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2007-03-01
O advogado Nereu Lima, que defende Luiz Ruppenthal, acredita que o Ministéiro Público “trocou os pés pelas mãos” e atrapalhou a investigação da Polícia no caso da Utresa, importando-se mais em dar uma satisfação à mídia, na busca de um culpado para a mortandade de peixes. Além de pareceres técnicos de especialistas de renome internacional na área de efluentes, Lima pretende mostrar que as Prefeituras também são culpadas porque não procedem ao tratamento de esgotos domésticos na bacia do Sinos. Segundo ele, um laudo da própria Fepam corrobora essa tese. Ele recebeu a reportagem do AmbienteJÁ, em seu escritório, em um prédio que dá de frente para a Assembléia Legislativa, no Centro de Porto Alegre, para conceder a seguinte entrevista no último dia 12 de fevereiro – dia em que a Lei dos Crimes Ambientais completava nove anos. Segundo o advogado, essa lei “é pedagógica” e não prevê punições severas. Essa constatação, portanto, entra em rota de colisão com o sumiço de Luiz Ruppental. Se a pena não é alta, por que ele não se apresenta à Justiça? O advogado não respondeu a esta questão.

AmbienteJÁ – Qual a situação da defesa neste caso?
Advogado Nereu Lima – Em relação a essas acusações, é evidente que nós só estamos nos pronunciando sobre elas através dos veículos de comunicação porque, infelizmente, o Ministério Público fez um grande estardalhaço, utilizou inclusive a mídia, a televisão, o rádio, os jornais, praticamente ele, o Ministério Público foi quem investigou, foi quem forneceu os elementos investigatórios para ele mesmo denunciar. Ele investigou e ofereceu os dados, o resultado da investigação para ele mesmo, Ministério Público, e ele mesmo é quem ofereceu a denúncia.

AmbienteJÁ – Isso chega a ser uma irregularidade?
Lima – Sim, no nosso ponto de vista, ele exerceu uma atribuição que não era sua. A Constituição Federal prevê, expressamente, que a tarefa de investigar crimes é da competência da Polícia. Se são crimes federais, quem investiga é a Polícia Federal. Se são crimes estaduais, que é a regra, quem investiga é a Polícia Estadual.

AmbienteJÁ – Mas a Polícia teve chance de começar a investigação?
Lima – Teve. Exatamente por isto é que nas diligências que eu requeri, no processo criminal, estou perguntando se o Ministério Público se dirigiu, oficiou, comunicou à Polícia ou não. Se caso não tivesse comunicado, quais as razões, para ver se havia algum voto de desconfiança, em outras palavras, em relação à Polícia. Porque essa tarefa, pela Constituição, é bem claro, que é da competência privativa da Polícia Estadual, a não ser que o Ministério Público tenha outros elementos com os quais possa oferecer a denúncia, E tanto isto é verdade que há pouco tempo atrás houve uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que é quem fiscaliza a constitucionalidade das leis e das atribuições e disse claramente que a tarefa de investigar é da Polícia e que o Ministério Público tem o controle externo da investigação policial. Pode controlar e tem o poder de requisitar à Polícia uma série de investigações porque ele vai oferecer a denúncia, mas não a tarefa de investigar, porque senão a Polícia judiciária seria um órgão meramente decorativo. Há uma síntese de um habeas corpus julgado pelo Supremo Tribunal Federal, através da segunda turma, o habeas corpus é de número 81.326-7, onde figura como relator o então ministro Nélson Jobim. Em síntese, diz da decisão a respeito das atribuições constitucionais do Ministério Público: “Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de autoria de crimes.” Ou seja, o Ministério Público não tem competência, pela Constituição, para investigar crimes. E é uma decisão da mais alta corte de Justiça...

