Fepam contesta que zoneamento florestal esteja inacabado e garante participação pública na discussão do documento
2007-01-29
O diretor técnico da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam/RS), Jackson Müller, contesta informações recentemente veiculadas pela imprensa segundo as quais o documento referente ao zoneamento florestal do Rio Grande do Sul, lançado oficialmente em 20 de dezembro do ano passado, esteja “inacabado”. Segundo ele, o texto está em processo de construção, e a Fepam aguarda somente o retorno do Arranjo Produtivo de Base Florestal – formado por entidades do setor empresarial e público, como Federação da Agricultura (Farsul), Associação de Empresas Florestais (Ageflor) e Federação das Associações de Municípios (Famurs), além de ONGs e universidades – para dar início ao processo de discussão do documento. A expectativa é de que o debate se inicie já com a retomada das reuniões do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema/RS), em fevereiro. O descontentamento já manifestado por representantes da Famurs, Farsul e Ageflor com relação ao documento apresentado pela Fepam está causando um certo desconforto entre as partes, mas Müller garante que haverá pelo menos sete rodadas regionais de discussão, envolvendo comunidades de todas as áreas abrangidas no zoneamento. A secretária estadual do Meio Ambiente, Vera Callegaro, reitera a posição de Müller e assegura que haverá amplo espaço para o debate do texto. Segundo ela, a situação atual lembra o que aconteceu em 2005, quando órgãos ambientais e setor empresarial fizeram rodadas de debate para decidir sobre os termos do projeto de lei que criou a Área de Proteção Ambiental (APA) do Delta do Jacuí, um projeto polêmico que obrigou as partes em conflito a flexibilizarem suas posições. Na presença da secretária, o diretor técnico da Fepam recebeu a equipe do AmbienteJÁ para conceder a seguinte entrevista.
Ambiente JÁ - Qual a situação atual do zoneamento ambiental para a silvicultura?
Jackson Müller - Há um conjunto de informações importantes nesse cenário, que é o seguinte: a materialização do zoneamento foi entregue ao Arranjo Produtivo de Base Florestal através do ex-governador Rigotto no final do ano, dia 20 de dezembro. Esse é o documento preliminar.
AmbienteJÁ - O documento foi apresentado, na ocasião, mas a imprensa não teve acesso a ele...
Müller - Nós levamos, mas ficou com o governador. Produziu-se um documento preliminar que contempla a construção de uma espécie de plano diretor para a silvicultura no Estado do Rio Grande do Sul. E o pano de fundo desse plano diretor, o que o organiza, são as unidades de paisagem natural que o Estado do Rio Grande do Sul tem. São 45 unidades de paisagem natural. É como se nós tivéssemos 45 grandes espaços e, dentro desses espaços, foram identificadas as potencialidades e fragilidades.
AmbienteJÁ - O zoneamento tem relação com os comitês de bacia?
Müller - Os comitês de bacia têm uma outra organização baseada em uma lei estadual, que é a Lei 10.350 de 1994, a lei dos recursos hídricos, conhecida como lei das águas do Rio Grande do Sul. Se procurou contemplar como elemento a disponibilidade hídrica – aqui [mostrando uma parte do estudo] há um outro mapa, é importante – e se usou também, como fonte de informação, a disponibilidade hídrica superficial. Imagine o seguinte: aqui [apontando para uma parte do documento] há várias informações, é importante reconhecermos os fatores de vulnerabilidade. Então, é como se tivéssemos um mapa para cada um desses itens (indicadores). E a sobreposição dessas informações é que define as potencialidades e as fragilidades de cada uma dessas unidades de paisagem natural. Há uma série de itens que são importantes dentro da construção do zoneamento, que é exatamente aquilo que foi usado como base na caracterização das unidades de paisagem. Então, se tem lá: grau de proteção, áreas importantes para a biodiversidade, localização das espécies da fauna e da flora, endêmicas e criticamente ameaçadas de extinção, fragilidade dos solos para a atividade de silvicultura, disponibilidade hídrica, uso e ocupação atual, localização dos sítios arqueológicos e paleontológicos, das comunidades tradicionais, do potencial turístico e dos aspectos socioeconômicos. O cruzamento desses elementos todos gerou um conjunto de informações que define, por exemplo, para uma unidade como essa, quais são as restrições. Então, quanto vai repercutir plantar em uma zona que apresenta, por exemplo, déficit hídrico... Podes ter disponibilidade de água numa determinada região, no ano, mas tu vais ter, em determinados momentos, uma diminuição nessa oferta. Então, que taxa de plantio vai se deixar realizar nessa zona?
