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2007-01-31
Só quem nunca acompanhou o trabalho da ministra Marina Silva de perto pode alimentar a errônea visão, difundida até mesmo por parte da grande imprensa, de que ela é frágil politicamente. Durante o primeiro governo Lula, por mais de uma vez foi declarada a derrota de Marina e da política ambiental representada por ela e sua equipe no Ministério do Meio Ambiente (MMA), sem que isso, no entanto, se verificasse na prática.

Houve reveses, está certo. Como, por exemplo, na questão dos transgênicos, onde a avançada posição internacional do Brasil, construída pelo MMA e pelo Itamaraty, é contrariada no plano interno por uma postura permissiva do governo e do Congresso em relação às transnacionais que querem introduzir os transgênicos no país. Mesmo com essa e outras derrotas pontuais, no entanto, o que se viu nesses últimos quatro anos foi que a variável ambiental nunca esteve tão presente na elaboração de políticas públicas no Brasil. Além disso, o avanço obtido em termos de fortalecimento da legislação e de combate aos crimes ambientais também não encontra precedente em nenhum governo anterior.

A ministra não esconde seu desejo de que tudo isso fique bem claro. A poucos dias de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se livrar da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados e, finalmente, poder se debruçar sobre a reforma ministerial, Marina Silva ainda não sabe se permanecerá no posto, apesar dos inúmeros apoios públicos que tem recebido das organizações dos movimentos sociais e ambientalistas. Mesmo assim, a ministra parece conter a ansiedade e garante que apoiará a decisão do presidente, de quem, afirma, sempre recebeu apoio. Ainda assim, quem ouviu Marina nos últimos dias percebeu em seu discurso a vontade de afirmar o que foi feito em sua gestão e mostrar que, mesmo com uma eventual saída do governo, ela continuará na luta pelo fortalecimento da política ambiental no Brasil.

Foi com esse estado de espírito que a ministra compareceu à sede do Ibama no Rio de Janeiro na sexta-feira (26/01) para entregar novos veículos e visitar as obras de ampliação do prédio. Em seu discurso para os funcionários do Ibama e, mais tarde, num papo exclusivo com a Carta Maior, Marina Silva avaliou sua gestão, criticou governos anteriores e apontou as políticas pelas quais, dentro ou fora do governo, ela promete lutar para que tenham continuidade. A ministra também fez considerações sobe o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) anunciado recentemente pelo governo e negou que o meio ambiente tenha sido negligenciado durante a elaboração do pacote. Leia abaixo as principais declarações da ministra Marina Silva.

Sobre as obras previstas no PAC e a possibilidade de flexibilização das questões ambientais no programa lançado pelo governo
“Essas obras já vêm sendo colocadas. Desde o Avança Brasil, elas sempre estiveram colocadas. Uma boa parte delas com licenciamento feito pelos estados. Dos 353 projetos, seis já estão em tramitação. Em relação à Amazônia, nós temos um arranjo que vem sendo construído nos últimos quatro anos. O Plano de Combate ao Desmatamento está em implementação e já conseguiu uma redução de desmatamento de 52%. Nós temos o plano da BR-163 (Cuiabá-Santarém), que é toda a área de abrangência da rodovia, representando 24% de toda a Amazônia. Temos o Plano Amazônia Sustentável e finalizamos agora – já está para ser feito o decreto do presidente – o Programa de Desenvolvimento Sustentável das Populações Tradicionais. Então, ali [no PAC] tem uma listagem de obras, mas elas têm um arranjo por baixo que foi construído ao longo desses quatro anos, que são esses programas”.

“Ao considerar todas as variáveis, você não vai poder dizer a priori o que vai poder e o que não vai poder licenciar. Cada caso é um processo particular de licenciamento ambiental que terá de ser feito com os mesmos procedimentos. Nós não tivemos nenhuma mudança na legislação ambiental brasileira no sentido de flexibilização. A única questão que foi encaminhada, e é uma demanda nossa desde o início da gestão, é a regulamentação do Artigo 23 da Constituição. Inclusive, todo o arranjo de base para essa regulamentação foi feito pelo próprio ministério e pelo Ibama”.