AmbienteJÁ – Mas a Polícia não investigou porque o Ministério Público já havia feito a investigação ou ela foi coibida de investigar?
Lima – Foi afastada. Pura e simplesmente afastada pelo Ministério Público. O Ministério Público não tomou conhecimento da Polícia. Ele se precipitou, simplesmente direcionou – e aí é que está o perigo da parcialidade – quando ele direcionou todas as suas baterias para o meu cliente, Luiz Ruppenthal. E ele foi cobrado, havia uma cobrança da mídia, diante daquela mortandade de peixes. O meu cliente foi sacrificado, investigado, acusado e julgado quando não era tempo de julgar. E agora, mesmo que ele seja absolvido, já está condenado. Eu entendo que o Ministério Público não deveria ter se deixado levar pela pressão natural da mídia. E nessa ânsia de buscar culpados tenha se contentado em eleger um em ausência de busca de outras causas.

AmbienteJÁ – Mas isso partiu de onde?
Lima – Do promotor da comarca de Estância Velha.

AmbienteJÁ – O que implica isso na defesa do réu?
Lima – Aí é que vem o resultado do prejuízo concreto. É que como a investigação do Ministério Público foi toda ela sigilosa e toda ela parcial, do meu ponto de vista, ele é parte do processo, ele não permitiu nenhum acesso de defesa, não permitiu nenhuma possibilidade de a defesa acompanhar as investigações que estavam sendo procedidas e, conseqüentemente, com prejuízos, agora, praticamente irreparáveis à medida que essa prova toda já foi produzida antes, e o processo penal democrático, ele permite ao réu a participação em todas as provas.

AmbienteJÁ – Mas a defesa já estava constituída quando houve essa investigação?
Lima – Mas de qualquer forma, a empresa, a Utresa, que hoje ela também está sendo processada criminalmente, ela teria todo o direito de se defender e, coincidentemente, a Utresa, na época, ela tinha uma diretoria. Tanto que a diretoria hoje está se defendendo, estão sendo processados criminalmente a Utresa, pessoa jurídica, e o meu cliente, Luiz Ruppenthal, pessoa física.

AmbienteJÁ – O Sr. defende a pessoa física?
Lima – Só e exclusivamente a pessoa física.

AmbienteJÁ – E quem defende a pessoa jurídica?
Lima – É o Dr. Fernando Couto [atual presidente da Utresa].

AmbienteJÁ – Há informação de que o [então, em 12 de fevereiro] presidente da Fepam teria sido advogado da Utresa. Que implicações isso tem para as relações entre a empresa e o órgão ambiental?
Lima – É... eu não tenho essa informação, não sei, não saberia dizer, afirmar categoricamente. Mas eu creio que essa informação não é procedente.

AmbienteJÁ – Mas há notícias de que o [então] presidente da Fepam teria sido assessor jurídico da Secretaria do Meio Ambiente já no governo anterior, fazendo assessoria jurídica para Utresa, ao mesmo tempo. Pela legislação que rege a profissão do advogado, isso não é possível...
Lima – Não, não haveria impedimento não.

AmbienteJÁ – Pelo Código de Ética dos advogados não haveria impedimento?
Lima – Não, desde que ele não perdesse a independência profissional, porque o advogado não pode é perder a sua independência intelectual. Ele pode emitir pareceres, mas o que ele não poderia é ser funcionário da empresa e, ao mesmo tempo, ser assessor jurídico da Fepam. Isso não. Mas, digamos, essa circunstância, de ele integrar os quadros da Utresa, nunca me veio essa informação, pelo menos nunca chegou ao meu conhecimento.

AmbienteJÁ – Nem por documentos o Sr. sabe?
Lima – Nem por documentos. Até porque, se tivesse documento, ele poderia ter seu nome impugnado. O que eu sei é que havia uma disputa acirrada de membros de direção da Fepam que gostariam de assumir a presidência. De técnicos. Dentre eles, um cidadão chamado Jackson Müller, que foi quem foi o responsável pelas denúncias e investigações em relação à Utresa. Esse seria um dos que almejaram...nada mais natural.

AmbienteJÁ – Mas não foi o Ministério Público, como o Sr. disse, que fez um estardalhaço?
Lima – Não, o Ministério Público fez. Só que o Jackson foi quem foi providenciar a elaboração do laudo técnico, denunciando, porque o Ministério Público não tem conhecimento, não tem condições técnicas de detectar o que aconteceu. Não teria condições, não teria infra-estrutura. Então ele se socorreu da Fepam. Tanto que os laudos com base nos quais ele denunciou, e as constatações, as possíveis irregularidades, elas são produto desta investigação técnica que foi acompanhada pessoalmente pelo Ministério Público.