AmbienteJÁ - Esses critérios foram elaborados em conjunto entre várias instituições?
Müller - Isto. Quem participou deste zoneamento foram as universidades, o Departamento de Florestas e Áreas Protegidas [Defap, órgão da Secretaria Estadual do Meio Ambiente], a Fundação Zoobotânica [idem], que deu uma contribuição espetacular para a qualidade desta documentação e dessas restrições. Agora, o que tem que ficar claro é o seguinte: se nós tivéssemos feito um documento definitivo e não estivéssemos dispostos a fazer um trabalho de discussão, seríamos criticados por estarmos apresentando um documento definitivo. Qual foi a tônica dessa produção integrando todos esses setores da sociedade? Produzir uma versão preliminar, a versão um ponto zero do zoneamento e que vai ser submetida a todo um crivo de discussão nas audiências públicas, no Consema.
AmbienteJÁ - Quando vão ser realizadas as audiências públicas?
Müller - Agora começa uma pauta coordenada possivelmente pela nossa secretária...
AmbienteJÁ - Já existe um calendário para as audiências?
Müller - Ainda não porque foi recém apresentada a versão preliminar. Não é a versão incompleta, inacabada, como foi dito, é uma versão preliminar. É importante que se diga que esse documento que foi produzido tem uma função que é abrir a discussão. Ele não é um documento encerrado. Pela primeira vez na história deste Estado a Secretaria do Meio Ambiente está remetendo a uma discussão pública um documento que visa exatamente a nortear a expansão sustentável da silvicultura. Tu acompanhaste a discussão toda que foi feita de que as empresas todas estavam vindo para o Rio Grande do Sul e iam se instalar em qualquer lugar e não haveria critérios para construir as autorizações. Na verdade, não foi isso o que aconteceu. O que aconteceu foi um processo muito criterioso, de uma fase onde não se tinha nada - porque a silvicultura não era licenciada - para uma fase mais completa. Agora, está se fazendo a transição disso. No ano passado [agosto de 2006] foi usada uma ferramenta que é um Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público Estadual onde foram definidos alguns dos critérios – por exemplo, o mais importante: não foram autorizados plantios florestais em áreas de campo, em áreas de vegetação a ser protegida. Se autorizaram plantios florestais apenas em áreas que já tinham recebido algum tipo de uso agrícola.
AmbienteJÁ - Como a Fepam vê o fato de entidades como a Famurs [Federação das Associações de Municípios do Estado] e da Farsul [Federação da Agricultura] terem julgado o documento do zoneamento como muito restritivo?
Müller - Tem que ver o seguinte: qual é a função da Fundação Estadual de Proteção Ambiental? Qual é a função da Secretaria Estadual do Meio Ambiente? Qual é a função da Fundação Zoobotânica? É construir o regramento para que se garantam os dispositivos de preservação e de proteção dos espaços. Agora, a materialização do zoneamento vai vir num documento chamado licenciamento ambiental, que é onde se materializa. Eu não estou dizendo, com o zoneamento, que não posso plantar. Estou dizendo, com o zoneamento, que vai haver condições e restrições que vão nortear os processos de plantio. Em alguns locais, onde há uma concentração de usos de água, onde já se tem instalado um conjunto de atividades que são grandes usuárias de água e daqui a pouco não tem água lá... tu vais autorizar muito ou autorizar pouco? Veja a expressão que eu estou usando: tu vais autorizar muito ou tu vais autorizar pouco?
AmbienteJÁ - Quer dizer que não pode não autorizar?
Müller - Até pode. Mas a condição é justamente levar em consideração as fragilidades do ambiente.
Ambiente JÁ - O Sr. quer dizer que esse documento vai servir de base para o licenciamento ambiental posterior...
Müller - Exatamente. Isso aqui [mostrando o documento do zoneamento florestal] é um plano diretor para a silvicultura. É importante porque é uma ferramenta que nenhum outro Estado do país tem. Ele foi construído em especial para a silvicultura, mas ele poderá ser utilizado para outras atividades à medida que o processo de evolução da informação for acontecendo. Por exemplo, uma das bases da informação que nós utilizamos para esse importante trabalho foi o estudo conduzido pelo Ministério do Meio Ambiente através do levantamento dos biomas que ainda estão em relativa situação de conservação ou de proteção. Esse estudo é inédito também: Mapeamento dos Remanescentes do Bioma Pampa, do Ministério do Meio Ambiente, e Áreas Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade. São estudos inéditos. Usou-se, no zoneamento florestal do Estado, aquilo que há de mais atual em informação: daquele conjunto de pesquisadores e de dados que são os mais atuais, para poder construir uma ferramenta que é viva. É importante que se diga que o zoneamento não é uma coisa estanque. Ele vai evoluindo com o tempo porque ele foi montado, foi concebido para uma realidade de Estado. À medida que uma região qualifica a sua informação, ela qualifica o zoneamento.
