Na estrutura do Ibama, o setor que mais esteve na berlinda durante o primeiro governo Lula foi, sem dúvida, aquele responsável pela concessão de licenciamentos ambientais. Em meio às acusações de “entrave ao desenvolvimento” recebidas pela área ambiental do governo - e que se intensificaram no início desse ano -, o Ibama sempre foi encarado pelos críticos como o vilão-mor que paralisava os projetos de infra-estrutura necessários ao país. Na melhor das hipóteses, o órgão era acusado de lentidão e ineficiência.
Apesar da má fama propagada por uma parcela da sociedade, o setor de licenciamento ambiental do Ibama apresentou nos últimos quatro anos uma melhora de desempenho que se comprova nas estatísticas. Em 2006, foi registrado o maior número de licenças ambientais concedidas num mesmo ano pelo órgão em toda sua história. Foram 278 licenças em todas as modalidades e fases do licenciamento - prévia, instalação e operação - para empreendimentos nos setores de energia, de transportes e de exploração e produção de petróleo e gás.
Após uma redução em 2003, primeiro ano do governo Lula, em relação ao ano anterior, o número de licenças ambientais concedidas pelo Ibama vem aumentando a cada ano. Em 2004, foram 222 concessões para os mais diversos tipos de empreendimento. Esse número chegou a 237 em 2005 e saltou para o recorde de 278 licenças concedidas no ano passado. Mesmo com o número reduzido de licenças concedidas em 2003 (foram 145), o ritmo de concessões no governo Lula foi superior ao registrado no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso. Em 1999, foram 131 licenças concedidas. Em 2000, o Ibama concedeu 145 licenças, número que cresceu para 151 em 2001 e 192 em 2002. Não é possível fazer comparações com o primeiro governo de FHC (1995/1998) porque o levantamento do Ibama parte de 1999.
O setor de transportes e infra-estrutura levou a maior fatia do recorde de licenças ambientais concedidas pelo Ibama em 2006. Foram 143 licenças para empreendimentos como rodovias, ferrovias, portos, hidrovias e aeroportos, além de empreendimentos nas áreas de agricultura, pesquisa e exploração mineral. Em seguida, vem o setor energético, que recebeu 85 concessões para instalação e regularização de usinas hidrelétricas, nucleares e termelétricas, além de linhas de transmissão e gasodutos e outros projetos para a utilização de fontes alternativas de geração de energia. Em terceiro lugar aparece o setor de petróleo e gás, que recebeu 50 licenças para empreendimentos diversos, incluindo os novos projetos de monitoramento da expansão da rede de gasodutos e de aproveitamento das reservas nacionais de gás natural.
Diretor de Licenciamento Ambiental do Ibama, Luiz Felippe Kunz aponta o esforço de reestruturação do órgão como principal alavanca na busca por uma maior eficiência e agilidade na concessão de licenças. Ele lembra que a Diretoria de Licenciamento somente foi criada no ano passado, depois de longos anos em que o setor esteve misturado às áreas de fiscalização e de qualidade ambiental: “Agora, o Ibama tem uma diretoria específica para licenciamento e três coordenadorias para cada tipo de empreendimento. Ganhamos muito em capacidade de gerenciamento”, afirma.
Kunz destaca também o fortalecimento do quadro de servidores do Ibama, que aumentou cerca de 30% durante o governo Lula: “Tínhamos poucos servidores efetivos no quadro, além de muita gente terceirizada e, na maioria das vezes, sem o conhecimento técnico necessário. Com a chegada e permanência de servidores efetivos, agora podemos desenvolver uma cultura interna de licenciamento. Isso ajuda a guardar o conhecimento sobre os processos e a aumentar a velocidade na concessão de licenças. Não adianta ter a estrutura montada na teoria se não há profissionais para fazê-la funcionar na prática. O setor de licenciamento do Ibama tinha um esqueleto, mas agora estamos colocando uma musculatura sobre ele”.
Empresários também atrasam
O diretor de Licenciamento Ambiental do Ibama afirma que boa parte da culpa pelo atraso nos empreendimentos que recai sobre o órgão deveria ser creditada aos empresários e investidores envolvidos em determinados projetos. Ele cita como exemplo o caso do gasoduto Urucu-Porto Velho, que recebeu a licença ambiental em outubro de 2005 e até agora não entrou em funcionamento por divergências entre os investidores. Outro exemplo dado por Luiz Felippe Kunz é a usina hidrelétrica da Serra do Facão, na divisa entre Minas Gerais e Goiás, que recebeu licença de funcionamento em 2002 e até agora não está operando devido a questões societárias: “Os exemplos são muitos. Imagina se fôssemos nós que estivéssemos atrasando um empreendimento há dois ou quatro anos. Já estaríamos crucificados pela mídia. Com os empresários, o tratamento é outro”, diz.
Kunz avalia que as críticas ao Ibama são fomentadas por setores empresariais que não querem investir em medidas ambientais: “Existe um setor que acha que vai diminuir seus lucros se investir em prevenção ambiental e que gostaria que as licenças fossem concedidas automaticamente. Esse setor vê o Ibama como um cartório onde podem entrar e sair na mesma hora com um carimbo aprovando seus projetos, mas a população brasileira já não aceita que empreendimentos destruam o meio ambiente”. Para Kunz, esse setor do empresariado tende a se tornar cada vez mais minoritário: “Trata-se, na maior parte dos casos, de pessoas que estavam acostumadas à lógica predatória dos anos 70 e 80, quando não se tinha cuidado com o ambiente”, diz.
O exemplo das usinas hidrelétricas, segundo Kunz, retrata bem como as informações veiculadas sobre o Ibama nem sempre se baseiam em fatos concretos: “Nos últimos quatro anos concedemos licença para 22 hidrelétricas. Somente uma - a usina de Ipueiras, no rio Tocantins - foi indeferida. Licenciamos cinco mil megawatts, mas ainda assim dizem que o Ibama é contra as hidrelétricas”. Parte das hidrelétricas aprovadas pelo Ibama, segundo ele, demorou a entrar (ou ainda não entrou) em funcionamento por problemas dos investidores: “Todas as dificuldades devem ser compreendidas, só não se pode utilizar o meio ambiente como bode expiatório ideológico de dificuldades que nada têm a ver com a proteção ambiental e sim com as relações internas e com o caixa de algumas companhias”, diz.
Preparados para o PAC
O Ibama busca agilidade, e não pressa desnecessária, no seu processo de licenciamento ambiental: “Às vezes o processo é demorado porque é complexo. Para conceder a licença para um empreendimento, o Ibama é obrigado a ouvir os estados e municípios envolvidos e a realizar audiências públicas. Se a área do empreendimento envolve sítios arqueológicos, precisamos ouvir o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional); se atinge populações indígenas, precisamos ouvir a Funai; se atinge quilombolas, precisamos ouvir a Fundação Palmares. Isso gera alguma demora, mas não podemos abrir mão de envolver na discussão todas as partes interessadas naquele projeto”.
Em relação à concessão de licenças para os projetos previstos no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) anunciado recentemente pelo governo, o diretor de Licenciamento Ambiental do Ibama se mostra tranqüilo: “A maioria dos projetos previstos nos setores de transporte e de energia, por exemplo, já tem licença prévia”, comemora Kunz. Além disso, o Ibama deve fortalecer em breve o quadro do setor de licenciamento: “O governo já autorizou a convocação de 305 servidores aprovados em concurso para o Ibama, dos quais 42 virão trabalhar na parte de licenciamento”.
(Por Maurício Thuswohl,
Agência Carta Maior, 08/02/2007)