“A parte de saneamento básico do PAC tem uma repercussão muito positiva para o setor ambiental. São R$ 40 bilhões para o saneamento e R$ 1,5 bilhão para a revitalização das bacias do São Francisco e do Parnaíba, o que também tem um rebatimento muito importante do ponto de vista ambiental. As obras do metrô também têm esse rebatimento importante, na medida em que você tem redução de emissões. Os outros projetos terão que ser analisados caso a caso para o licenciamento ambiental a partir dos estudos de impacto ambiental. Naquilo que for de competência do Ibama, será o Ibama”.

“O importante é essa visão que se vem construindo no governo, nos últimos quatro anos, de que a variável ambiental deve permear os projetos. A transposição do São Francisco é um projeto que foi reposicionado por essa nova visão, e com a BR-163 foi também assim. A nova lei para o setor elétrico já obriga que não se possa fazer nenhuma concessão sem que antes tenha a licença ambiental, a licença de instalação. De sorte que esses arranjos vêm sendo construídos. Eles é que vão ter que servir de base para essa equação de desenvolvimento com sustentabilidade e sustentabilidade com desenvolvimento”.

Sobre os avanços de sua gestão
“No início da gestão nossa opção era de que nós não iríamos fazer pirotecnia ambiental, não iríamos colocar remendo de seda em tecido velho de estopa. Nós iríamos trabalhar com metas estruturantes para todo o Sistema Nacional de Meio Ambiente e passamos a orientar também o Ministério do Meio Ambiente a partir de nossas conhecidas diretrizes, que são orientadoras da política ambiental nos últimos quatro anos: controle e participação social, desenvolvimento sustentável, fortalecimento do Sistema Nacional de Meio Ambiente e política ambiental integrada. Cada uma delas tem um rebatimento naquilo que nós estamos fazendo do ponto de vista dessa política."

“O MMA é um ministério jovem, tem cerca de 13 ou 14 anos, e nunca teve uma estrutura efetiva de quadros. Nós tínhamos, dos 900 funcionários do ministério, apenas 75 efetivos do quadro e os demais eram todos contratos provisórios. Estamos concluindo esses primeiros quatro anos deixando uma estrutura efetiva do quadro para, independentemente de quem seja o ministro, a gente tenha um projeto de gestão pública que internalize a competência, que internalize o conhecimento de todo o processo que muitas vezes vai embora nesse troca-troca de servidor. A mesma coisa em relação ao Ibama, onde tínhamos quase dois mil servidores com contratos temporários. Lá, tivemos um acréscimo de cerca de 32% na estrutura de pessoal e uma melhoria salarial de cerca de 120% nos últimos quatro anos, inclusive com um plano de carreira, que foi uma conquista dos servidores do Ibama.”

“Hoje, o nosso país conta com um Plano Nacional de Recursos Hídricos, com um Plano Nacional de Combate à Desertificação, com um Plano Nacional de Criação de Unidades de Conservação. Nós temos que compatibilizar a criação de unidades com sua implementação, e esse esforço de implementação já está sendo realizado. O déficit do nosso país é muito grande nessa agenda. O Parque de Itatiaia tem 70 anos e só vai começar a fazer sua regularização fundiária agora. Ou seja, as pessoas não botavam a mão nessa cumbuca."

“Criar 20 milhões de hectares de unidades de conservação em frentes de expansão predatória, isso é algo que nós temos que nos orgulhar. Uma redução de 75% no desmatamento da Mata Atlântica, isso é algo que a gente deve celebrar como uma conquista do setor ambiental. Uma redução de 52% no desmatamento da Amazônia, que crescia 27% em 2002, é algo que temos que celebrar, pois isso ocorreu como fruto do nosso trabalho em parceria com outros setores. Aí, o Ibama teve uma participação fundamental. A apreensão de mais de 700 mil metros cúbicos de madeira, a desconstituição de mil e quinhentas empresas piratas que funcionavam na Amazônia, a inibição de 66 mil propriedades de grilagem, isso também é algo que devemos celebrar. Muitas vezes, a sociedade não enxerga isso."