AmbienteJá - Como a Fepam vai trabalhar com os municípios a partir do zoneamento?
Müller - Há dois caminhos que estamos querendo construir com essa história das audiências públicas. Um deles é conduzir as audiências públicas através do Conselho Estadual – o Consema promover os encontros regionais. Quantos? Não há uma definição de número ainda – entre cinco, seis, sete encontros regionais que vão levar em consideração as particularidades regionais. E aí a comunidade científica, as prefeituras, os movimentos ambientais, as ONGs, todas, de alguma forma, vão poder contribuir na qualificação desta ferramenta, que é viva, que é dinâmica. É isso que tem que ficar claro. Porque quando a gente fala que o estudo está inacabado, dá idéia de uma coisa que não está pronta. Não é isso. Tem uma primeira versão que agora vai se qualificar com o debate. Então, por exemplo, a Farsul acha que aquela região está restringindo muito porque as propriedades são pequenas...
Secretária Vera Callegaro – É o que aconteceu com o Delta do Jacuí, lembra? [ Polêmica da criação de uma área de proteção ambiental no local onde fica o Parque Delta do Jacuí. Essa discussão, em agosto de 2005, levou produtores rurais, principalmente do setor arrozeiro, instalados naquela região, a discutir com a Fepam a proposta de criação da APA, tendo o projeto de lei sido aprovado pela Assembléia Legislativa em 18 de outubro de 2005] No Delta do Jacuí, a APA deu o maior “rolo”, nós chegamos e sentamos com todos os atores envolvidos, Farsul, pois havia a questão dos arrozeiros ali, todo o pessoal que mora nas vilas, proprietários... Sentamos e vimos como cada um poderia ceder, e os técnicos olhavam como podiam adequar o projeto, para evitar desapropriações depois, para não causar problemas. Foi assim. As questões ambientais, temos que nos acostumar que elas têm que ser tratadas com a participação da sociedade. Mas há coisas de que não podemos abrir mão porque somos responsáveis pela guarda da preservação e conservação do meio ambiente. Mas tem aspectos em que podemos flexibilizar.
AmbienteJÁ - Mas, afinal, qual foi a crítica objetiva que a Fepam recebeu das entidades do setor florestal com respeito ao documento do zoneamento?
Müller - Eu vou ler: “De acordo com Valtemir Bruno Goldmeier, que é o presidente do Consema e representante da Famurs, houve, por parte de diversas prefeituras do interior do Estado, uma grande insatisfação” isso foi publicado... mas baseado em quê? De onde vem a insatisfação? O documento está sendo recém disponibilizado...Vou contar uma experiência, porque eu vivi, aqui, as autorizações florestais. Tínhamos autorizações para plantio, em 2006, que vão totalizar em torno de 70 mil hectares – autorizados para plantio em áreas de cultivo agrícola. Toda vez que um empreendimento, seja ele da Aracruz, seja ele da VCP [Votorantim Celulose e Papel], seja ele da Stora Enso, vinha para a Fepam, o empreendedor tinha que apresentar, junto, uma autorização do município dizendo que não havia restrições por parte da implantação desse empreendimento lá naquela municipalidade. Nenhuma prefeitura foi contra nenhum plantio florestal realizado em 2006. O que se viu foi que, na verdade, o Estado do Rio Grande do Sul tem que ser visto não como uma coisa única, mas tem que ser visto com as suas condições ambientais reais, que foi o que se procurou materializar com este documento. Veja aqui o mapa do indicador “disponibilidade hídrica superficial”[apontando o mapa]. Onde está escuro é onde há bastante água; onde está muito claro é onde tem baixa disponibilidade. Veja: o que se quer evitar no futuro, daqui a dez, quinze, vinte anos? Que nós estejamos vivendo conflitos que poderiam ter sido previstos. Como nós vamos autorizar grandes plantios florestais em áreas que têm baixa disponibilidade de água subterrânea, fragilidade de espécies que estão em vias de extinção? Agora, estão se aprendendo coisas interessantes nessas autorizações. Que as empresas estão fazendo plantios integrados, entremeados na floresta natural, nativa, que são os plantios de eucalipto. O que está se vendo com os dados do monitoramento que estão chegando para nós? Que a fauna migra, ela vive dentro da floresta, ela vai para dentro das áreas exógenas, ela volta para a área nativa. Quer dizer, aquela preocupação de que os plantios florestais fossem grandes consumidores de água... está se vendo que o comportamento de uma floresta com oito anos de idade é muito parecido com o comportamento de uma floresta de mata nativa. Mas esses dados estão vindo à medida que o processo está sendo qualificado no Estado. Esta é a função do zoneamento.
