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2007-02-26
Começaram na sexta-feira (23/02) e prosseguem até hoje (26/02) diversos atos pela revitalização e contra o projeto de transposição das águas do Rio São Francisco. Os eventos acontecem desde Belo Horizonte (MG) até Juazeiro (BA). A chamada "jornada de lutas" é articulada por entidades e movimentos populares, em oposição ao projeto do governo federal. As ações tiveram início na quinta-feira (22/02), quando o bispo da Diocese de Barra, D. Luiz Cappio, protocolou carta dirigida ao presidente Lula. Nela o franciscano pedia a volta do diálogo e medidas políticas mais lúcidas.

Organizados e previstos para acontecer em seqüência, nas regiões que compõem a Bacia do Rio São Francisco, não têm data prevista para terminar. A intenção é pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF), para que os ministros analisem a questão, uma vez que apenas o ministro Sepúlveda Pertence deu parecer sobre o caso. Além disso, espera-se preparar organizações e movimentos para ato que acontecerá, no mês de março, em Brasília.

Sub-médio São Francisco
Juazeiro (BA) é o local escolhido para manifestação que reunirá cerca de duas mil pessoas, nesta segunda-feira (26/02). A concentração será pela manhã, com a participação de artistas populares da região. Em seguida haverá uma caminhada pelas ruas do centro, até a cidade de Petrolina (PE), onde acontecerá outro ato.

A organização é articulada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT); Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP); Sindicatos dos Trabalhadores Rurais de Juazeiro, Curaçá, Santa Maria da Boa Vista, Orocó e Lagoa Grande; MAB; Sindicato dos Assalariados (Juazeiro); Organizações Não Governamentais; Rede de Mulheres; Povos indígenas (Truká e Tumbalalá); Pastoral dos reassentados.

Os manifestantes são de pelo menos dez municípios baianos, daquela região - entre eles: Pilão Arcado, Remanso, Casa Nova, Sento Sé, Sobradinho, Curaçá e Paulo Afonso; municípios pernambucanos: Santa Maria da Boa Vista, Lagoa Grande, Orocó e Petrolândia. Além disso, participam pessoas de Alagoas e Sergipe - dos municípios do Baixo São Francisco que estão na confluência com aqueles estados.

Médio São Francisco
No domingo (25/02) manifestaram-se aproximadamente oitocentas pessoas de diferentes cidades daquela região, em Ibotirama (BA). O ato aconteceu durante a celebração de lançamento do Diretório Nacional de Catequese, seguido por uma caminha pelas ruas da cidade. Houve uma apresentação sobre a atual situação de degradação da Bacia. Previsto para iniciar às 9h, teve na organização as dioceses de Barreiras, Barra e Lapa - da Igreja Católica.

Alto São Francisco
Desde a quinta-feira (22/02) entidades se movimentam em Belo Horizonte em ações contra a transposição do Rio São Francisco. Durante o lançamento da Campanha da Fraternidade, no Parque da Cidade, foram distribuídos cerca de cinco mil panfletos. Estes chamavam as pessoas para se juntar às próximas manifestações.

Na sexta-feira (23/02) os professores da rede pública municipal foram envolvidos nas discussões. Durante três reuniões que aconteceram durante o dia, cada uma com 80 escolas, um dos temas abordados foi o apoio a campanha pela revitalização e contra a transposição. Os professores deverão paralisar as atividades dia 28, quando o tema será novamente debatido.

Um breve histórico do desenrolar desta negociação
Um dia antes do recesso do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Sepúlveda Pertence suspendeu as liminares que impediam o licenciamento do projeto de transposição do Rio São Francisco. No dia 7 de fevereiro, o Fórum Permanente de Defesa do Rio São Francisco entrou com um recurso no STF contra a decisão do ministro Sepúlveda Pertence. O ministro considerou todas as entidades da sociedade civil que haviam entrado com as ações ilegítimas para abrirem processos junto ao STF. Algumas ações foram extintas sem apreciação do pedido. O recurso apresentado pelo Fórum sustenta que a tentativa de excluir as entidades do processo ofende o direito de ação que lhes é garantido na Constituição Federal e requer, com isso, que as organizações da sociedade civil sejam reconhecidas como partes legítimas para a defesa junto ao STF.

No dia 14 deste mês, o ministro da Integração Nacional, Pedro Brito, em entrevista, disse que os editais de licitação para as obras de integração do Rio São Francisco com as bacias hidrográficas do nordeste setentrional seriam publicados após o Carnaval. Os editais da obra divididos em 14 lotes totalizam R$ 3,3 bilhões e os de supervisão, R$ 84 milhões. Pedro Brito concedeu a entrevista depois de participar de reunião com o presidente Lula e com a equipe responsável pela estruturação e acompanhamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado pelo Governo Federal em janeiro.