AmbienteJÁ – Qual a situação do processo hoje?
Lima – Já foi marcada uma audiência para o dia 15 de março, às 14h, quando serão ouvidas todas as testemunhas, tanto as arroladas na denúncia – senão me engano, um deles é o próprio Jackson Müller e outros técnicos – quanto as de acusação. Mas o importante é que agora a defesa finalmente pode apresentar, digamos, a sua verdade. Até agora, foi a verdade da acusação.

AmbienteJÁ – Quem são as testemunhas de defesa?
Lima – São várias pessoas, inclusive de várias áreas, mas há, principalmente, um cidadão que vai ser ouvido, que elaborou um parecer e é uma das maiores autoridades mundiais em poluição ambiental, que é o Dr. Mário Farias Peirano. É um consultor ambiental. Ele tem pós-graduação, mestrado e doutorado no Japão e na Inglaterra. E é gaúcho.

AmbienteJÁ – Ele elaborou um parecer a respeito da Utresa?
Lima – Isto mesmo.

AmbienteJÁ – Mas ele conhece a Utresa?
Lima – Não só conhece como foi lá no local. Fez uma avaliação técnica. É interessante... um dos itens que me chamou a atenção é quanto aos esgotos domésticos. Diz ele: “O esgoto doméstico proveniente da população locada ao longo do trecho compreendido entre a Utresa e o local da mortandade dos peixes – aquela mortandade do dia 8 de outubro – em nenhum momento foi levado em conta na acusação. Gostaria de acrescentar, sobre o assunto, o que segue.” Ele diz que “se ao longo do trecho houvesse uma estimativa – por baixo – de 200 mil habitantes, dos moradores chamados ribeirinhos, se cada habitante produz diariamente uma carga orgânica, que são fezes e urina, de 54 gramas, cada habitante produz diariamente um volume de 120 litros de despejos domésticos, teríamos, no mínimo, dez quilos por dia, ou seja, aproximadamente onze toneladas por dia de carga orgânica lançada in natura ao longo do trecho, valor esse astronomicamente superior ao do chorume acidentalmente lançado pela Utresa nos corpos receptores, ao longo dos dias, meses e anos”.

AmbienteJÁ – Ele diz “acidentalmente lançados”?
Lima – “... Acidentalmente lançado pela Utresa, que ao longo dos dias, meses e anos é lançado nos corpos receptores, certamente causando uma grande deposição do lodo no fundo do leito do Arroio Portão.”

AmbienteJÁ – A defesa vai trabalhar com a tese de que são os municípios que não tratam o esgoto, que eles é que são os responsáveis?
Lima – Não, são várias causas, não é? Seria muito simplista desconsiderar este fato. Os dejetos domésticos... além dos dejetos domésticos, ele enumera outros fatores: os dejetos orgânicos, que não são, necessariamente, da responsabilidade da Utresa. Outra situação que não foi analisada e que, coincidentemente, faz parte, agora já não mais do parecer técnico desse especialista, mas que é um laudo da Fepam, que eu puxei, inclusive pela Internet, sobre exatamente essa mortandade, esse laudo que serviu de base para a acusação. E o que diz o laudo? Os dados desse trecho aqui são fundamentais para a defesa.

AmbienteJÁ – O que diz aí?
Lima – “Dados históricos da qualidade da água do Rio dos Sinos – Fepam , relatório de qualidade, site tal... – analisados pela Fepam desde 1990 e divulgados permanentemente através do site da Fepam, demonstram uma contínua degradação da qualidade de água da bacia hidrográfica associados a um contínuo crescimento populacional da área, crescimento esse não acompanhado pelo devido tratamento dos efluentes domésticos. Estes fatos, associados às coletas e análises realizados pela Fepam no período, permitem concluir que a causa provável da mortandade dos peixes ocorrida no dia 8 de outubro de 2006 foi asfixia, causa motivada pela associação de período de baixa vazão – associação das características hidrológicas do trecho da mortandade – com período de estiagem e com a fase de início da irrigação de culturas, com a carga orgânica normalmente lançada neste recurso hídrico, efluente industrial e esgoto cloacal e in natura, ocorrendo depleção de oxigênio em níveis tais, não permitindo a manutenção de vida aquática. Dados que corroboram esta conclusão encontram-se no documento anexo com suas respectivas bibliografias.