“Em 500 anos nunca existiu uma lei de gestão de florestas públicas. O Brasil é um país com vocação florestal, setor que representa 4% do PIB, mas não tinha uma lei de florestas. Tinha uma linha de crédito de R$ 8 milhões, e hoje nós temos mais de R$ 150 milhões em crédito. Saímos de cento e poucas famílias para mais de 15 mil famílias recebendo assistência técnica no setor florestal."

Sobre a necessidade de fortalecimento e continuidade da política ambiental “Temos trabalhado muito fortemente para sair da fase que inicialmente tivemos - e que foi muito importante para o setor ambiental, com a criação do sistema e a reestruturação da administração - para uma fase de implementação da legislação. Cada vez mais nós queremos estar incluídos no processo de fazer planejamento. Não adianta pensarmos o setor ambiental como sendo aquele que sai correndo atrás do prejuízo: alguém vai fazendo na frente e a gente chorando o leite derramado atrás. Não é isso. Nós queremos o ponto da sustentabilidade ambiental nos projetos de infra-estrutura para fazer uma estrada, para fazer uma hidrelétrica, para fazer um projeto de integração de bacias na parte de saneamento ambiental."

“Todos os projetos [do governo] precisam ter essa visão de sustentabilidade. É preciso parar com essa idéia de colocar o meio ambiente como oposição ao desenvolvimento e o desenvolvimento como oposição ao meio ambiente. As duas coisas têm que fazer parte da mesma equação. Esse é esforço que a gente têm feito e eu acho que dessa conquista nós não podemos abrir mão. O setor ambiental tem que cada vez estar mais presente na sociedade brasileira. Durante muito tempo nós tivemos que pedir para os outros cuidarem de meio ambiente, para ajudarem o meio ambiente, e agora somos nós que estamos ajudando a viabilizar soluções para o desenvolvimento a partir de uma nova visão, de um novo paradigma”.

“Vamos ter a convocação de mais 305 servidores para o Ministério do Meio Ambiente, além de uma outra leva de 130 que foram aprovados no concurso. Independentemente de quem seja o ministro, é necessário que se faça mais concursos. Já estamos trabalhando com essa idéia também dentro do Ministério do Planejamento.”

“Hoje nós podemos dizer que estamos começando um trabalho. Uma das coisas que vale a pena é a implementação da lei. O setor florestal tinha, até 2002, trezentos mil hectares de floresta certificada, hoje são três milhões de hectares. Como é chegamos de 300 mil a três milhões? Com a implementação da lei. Implementando a lei, buscando alternativas para que as pessoas façam o manejo e busquem a certificação florestal, com carteira assinada e respeitando os direitos trabalhistas. E, com isso, nós tiramos os ilegais que competiam injustamente nas cadeias produtivas e avisamos que pessoas corretas, que respeitam a legislação, que não usam trabalho escravo, que não tiram a madeira em unidades de conservação, poderiam se estabelecer. Ainda é muito aquém daquilo que podemos fazer, e esse é um trabalho que cada vez mais vai exigir de nós uma estrutura ágil, eficaz, com capacidade de fazer todos esses processos sem que isso signifique flexibilização [da legislação ambiental]."

“Em todas as discussões dentro do governo, quando as pessoas estavam fazendo aquela oposição entre investimento e custeio, eu dizia: olha, gente, vocês tirem dessa lista do custeio o Ministério do Meio Ambiente porque o custeio é o nosso investimento. Investir em pessoal, investir na nossa estrutura é o grande investimento. Nós não podemos ter uma estrutura que licencia bilhões e não é capaz de realizar tostões para que tenhamos a eficiência necessária para isso. Nós temos que cuidar dos grandes ativos ambientais desse país: 11% da água doce disponível no mundo, 22% das espécies vivas, a maior floresta tropical do mundo."