AmbienteJÁ - Esse documento diz quais são as áreas mais propícias à silvicultura?
Müller - Ele não diz quais são as áreas mais propícias. Ele diz quais são as áreas que têm menor fragilidade, que podem ter o seu coeficiente de aproveitamento maior. Por exemplo, vamos ver um caso. Há uma empresa que está buscando se instalar na região de Dom Pedrito, Rosário do Sul, Manoel Viana. Essas empresas, quando elas compram as propriedades, elas estão comprando áreas que têm sofrido aqueles processos de arenização. Não é desertificação, porqque o clima não é de deserto. Mas é um avanço do processo de arenização. Essas empresas, no processo de autorização para plantios florestais, elas têm o compromisso de recuperar essas áreas, conter o avanço do processo de arenização. E a quantidade da propriedade que normalmente é utilizada para plantio é de 50 por cento. Se ela comprou mil hectares, desses mil hectares vão ser excluídas as áreas de preservação permanente, a reserva legal, e em cima do que sobrar, 50 por cento ela pode utilizar. O resto ela tem que preservar, tem que conservar, tem que recuperar. Então, esta é a média das três grandes empresas florestais em aproveitamento de área. Nenhuma delas, das que nós autorizamos em 2006, aproveitou mais do que 50%.
AmbienteJÁ - E essas empresas autorizadas, elas estão dentro das áreas menos vulneráveis indicadas no zoneamento?
Müller - Tem de tudo um pouquinho. Porque o que se viu foi que nessas autorizações concedidas, o cuidado que se tomou é de autorizar apenas áreas onde já se tinha um uso agrícola. Ou era soja, ou era milho, ou era mamona, ou era melancia, ou era azevém... Não se autorizou florestamento em cima de campo nativo, nem em cima de mata nativa, em cima de áreas de preservação permanente. Pelo contrário. Está se usando recurso privado para recuperar área degradada.
AmbienteJÁ - De que montante é esse recurso?
Müller - Isso é um monte de dinheiro. Vai depender do tamanho de cada projeto. Tu pegas, por exemplo, os projetos da Stora Enso, são fazendas de 700 hectares, 800 hectares. O aproveitamento é de 50 por cento. Os outros 50 por cento ficam para proteger o ambiente, para manter as comunidades tradicionais onde estão os sítios arqueológicos, as questões culturais, as fazendas. Estão surgindo elementos da história do Rio Grande do Sul que haviam sido perdidos com o tempo, que agora, na composição, para preservar a cultura daquelas regiões, estão emergindo. Histórias interessantíssimas. Tinha aquela restrição dos 50 quilômetros de fronteira, que era uma questão fundiária, não tinha absolutamente nada a ver com a questão ambiental [segundo a Lei nº 6.634/1979, empresas estrangeiras são proibidas de ter propriedades legais a menos de 150 quilômetros da fronteira do Brasil, a menos que peçam autorização do Conselho de Defesa Nacional (CDN) – a Stora Enso tem uma área de terras que se enquadra nessa restrição legal e precisou pedir autorização do CDN para seu projeto naquela área]. O que se viu é que quando eles foram buscar a história daquelas propriedades, encontraram registros que nós não tínhamos. Coisas interessantes estão surgindo dessa forma de garantir a preservação dos aspectos culturais no Estado.
AmbienteJÁ - Quando o documento do zoneamento florestal estará disponível para acesso pelo público?
Müller - Quando nós entregamos esse documento para o ex-governador Rigotto, em 20 de dezembro, ele imediatamente o entregou para o Arranjo Produtivo de Base Florestal, que tinha até 31 de dezembro para fazer as alterações, e é isso que nós estamos aguardando. Eu estou vendo a crítica na questão do tempo muito exíguo para eles [do Arranjo Produtivo de Base Florestal] fazerem uma leitura minuciosa do documento e participar. Mas nós também tínhamos um tempo exíguo.
AmbienteJÁ - Enquanto o Arranjo Produtivo de Base Florestal não devolver o documento com as críticas para a Fepam, ela não poderá fazer nada quanto ao documento?
Müller - Não, nós podemos fazer, nós continuamos juntando as informações para qualificar. Toda contribuição que vier vai ser bem-vinda porque vai entrar para discussão pública.
AmbienteJÁ - Que relação tem esse documento do zoneamento florestal com o TAC assinado em agosto do ano passado?