AmbienteJÁ – Mas o que tem a ver com a defesa esse trecho?
Lima – Ele [o documento] está dizendo, em outras palavras, quais foram as causas que levaram... são múltiplas, como ele diz, é uma sinergia de causas.

AmbienteJÁ – O Sr. vai trabalhar com a tese de que, na dúvida, não existe um crime?
Lima – Não, não se pode atribuir a ele [Ruppenthal] tudo o que existe de mau no mundo ecológico, não é? Então, atribuir ao meu cliente o fenômeno da piracema [reprodução de peixes], que era o que estava ocorrendo nesse período...Atribuir ao meu cliente o fenômeno da estiagem, da seca, no rio, da baixa vazão. Atribuir ao meu cliente... eles calcularam, esse laudo aqui calculou em 200 mil a população ribeirinha. Ela hoje está muito além, ela está quase batendo no teto de um milhão ao longo de todo o Vale do Rio dos Sinos. Atribui o lançamento de dejetos domésticos, de dejetos industriais, à retirada de água do Rio dos Sinos, para irrigação de arroz.

AmbienteJÁ – Qual acusação formal pesa sobre o Sr. Ruppenthal?
Lima – Ele é acusado de poluição ambiental. É um crime... ele é acusado de poluir dolosamente, e nós não aceitamos essa tese. Essa empresa dele foi criada exatamente para dar proteção ao meio ambiente, ou seja, para conter aqueles resíduos que são lançados pelas empresas poluidoras e transformá-los, e dar-lhes uma destinação final.

AmbienteJÁ – Mas o volume tratado pela Utresa não estava acima de sua capacidade de tratamento?
Lima – Bem, isto é um problema que estava se agravando, até porque nós sabemos que ali é uma região de curtumes, muito intensa. Principalmente ali, na nascente.

AmbienteJÁ – O documento do Dr. Peirano foi produzido exclusivamente para esta defesa ou já existia?
Lima – Ele é um documento que foi... as partes têm direito de produzir prova técnica e testemunhal.

AmbienteJÁ – Há mais alguém sendo acusado com o Sr. Ruppenthal, em razão de ter concedido licença ambiental para a Utresa?
Lima – Não, ali no processo criminal, não. É até interessante sob o ponto de vista legal, porque, se houver algum processo contra algum técnico da Fepam, pode até desviar a competência da Justiça estadual e ir para a Justiça federal.

AmbienteJÁ – Por quê?
Lima – Porque meio ambiente tem competência concorrente, não é só do Estado. É de interesse de todo o país.

AmbienteJÁ – O Sr. vê a Utresa como um bode expiatório na questão da poluição do Rio dos Sinos?
Lima – Não um bode, está sendo um boi. Um boi de piranha. Precisavam dar uma satisfação para a mídia, então escolheram o meu cliente.

AmbienteJÁ– Dizem que o Sr. Luiz Ruppenthal foi visto em Estância Velha. Ele está mesmo foragido?
Lima – O juiz o considera foragido. Ele, a partir do momento em que não compareceu à audiência, não foi ao interrogatório marcado nos primeiros dias de janeiro, o juiz... tecnicamente, o termo que nós usamos é revelia. Ele se torna revel, aí o processo segue sem a presença do réu.

AmbienteJÁ – Uma vez que o réu está foragido, como o Sr., que o representa perante a Justiça, se comunica com ele?
Lima – É que... a minha defesa, ela não necessita da presença e nem do meu contato com o cliente.

