Os pequenos agricultores do oeste do Paraná ganharão um reforço no combate às pragas de suas plantações. Trata-se de um laboratório de fungos entomopatogênicos (provocam doenças em insetos) que será construído até o fim do ano em Cascavel, a 500 quilômetros de Curitiba. Coordenada pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), a produção dos fungos para controle biológico deverá suprir a demanda dos produtores de cultivos orgânicos e agroecológicos, que não utilizam agrotóxicos para eliminar insetos parasitas.
“Muitos agricultores paranaenses compram esses fungos em São Paulo”, disse Luís Francisco Angeli Alves, professor da Unioeste e coordenador do projeto. Segundo ele, recursos para a iniciativa serão liberados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) até o fim de março, quando serão iniciadas as obras. A distribuição terá preço de custo.
O novo laboratório deverá seguir o mesmo sistema de produção dos existentes no Estado de São Paulo, usando o arroz para cultivar os microrganismos. Serão produzidos os fungos Metarhizium anisopliae e Beauveria bassiana, que atacam parasitas como ácaros, gafanhotos, broca-do-café, mosca branca, tripés e cigarrinhas da cana-de-açúcar e de pastagem.
A prática de controle biológico é antiga no Brasil. Na década de 1960 já se utilizava o M. anisopliae no combate a cigarrinhas da cana-de-açúcar no Nordeste. Segundo Alves, trata-se de boa saída para pequenos agricultores do oeste paranaense, que cultivam produtos como mandioca, algodão, café e hortaliças.
Para o coordenador do projeto, há grandes vantagens no controle biológico em relação ao uso de agrotóxicos, sendo a principal delas o aspecto ambiental. “A aplicação dos fungos não deixa resíduos, não provoca o crescimento de populações de pragas resistentes e preserva a fauna e a flora”, disse.
Uma série de análises em laboratório foi feita para avaliar se, por exemplo, os fungos não atingiriam outras populações de insetos não parasitas de plantas. Alves cita um trabalho com o inseto "benéfico" do gênero Trichogramma, que ajuda a combater pragas atacando os ovos de parasitas.
“Deixamos esses insetos expostos a ovos com e sem fungo. Não houve seleção dos ovos e os insetos que entraram em contato com os fungos não morreram”, contou. Isso pode ser explicado pelo fato de cada fungo atacar um inseto específico.
Baixo impacto
De acordo com Miguel Michereff Filho, do Laboratório de Fungos Entomopatogênicos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), os fungos cultivados em laboratório têm curta sobrevivência no meio ambiente, por isso não podem causar epidemias sucessivas em insetos não parasitas. “Os fungos passam a sofrer forte ação da radiação ultravioleta e competição com os microrganismos nativos. Diversos fatores ambientais impedem seu estabelecimento no ambiente”, resumiu Michereff.
O agrônomo da Embrapa explica que a contaminação dos predadores naturais das pragas pelos fungos também não se comprova em campo. Além disso, não há relatos de mortes em massa dos inimigos naturais da praga (predadores ou parasitóides), por conta da eliminação de seu alimento.
Segundo Alves, da Unioeste, a natureza já é alterada quando é feito uso agrícola de uma área – o aumento do número de pragas e de seus predadores são conseqüência dessa alteração. “Mas comparado com o inseticida químico, o impacto é bem menor quando se utiliza o produto biológico”, disse.
Sobre a presença de resíduos, o biólogo explica que é grande o problema da contaminação de corpos d’água por agrotóxicos, o que não ocorre com o uso de fungos, cujo tempo de vida é bem menor. Não há ainda problemas à saúde do produtor e dos consumidores.
Entre os fatores negativos do controle biológico, Alves destaca o custo mais elevado e a necessidade de maior cuidado com a aplicação, dependendo da hora do dia, do tamanho da área e da quantidade de insetos. “A proposta é fazer um treinamento com produtores e acompanhar a aplicação dos fungos”, explicou.
A especificidade dos fungos também obriga o produtor a aplicar para cada problema uma determinada alternativa. “No caso da cana-de-açúcar, as cigarrinhas são controladas pelo M. anisopliae, mas a broca não. Na cultura do café, o fungo B. bassiana combate a broca, mas não é eficiente contra a cigarra ou a cochonilha”, disse.
O próximo passo da equipe da Unioeste é ampliar as pesquisas para a produção da bactéria Bacillus thuringiensies, cujas variedades podem atacar o pernilongo urbano, muito comum em lagoas em decantação, e algumas espécies de lagartas. No campus da universidade em Marechal Cândido Rondon, insetos parasitóides como o Trichogramma pretiosum e o Trissolcus basalis já são usados no controle de lagartas e percevejos.
(Por Murilo Alves Pereira,
Agência Fapesp, 30/01/2007)