas escuras e frias profundidades, sobrevivem estranhas formas de vida das quais cientistas tinham notícia apenas indiretamente, através de perfurações no gelo. “Há todo tipo de seres jamais vistos antes”, disse o cientista-chefe do Censo da Vida Marinha, Ron O’Dor, cuja organização realizou outras 12 expedições à Antártida. O aquecimento do planeta causou o colapso das barreiras de gelo Larsen A, há 12 anos, e B, há cinco anos, o que deixou exposta uma porção do leito marinho antártico de 10 mil quilômetros quadrados, pela primeira vez entre cinco e 12 milênios.

Mais de 50 cientistas de 14 países passaram 10 semanas, encerradas em 30 de janeiro, a bordo do navio quebra-gelo Polarstern, do Instituto Alfred Wegener da Alemanha, pesquisando o que poderia ser a região mais virgem do planeta Terra. “O colapso das barreiras Larsen podem nos dizer muito sobre o impacto das mudanças climáticas na biodiversidade marinha e do funcionamento dos ecossistemas”, disse Julian Gutt, do Instituto Alfred Wegener de Pesquisa Polar e Marinha e chefe científico da expedição do Polarstern. “Estivemos em condições, que não se repetirão, de realizar uma amostragem em um ecossistema marinho considerado entre os menos perturbados do planeta pela ação do homem”, afirmou Gutt.

As mudanças climáticas têm um considerável impacto nas regiões polares, tanto no mar Ártico quanto na Antártida. Esse é o tema central do Ano Polar Internacional, um esforço de 50 mil cientistas de mais de 60 países que terá custo de US$ 1,7 bilhão nos próximos dois anos. O que ocorre nas regiões polares tem repercussões em todo o planeta, e nelas as mudanças climáticas se manifestam mais rapidamente do que em qualquer outra parte.

“A passagem de neve e gelo para água é o ponto de quebra do sistema”, disse Chris Rapley, diretor da Pesquisa Antártica Britânica em uma videoconferência desde a expedição. “Nos próximos dois anos, procurarei avançar em assuntos-chave, como a resposta das barreiras de gelo às mudanças climáticas e a resposta às perguntas sobre o aumento do nível do mar: quanto? Com qual rapidez?, acrescentou. As barreiras de gelo Larsen estão na península Antártida, território cujo aquecimento nos últimos 50 anos foi quatro vezes mais rápido do que no restante do planeta.

Cientistas da expedição Polarstern utilizaram veículos submarinos operados por controle remoto para extrair amostras e estimar a resposta da vida marinha às mudanças. “Encontramos uma surpreendente mescla de criaturas de águas profundas e outras colonizadoras”, disse à IPS o biólogo Gauthier Chapelle, da Fundação Polar Internacional, com sede em Bruxelas. Entre as espécies de águas profundas figuram os nenúfares e seus parentes, os pepinos marinhos e ouriços do mar, encontrados fundo do mar. Tais espécies se adaptaram a viver ali, sem luz e com pouco alimento.

Poucos seres podem sobreviver nessas condições. Os cientistas estimam que a quantidade de animais ali encontrados seja cem vezes menor ao das áreas do mar de Weddell. Mas, espécies colonizadoras começam a mudar de lugar, como polvos e águas vivas. “A diversidade e abundancia de celápodos (espécies de polvo) é incrível”, disse à IPS Elaina Jorgensen, ictiologista da Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera dos Estados Unidos, órgão estatal com sede na cidade de Seattle.

“Os vídeos mostram que estão cavando no fundo do mar em lugar de viver sobre as rochas, como costumam fazer”, acrescentou. Além disso, a expedição identificou 15 novas espécies de criaturas semelhantes ao camarão, que ainda requerem análises mais detalhadas. Também encontraram grandes quantidades de krill, crustáceo que tem entre três e cinco centímetros de comprimento que constituem a base da cadeia alimentar dos oceanos austrais. Os bancos de krill atraíram para a área cardumes de peixes e baleias. “Foram avistadas quatro baleias bicudas de Arnoux, e isso é uma grande notícia porque são muito raras”, disse Jorgenson. Esta espécie mede 10 metros de comprimento e só é encontrada nos oceanos do Sul. Outra espécie encontrada é a baleia mink, mais numerosa e menor.

Porém, esta revitalização biológica dos mares antárticos pode ser temporária. Os gelos submarinos são o habitat natural do plâncton, organismos microscópicos flutuantes, animais e vegetais, que constituem o principal alimento do krill, que, por sua vez, nutre boa parte dos peixes e mamíferos marinhos da área. Uma baleia azul adulta, por exemplo, come por dia quatro milhões de krills. E uma redução da população de plâncton causaria uma redução dos bancos de krill, o que provocaria um grande impacto nos ecossistemas da região.

“Fica muito difícil prever o futuro dos elos superiores da cadeia alimentar, como os animais que vivem no fundo do mar ou os peixes”, afirmou Gutt. De todo modo, é evidente que “ocorrerá uma grande mudança na biodiversidade de Larsen, e o ecossistema, único, debaixo das barreiras de gelo desaparecerá”, concluiu. O drama submarino que já se constata debaixo das desaparecidas barreiras é uma competição entre espécies naturais da região, que enfrentam difíceis condições de sobrevivência, e outras que se trasladam para essa área, agora que o sol atinge níveis mais baixos da água, o que permite o crescimento de fitoplâncton (plâncton vegetal).
(Por Stephen Leahy, IPS, 01/03/2007)
http://envolverde.ig.com.br/materia.php?cod=28479&edt=1

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