AmbienteJÁ – Então o Sr. não precisa ouvir o seu cliente?
Lima – Não, o advogado trabalha com os dados técnicos, principalmente num tipo de crime desses, que é um crime de natureza técnica, digamos, que exige dados técnicos, eu estou trabalhando em cima desses laudos, e agora, através de depoimentos de técnicos. Quais são os técnicos? Os técnicos da Fepam – eles vão ter que me explicar, eles foram arrolados na denúncia... Eles vão ter que me explicar se foi o meu cliente o responsável por tudo isto, por toda esta mortandade de peixes – e única e exclusivamente o meu cliente –, primeira opção, se foi o meu cliente e outros, se foram outros, com um percentual maior, ou se não se pode definir exatamente qual é a participação mais grave ou menos grave de cada um. Eles vão ter que me dizer.

AmbienteJÁ – E isso é quase impossível de dizer?
Lima – Se for quase impossível eles dizerem, não há elementos para uma condenação.

AmbienteJÁ – O Sr. acha que essa é a maior certeza da eficácia da sua defesa – que não haja objetividade na argumentação da acusação?
Lima – É. A rigor, do meu ponto de vista houve uma precipitação do Ministério Público.

AmbienteJÁ – Mas por que o Ministério Público teria interesse em se precipitar?
Lima – Primeiro, o impacto na mídia. A mídia foi para cima do Ministério Público, e ele precisava dar uma satisfação. E deu.

AmbienteJÁ – Poderia ter sido em relação às prefeituras, por exemplo, que não investem no tratamento de esgotos?
Lima – É, mas simplesmente ele [Ministério Público] lavou as mãos quanto às prefeituras, fez uma política de boa vizinhança com as prefeituras, inclusive com a prefeitura de Estância Velha. E, com isso, aproveitou para, digamos, dirigir toda a sua bateria de canhão para cima de uma pessoa que nem estava presente.

AmbienteJÁ – Por que foi negado o habeas corpus ao réu?
Lima – Eu entrei com habeas corpus aqui no Tribunal de Justiça do Estado sustentando a tese de defesa com todos esses argumentos que te expus, inclusive dizendo que a própria lei, e o autor da lei, que é um desembargador federal, Vladimir Freitas, diz expressamente que essa lei [Lei 9.605/98, dos Crimes Ambientais] foi criada não para prender ninguém, que é uma lei pedagógica. Essa lei prevê, expressamente, a possibilidade de fiança. Eu vou explicar como funciona. A fiança está prevista no Código de Processo Penal, desde que a pena mínima cominada não seja superior a dois anos. E aqui... ele foi enquadrado no artigo 54 – “Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resulte ou possa resultar em danos à saúde humana ou que provoque a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora. Pena: reclusão de um a quatro anos.” Em resumo, na prática, não tem nenhuma pena superior a dois. Logo, é cabível a fiança. Os comentadores da lei dizem: “Por derradeiro, cumpre observar que diante da filosofia da nova lei ambiental, Lei 9.605, a prisão do infrator é medida excepcional.” Quem diz isto são os comentadores da lei – Valdimir e Gilberto Freitas. Foram eles que fizeram a lei. E eles dizem que a finalidade da Lei dos Crimes Ambientais não é pôr todo mundo na cadeia.

AmbienteJÁ – Mas já se ouviu falar de decretações de prisões por casos de pequeno dano ambiental, como, por exemplo, extrair a casca de uma árvore rara para fazer um chá...
Lima – Aí arbitra a fiança. Os comentadores da Lei dos Crimes Ambientais dizem: “Com efeito, as penas corporais são baixas e quase todas admitem substituição por penas restritiva de direito, o que se vê é uma intenção evidente do legislador no sentido de não levar ao cárcere os acusados de delitos ambientais. Em sendo assim, a liberdade provisória, com ou sem fiança, será a regra.” E é com base neste fundamento aqui que eu estou tentando o habeas [corpus]. Aí como eu perdi o habeas... eles usaram um outro argumento: que o réu está foragido e não enfrentou essa minha questão.

AmbienteJÁ – Não seria melhor para ele se apresentar?
Lima – A questão da apresentação é uma questão pessoal dele. Ele tem lá seus motivos, deve ter.

