O Brasil produz 88 milhões de toneladas de lixo por ano. Quase 5% desse total correspondem ao plástico, que é depositado nos lixões do país e que demora mais de 100 anos para se decompor. Esse quadro preocupante pode ser atenuado a partir do projeto desenvolvido por Cynthia Ditchfield, do Laboratório de Engenharia de Alimentos da Escola Politécnica (Poli) da USP. A pesquisadora, em seu projeto de pós-doutorado, desenvolveu um filme plástico à base de amido de mandioca e açúcares que poderá ser uma nova opção para embalagens de alimentos.
Além de comestível, o polímero natural possui uma grande vantagem ambiental: é biodegradável. “Ao contrário de uma embalagem plástica convencional, a biodegradável é consumida em poucos meses, seja pelo ambiente ou pelo próprio consumidor. Já é uma maneira de reduzir a imensa quantidade de lixo que existe”, afirma Cynthia.
Esse projeto já havia sido iniciado na Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp, com a pesquisadora Pricila Veiga dos Santos. Cynthia assumiu o projeto há um ano e a partir daí vem obtendo alguns avanços na pesquisa.
Inovação
Interação da embalagem com o produto de acordo com sua acidez.
A - Repolho roxo, B - Uva e C - uma jaboticaba.
A principal novidade do projeto, que o caracteriza como sendo pioneiro, é a iniciativa de criar uma embalagem que fosse biodegradável e ativa ao mesmo tempo, isto é, com propriedades que façam com que a embalagem interaja com o produto e com o consumidor. Para isso, foram testados ingredientes como cravo, canela, mel, própolis, café e pimenta, que possuem propriedades antibacterianas, auxiliando no processo de conservação do alimento. Cynthia explica que atualmente existem apenas produtos que possuem essas propriedades separadamente, e que a idéia de uni-las em um só filme plástico é inédita. “Esses ingredientes comestíveis que testamos atuam como antimicrobianos, conservando o alimento fresco por mais tempo, pois inibem o crescimento de microorganismos”, afirma a pesquisadora.
A outra propriedade ativa da nova embalagem também vem para facilitar a vida do consumidor. O plástico, através de um indicador de pH (índice que indica o grau de acidez, neutralidade ou alcalinidade de um meio qualquer), muda de cor caso o alimento já esteja estragado. “A pessoa terá oportunidade de ver se o alimento está em boas condições ou não, sem abrir a embalagem”, diz Cynthia, que explica que mesmo sem atingir o prazo de validade, alguns produtos, principalmente os refrigerados, podem já estar deteriorados: “ou então, mesmo passando um dia da data de validade, o alimento ainda esteja bom para ser consumido. Agora, já temos condições de saber isso”.
Atualmente, o filme plástico está passando por uma fase de testes e está em desenvolvimento. Cynthia diz que o objetivo agora é melhorar cada vez mais o produto, consertando suas deficiências. A questão da barreira de umidade é o principal problema que a pesquisadora enxerga para ser solucionado. “Queremos dar uma maior proteção ao produto. Além disso, pretendemos aumentar ainda mais a resistência do filme, que já é boa”, diz.
Comercial
Além das vantagens ambientais, o novo filme plástico pode trazer benefícios econômicos. Como o Brasil é o segundo maior produtor mundial de mandioca, Cynthia diz que o alimento foi utilizado na intenção de agregar valor ao produto. “A idéia é aproveitar que temos essas matérias-primas em abundância, sempre tentando valorizar os produtos nacionais”, defende a pesquisadora.
Substituir conservantes sintéticos pelos ingredientes antimicrobianos testados pode ser, segundo Cynthia, uma outra forma de economizar e racionar custos.
A pesquisadora explica que a criação do filme ainda é um processo muito artesanal, e fazê-lo em escala industrial seria, no momento, inviável, mas acredita em adaptações para a indústria: “Creio que muito do que já é utilizado nos plásticos convencionais poderia ser aproveitado. É questão de ajustar os parâmetros”. Ela espera que com os testes, parcerias com indústrias e empresas possam ser feitos em breve: “vamos continuar pesquisando e trabalhando, porém tudo isso só vai ter uma aplicação se alguma industria se interessar por fazer e vender comercialmente”, conclui.
(Por Carolina Landulfo,
USP online, 07/02/2007)