Carta do Bispo Dom Cappio
Barra, 21 de fevereiro de 2007 - Quarta-feira de Cinzas
Caro Presidente Lula
Paz e Bem!

Escrevo-lhe hoje, dia em que a Igreja do Brasil lança a Campanha da Fraternidade 2007 sobre a Vida da Amazônia e toda a sua riqueza humana e natural.

O objetivo desta carta, amiga e fraterna, é retomar o diálogo que assumimos juntos por ocasião de nosso encontro no dia 15 de dezembro de 2005 em sua sala de trabalho no Planalto.

Agradeço pelas oportunidades que os representantes da sociedade brasileira e os representantes do governo tivemos de iniciar o debate sobre assuntos tão importantes como: Projeto de Revitalização do Rio São Francisco, Projeto de Transposição de águas do Rio São Francisco, Projeto de Desenvolvimento Alternativo para o semi-árido brasileiro, na busca de um consenso que soe em acontecer numa sociedade democrática.

Retomo o diálogo justamente quando a humanidade, estarrecida, toma consciência das conseqüências do aquecimento global, com impacto em todo o planeta, particularmente na vida de bilhões de seres humanos, inclusive na já historicamente oprimida e humilhada população nordestina.

Retomo o diálogo quando o Rio São Francisco, mais assoreado, sofre uma grande cheia e sua população ribeirinha, a quinhentos metros do rio, passa sede, como mostrou, nessa semana, o Jornal Nacional.

Retomo o diálogo quando uma menina morreu afogada em um dos canais que supre os perímetros irrigados de Petrolina -Pe, por ter ido "roubar" água para matar sua sede e de sua família.

Retomo o diálogo quando o senhor fala em iniciar as obras de transposição que irá consumir inicialmente 6,6 bilhões de reais, mais de 50% de todo o orçamento destinado a recursos hídricos no Programa de Aceleração de Crescimento (PAC).

Retomo o diálogo quando o Tribunal de Contas da União (TCU) afirma publicamente, em seu relatório, que o Projeto de Transposição de Águas do São Francisco não beneficia o número de municípios e de pessoas que afirma atingir.

Retomo o diálogo quando o mesmo Tribunal , através do acórdão 2020/2006 determinou ao Ministério da Integração e ao Ministério da Defesa que não utilizem recursos públicos para execução de obra de transposição enquanto não houver decisão definitiva sobre a validade de licença prévia concedida pelo Ibama.

Retomo o diálogo quando a Agência Nacional de Águas (ANA), organismo de Estado, criado para a gestão estratégica do uso da água no Brasil, propõe 530 obras para solucionar os problemas de abastecimento hídrico até 2015 em todos os núcleos urbanos acima de 5.000 (cinco mil) habitantes do semi-árido brasileiro até 2015. Essas obras beneficiariam as populações mais necessitadas, e custaria 3,6 bilhões de reais, portanto, mais baratas, mais abrangentes, mais eficientes que qualquer obra de transposição hídrica.

Em nosso encontro, acima referido, o senhor me disse que "não seria louco de levar essa obra à frente se apresentássemos uma alternativa melhor". Agora, somando as obras propostas pela ANA juntamente com as iniciativas de captação, armazenamento e manejo de água de chuva desenvolvidos pela Articulação do Semi-Árido (ASA), o senhor tem uma chance de escolha muito melhor, pela qual seu governo ficará marcado para sempre na história do nordeste brasileiro, sua terra natal.

Não faltam alternativas. Falta uma decisão política mais lúcida. Nosso pedido, senhor presidente, é que se retome o diálogo e que se garanta que seja amplo, transparente, verdadeiro e participativo, incluindo toda a sociedade do São Francisco e do Semi-Árido, conforme foi pactuado em Cabrobó em outubro de 2005 e renovado através de pedido formal por carta protocolada em 6 de fevereiro último.

Senhor presidente, sempre vestimos sua camisa. Ainda estamos vestidos nela. Nossa contribuição de fiel militante da causa do povo é para que o senhor seja verdadeiramente aquilo a que se propôs, o de ser o presidente de todo o povo brasileiro, especialmente dos pobres deste país, por serem os que mais necessitam de sua atenção.

Receba nossa saudação amiga e fraterna, com os votos de uma Feliz e Santa Páscoa de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Dom Frei iz Flávio Cappio,OFM - Bispo Diocesano de Barra - Bahia
(Adital, 23/02/2007)

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