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2007-02-06
Da nascente à foz, o rio Cristalino serpenteia protegido. Primeiro, sobre áreas mantidas pelo exército, na Base Aérea do Cachimbo, no sul do Pará. Depois, a cruzar uma imensidão de vida que o governo de Mato Grosso decidiu preservar, há quase sete anos.

O cenário que se vê ao longo de seu leito, porém, não dá um testemunho preciso sobre a integridade dos 184 mil hectares do Parque Estadual do Cristalino. Nas porções sul e leste da unidade, principalmente, o cenário é de grandes alterações.

Na última semana, a reportagem acompanhou uma equipe da campanha SOS Cristalino – movimento que reúne dezenas de entidades ligadas ao meio-ambiente e ao ecoturismo, além de instituições de pesquisa e ensino – em um sobrevôo à área mais agredida do parque.

O trajeto é suficiente para derrubar uma das justificativas oficiais para a redução aprovada pelos deputados: a presença de centenas de famílias sem-terra e de pequenos lavradores que teriam se estabelecido em vários pontos da área protegida.

“São famílias desprovidas de recursos financeiros, que necessitam da área para sua subsistência”, diz trecho de ofício encaminhado pelo então presidente da Assembléia Legislativa e atual vice-governador do Estado, Silval Barbosa, ao Ministério Público Estadual.

Do alto, é possível perceber que as áreas abertas em nada se assemelham à ação de pequenos ocupantes. O que se vê são desmatamentos de grande extensão, contínuos, sem o mínimo sinal de barracos ou acampamentos. Pequenos lavradores, somente em assentamentos erguidos fora da área protegida.

Outra explicação estaria relacionada à exclusão de áreas que já estavam alteradas antes de 2001, quando o Cristalino foi ampliado em direção à serra do Rochedo. Argumento semelhante sustentava a proposta de redefinição defendida pela Sema, que previa uma redução de apenas 3 mil hectares.

De fato, entre 1992 e 2001, a área que seria mais tarde estabelecida para o parque perdeu 13,4 mil hectares de matas nativas. A maior parte, 7 mil hectares, entre 1995 e 1997. Depois da criação da unidade, porém, este ritmo se alterou. E para muito pior.

Imagens de satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) provam que, entre 2003 e 2004, o Cristalino perdeu uma área equivalente a 11 mil campos de futebol. No ano seguinte, o total acumulado chegou a 17 mil hectares, resultado 30% maior do que o registrado antes dos decretos de criação.

Ao se comparar as imagens com o novo mapa, percebe-se que as linhas seguem com exatidão os rastros deixados pela ação dos agressores do parque (ver quadro) – em especial, os pecuaristas Antônio José Junqueira Vilela e Wilson Sierra, proprietários de áreas extensas no entorno do parque (ver matéria).

Das áreas abertas antes da criação, segundo levantamento da ong Instituto Centro de Vida (ICV) a partir de dados da Sema, a nova demarcação retirou 12,4 mil hectares (93% do total). Do total aberto posteriormente, foram excluídos 12,5 mil hectares (73%).

A lei 8.616, que ratificou a redução, foi promulgada em 26 de dezembro de 2006. Há uma semana, o juiz José Zuquim Nogueira, da Vara Especializada do Meio Ambiente, concedeu liminar suspendendo seus efeitos.

“Os Senhores Deputados (...) estão privilegiando uma minoria de indivíduos, sem qualquer justificativa convincente, o que nos leva à conclusão que, indubitavelmente, agiram contrário ao interesse público”, diz, em trecho de seu despacho.

Por telefone, o deputado Sérgio Ricardo (PPS), novo presidente da Assembléia Legislativa, preferiu não comentar a questão e nem confirmar quando ou se haverá algum recurso à decisão. “Nossa assessoria jurídica ainda está analisando o caso”.
(Por Rodrigo Vargas, Diário de Cuiabá, 04/02/2007)
http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=277782

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