“A contribuição a ser dada no setor ambiental não é fácil. Para mim talvez tivesse sido muito mais fácil ter ficado no Congresso Nacional com meu mandato de senadora, mas eu não tinha o direito de não dar essa contribuição. A redução do desmatamento da Amazônia valeu a pena, a redução do desmatamento da Mata Atlântica valeu a pena, a diminuição dos crimes ambientais que antes eram praticados sem nenhuma forma de punição, é algo que a gente sabe que valeu a pena. A aprovação da Lei da Mata Atlântica, a aprovação da Lei de Gestão de Florestas Públicas, a melhoria das condições de salário dos servidores... tudo isso ainda é um pequeno passo, mas a grande conquista é a idéia de uma política ambiental transversal, integrada."

Sobre o “gargalo ambiental”
“O poder público não facilita nem dificulta. O poder público tem processos legítimos e transparentes. Não gosto da discussão quando ela é colocada em termos de ‘facilitar o licenciamento’. Não pode, senão o Ministério Público ou qualquer cidadão pode entrar com uma ação na Justiça. Mas, também pode entrar se alguém criar dificuldades propositalmente, porque também não é legítimo. Nós queremos que o país cresça, claro que queremos, e para isso temos que buscar soluções tecnológicas, inclusive para não inviabilizar determinados empreendimentos”.

“A BR-163 não teria saído se não se tivesse sido feito um plano de desenvolvimento sustentável para a área de abrangência, se não fossem criados oito milhões de hectares de unidades de conservação e demarcada a terra dos índios. Se não tivéssemos o setor socioambiental acompanhando o processo, não teríamos hoje a licença da BR-163. No projeto de integração das bacias do São Francisco, se o setor ambiental não tivesse reposiocionado o processo, ele não teria viabilidade ambiental. Foi feito o reposicionamento de 146 metros cúbicos por segundo de retirada de água para 26 metros cúbicos por segundo”.

“O Artigo 23 da Constituição é de 1988, e desde 1988 deveria ter sido regularizado. Não quiseram botar a mão nessa cumbuca, e aí foram criadas uma série de sobreposições, de sombreamentos. Os empreendimentos são judicializados em função dessas sobreposições de competência, mas é sempre o Ibama, é sempre o setor ambiental que põe a cara para apanhar quando as pessoas acham que nós estamos fazendo emperramentos ambientais, o que nem sempre condiz com a verdade."

Sobre o futuro
“Se nós não valorizarmos nosso trabalho, então a sociedade com certeza não virá em nosso socorro como veio agora na discussão de desenvolvimento e meio ambiente. A sociedade disse: vocês vão ter que fazer o país crescer, mas vão ter que fazer isso respeitando a legislação ambiental. O Brasil é uma potência ambiental, temos uma capacidade enorme de fazer diferente, e é essa diferença que precisamos fazer a partir da legislação, das ferramentas de comando e controle, para buscar a forma correta de fazer os investimentos, para que eles sejam feitos em bases sustentáveis do ponto de vista econômico, social, ambiental e principalmente ético. O compromisso ético em fazer esse país se desenvolver com sustentabilidade é o que vai fazer a diferença."

“Eu encontrei soluções e problemas e, se sair, vou deixar soluções e problemas. De sorte que temos sempre que resolver os passivos e conservar os ativos, as coisas boas que encontramos. Durante nossa gestão, em nenhum momento nós nos colocamos em oposição às coisas boas que encontramos."

“Os gestores passarão, mas as boas políticas, com P maiúsculo, elas haverão de vingar. E, com certeza, não vai ser fácil voltar ao tempo em que o setor ambiental sequer era escutado.”
(Por Maurício Thuswohl, Agência Carta Maior, 29/01/2007)

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