Gaúchos vão à Antártida para avaliar a parcela de culpa do aquecimento global no sumiço da plataforma de gelo Larsen B
2007-03-01
Pesquisadores do Rio Grande do Sul embarcam para a Antártida no próximo verão para tentar estabelecer uma verdade inconveniente: se a quebra da plataforma de gelo gigante Larsen-B, que chocou os cientistas em 2002, foi um fenômeno único ou já se repetiu em algum ponto dos últimos séculos.
A equipe do Núcleo de Pesquisas Antárticas e Climáticas da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) viajará com chilenos e americanos a um platô a 2.000 metros de altitude na península Antártica. A expedição é um dos projetos do Brasil para o Ano Polar Internacional, mutirão de pesquisa que será lançado hoje (1/3).
O principal objetivo dos projetos de pesquisa do programa é compreender melhor a dinâmica do gelo, em especial nas calotas polares da Antártida e da Groenlândia. Essas duas regiões concentram cerca de 70% da água doce do planeta e são a chave para estimar o quanto o aquecimento global afetará o nível do mar no futuro.
O platô Detroit, local escolhido para a expedição brasileira, é emblemático nesse sentido. Ele está no topo da bacia de drenagem da plataforma Larsen, no mar de Weddel, que perdeu uma de suas partes em 2002.
O derretimento, em si, não apresentou risco para o nível dos oceanos: afinal, elas já estava flutuando sobre o mar -pense no gelo em um copo de refrigerante, que não aumenta seu nível quando derrete. Por outro lado, ele causou a aceleração das geleiras continentais rumo ao mar, afetando indiretamente o nível dos oceanos.
Durante dois meses, os cientistas vão perfurar a capa glacial do platô em busca daquilo que foi a plataforma Larsen nos últimos 2.000 anos. "Esse local foi escolhido porque a 150 km dali a temperatura esquentou 3C nos últimos 50 anos, muito mais que a média global", disse à Folha o glaciologista Jefferson Simões, que lidera a expedição brasileira.
O grupo vai tentar obter cilindros de gelo que revelem a composição química do ar naquele local ao longo dos últimos dois milênios. É possível obter essa informação analisando a composição de bolhas de ar aprisionadas durante a deposição da capa glacial. Isso revela a temperatura na cabeceira da Larsen nesse período.
Simões diz que não é possível provar categoricamente que o aquecimento global causou o desprendimento da Larsen. "Mas, ao menos para esse período [de 2.000 anos], poderemos falsear essa hipótese", diz.
A missão também tentará determinar se a precipitação de neve ali agora está menor que o total de gelo lançado no mar.
(Por Claudia Angelo, Folha de São Paulo, 01/03/2007)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe0103200701.htm