AmbienteJÁ – Ele não fala com ninguém?
Lima – Não, não fala e eu não sei.. teria que ver com os familiares dele. Bem, de qualquer forma, eu estou aguardando a publicação desse acórdão, que os argumentos sejam publicados. Isso deve ocorrer daqui a uns 15 dias. Com base nesse acórdão, eu entro com novo pedido de habeas corpus. Eu vou entrar agora com habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça em Brasília. Esse habeas corpus é exclusivamente para que ele responda o processo em liberdade. Ele é réu primário, nunca teve nenhum antecedente criminal. E eu considero a prisão preventiva dele totalmente descabida.

AmbienteJÁ – Mesmo com o habeas corpus tramitando no STJ, em Brasília, o processo permanece na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul?
Lima – Por enquanto sim... depende. Houve uma notícia, tem um ofício nos autos de que a Polícia Federal está requisitando informações a respeito do eventual envolvimento de funcionários da Fepam.

AmbienteJÁ – Envolvidos no quê?
Lima – Em algum fato que ela não deixou bem claro ainda. Ela está investigando.

AmbienteJÁ – Seria concessão irregular de licença?
Lima – É... então, isso aí implicaria o deslocamento da competência. Porque a Justiça federal é especializada. Ela atrai a competência.

AmbienteJÁ – Mas o funcionário da Fepam é um funcionário estadual.
Lima – É estadual, mas se considera que o crime ambiental tem lastros federais. Digamos, o ambiente diz respeito a toda a União, ao país.

AmbienteJÁ – Quando o Sr. soube que a Polícia Federal está investigando esse crime?
Lima – Isso está nos autos do processo.

AmbienteJÁ – Desde o início está investigando?
Lima – Não sei se desde o início, mas o ofício é recente.

AmbienteJÁ – Na defesa do Sr. Ruppenthal, além do parecer do Dr. Peirano, quem mais vai se manifestar?
Lima – Tem o depoimento de vários técnicos. Tem engenheiros, ambientalistas, biólogos... são profissionais independentes. São pessoas que vão chegar á contendo a denúncia. E os próprios técnicos da Fepam que elaboraram este relatório e o laudo da Fepam, com aquelas conclusões, eles vão ter que explicar isso em pormenores. Eles vão ter que transformar para uma linguagem de leigos, porque nós não somos especialistas... o próprio juiz que vai julgar não tem condições – digamos, condições técnicas de alta compreensão, porque não é a área dele, entender o que é uma violação ao meio ambiente, quais são as causas, o que é um chorume, o que é um talude, qual é a razão por que ocorrem as piracemas, qual é a intensidade dessa série de fatores, desse conjunto, que leva à mortandade de peixes? No crime é diferente do cível. Para que se possa condenar alguém, é preciso cem por cento de certeza.

AmbienteJÁ – Quantas são as testemunhas?
Lima – Em torno de 20 o total. Mas só que tem muitos que não moram lá [Estância Velha] e serão ouvidos em outros lugares.

AmbienteJÁ – São mais testemunhas de acusação ou de defesa?
Lima – Mais de defesa.

AmbienteJÁ – Os bens do réu estão indisponíveis por determinação da Justiça, mesmo antes do julgamento?
Lima – É, essa é mais uma medida drástica, violenta. Inclusive é uma situação sui generis porque a esposa dele [Ruppenthal] está doente, muito doente... tem a filha que está lá também. Então, no crime, a Constituição Federal, que é a lei maior, tem uma garantia que diz que nenhuma pena poderá passar da pessoa do acusado, do réu. E a filha e a esposa estão sofrendo, indiretamente porque as contas todas foram bloqueadas, todas as transações.

AmbienteJÁ – O Sr. acredita que isso vai forçar a apresentação do Sr. Ruppenthal na audiência do dia 15 de março?
Lima – Tudo é possível.

AmbienteJÁ – O Sr. orientaria o réu a se apresentar?
Lima – Eu não diria que daria uma orientação... ele é que vai saber o que é melhor para ele.

Lei amanhã entrevista com o promotor de Justiça de Estância Velha, Paulo Eduardo de Almeida Vieira.
(Por Cláudia Viegas, AmbienteJÁ, 01/03/2007)

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