Comitê da Bacia do São Francisco cobra debate sobre usina nuclear às margens do rio
2007-02-16
O jornal O Estado de S. Paulo publicou, em sua edição do dia 11/2, uma reportagem que surpreendeu muita gente, ao informar que a Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN – classificou as margens do rio São Francisco como “o lugar ideal” para a instalação de uma das centrais nucleares previstas no novo programa nuclear brasileiro.
Com grande fluxo de água, o rio permitiria o resfriamento dos reatores das usinas sem maiores danos ao ecossistema, segundo explicou à publicação o presidente da CNEN, Odair Gonçalves. O projeto prevê a instalação de uma central com até três usinas na região, carente no abastecimento de energia.
A proposta já havia vazado em 30 de novembro passado, quando, na solenidade comemorativa aos 50 anos da CNEN, no Rio de Janeiro, o ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, disse que “a capacidade de geração hidrelétrica do São Francisco está esgotada e não há outros rios de grande porte no Nordeste. A construção de uma usina nuclear seria um fator importante de desenvolvimento da região. Seria uma fonte de empregos e permitiria o crescimento econômico local”.
Como no caso da transposição – cujas licitações da obra o governo anuncia para depois do Carnaval -, o Comitê da Bahia Hidrográfica do Rio São Francisco cobra mais diálogo sobre o projeto – ou melhor, diálogo apenas, já que não houve nenhum.
“Isso deveria ser precedido de um grande debate”, coloca Anivaldo de Miranda, ex-secretário executivo do Comitê e hoje ainda um de seus membros. “O Governo continua preso à visão autoritária de impor soluções mágicas, de mega-projetos”, diz, avaliando que é preciso, ao contrário, focar um programa sustentável de desenvolvimento do semi-árido brasileiro a partir de discussões que incluam os governadores, a comunidade científica e a sociedade civil organizada.
Miranda destaca que não tem, a princípio, maiores restrições ao uso da energia nuclear, embora ressalte que ela requer “um grande controle sócio-ambiental”. Preocupa-o, porém, a pouca confiabilidade a que os poderes públicos brasileiros fazem jus em vários quesitos, vide o exemplo do caos na segurança pública. “Quem nos garante que o Governo é capaz de controlar a energia nuclear?"
Segundo ele, a falta de diálogo prévio é ainda mais crítica porque, no cômputo geral, o Governo já programou para o São Francisco não só as três usinas da central nuclear, mas também três barragens. “Tudo isso deveria fazer parte de uma discussão que o Governo prometeu e que até hoje não realizou”, diz, evocando a greve de fome de Dom Luiz Flávio Cappio, bispo da Diocese de Barra (BA), entre o final de setembro e o início de outubro de 2005.
A reunião plenária do Comitê da Bacia do São Francisco marcada para março próximo terá prioritariamente em sua pauta a proposta do Governo. “O Comitê tem que ser consultado”, antecipa Miranda, para quem o poder público deveria definir uma matriz energética. “O semi-árido brasileiro tem quase um milhão de quilômetros quadrados, com incidência de sol praticamente o ano inteiro”, destaca, apontando a área como propícia ao desenvolvimento da energia solar. “Mas o Governo continua pensando em grandes mega pacotes tecnológicos.”
(Por Mônica Pinto, AmbienteBrasil, 16/02/2007)
http://www.ambientebrasil.com.br/noticias/index.php3?action=ler&id=29548