Müller - Muita relação. De certa forma, ele incorpora elementos do TAC, qualifica elementos do TAC. É um documento de fragilidades e potencialidades, traz elementos de um diagnóstico. Na frente do documento há uma passagem que é bastante esclarecedora, que é sobre a elaboração da matriz: “A matriz de vulnerabilidade ambiental indica o grau de fragilidade de cada unidade de paisagem do Estado em relação aos diferentes temas considerados, que correspondem aos principais impactos esperados a partir do desenvolvimento, em larga escala, da atividade da silvicultura. Cada tema é valorado através de um índice relativo, com variação de zero a um, sendo um o valor correspondente à situação de maior criticidade ou vulnerabilidade. Desta forma, as unidades de paisagem natural podem ser comparadas diretamente entre si e a distribuição dos valores relativos a cada índice individual permite identificar onde cada tema apresenta maior criticidade. O índice de vulnerabilidade, composto a partir do somatório ponderado dos demais índices e convertido para uma escala de zero a um, é um indicativo do potencial de conflito entre a atividade de silvicultura e os objetivos de conservação dos recursos naturais e da biodiversidade em cada uma das unidades de paisagem natural. Valores elevados indicam vulnerabilidade em mais de um dos temas abordados – disponibilidade hídrica, remanescentes de campos naturais, fauna e flora de interesse conservacionista e atrativos naturais de elevado valor turístico e alta criticidade em pelo menos alguns aspectos ambientais. Ao passo que valores próximos a zero indicam um baixo potencial de impacto da silvicultura sobre os alvos considerados, correspondendo a regiões onde a atividade pode ser desenvolvida sem que possam ser esperadas repercussões significativas sobre o meio ambiente. Como cada tema requer um tratamento próprio durante o processo de licenciamento ambiental, apresentando graus variáveis de reversibilidade, inspirando diferentes cuidados em termos de restrições, mitigações e compensações, o índice de vulnerabilidade serve principalmente como uma orientação geral sobre o potencial de impacto da silvicultura nas diferentes regiões do Estado, nada informando a respeito da natureza desses impactos e seu controle. Os valores atribuídos a cada unidade de paisagem natural, nos diferentes quesitos, por sua vez, permitem identificar quais temas são mais críticos em cada região, orientando a definição das restrições e normas específicas do zoneamento. O cálculo do índice de vulnerabilidade para cada item de unidade de paisagem natural seguiu algumas metodologias. Na Metade Sul do Estado, a silvicultura se caracteriza como uma atividade econômica preponderante.” O que queremos dizer com isto é que a silvicultura vai ser fundamental para o desenvolvimento e para a viabilidade socioeconômica daquela região. Está-se dando uma nova vocação para aquela região.
AmbienteJÁ - Mas é lá justamente onde há maior fragilidade...
Müller - É onde tem fragilidades. Então, quando autorizado [o projeto], devem ser levados em consideração os elementos de fragilidade, que são doze elementos [citados no documento].
AmbienteJÁ - Quando for realizado o Estudo de Impacto Ambiental de cada projeto, esses são os critérios que serão levados em consideração?
Müller - Isso. E há regiões onde o Estudo de Impacto Ambiental vai qualificar muito o zoneamento. Vai a um nível de detalhamento em que o zoneamento não foi. Vai a um nível de escala regional... um para 250 mil é a escala em que o zoneamento trabalhou... então o que está-se buscando com os Estudos de Impacto Ambiental... são três... o da VCP [Votorantim Celulose e Papel] foi entregue no final do ano passado e há dois em andamento. As informações que vão vir dali vão qualificar ainda mais as informações do zoneamento.
AmbienteJÁ - De quem são os outros dois Estudos de Impacto Ambiental em andamento?
Müller - Da Aracruz e da Stora Enso.
AmbienteJÁ - Todas têm projetos para a Metade Sul do Estado?
Müller - A Aracruz está na região do meio do Estado, em Arroio dos Ratos, descendo um pouquinho para Piratini. A Stora Enso está procurando a região do Alegrete, Manoel Viana, Rosário, e a VCP está vindo mais para a região de baixo, está mais concentrada na porção Sul. Então, existe uma triangulação, uma distribuição espacial de cada uma dessas empresas, até para a colocação de suas unidades fabris. Então, por exemplo, a Aracruz está em Guaíba, procurou centrar o seu parque florestal próximo. A VCP, a unidade fabril, é para ser em Rio Grande, mas ainda não tem nada, tem alguns elementos do Estudo de Impacto Ambiental, o termo de referência do EIA-Rima que está sendo apresentado para a empresa, e a Stora Enso não tem nada ainda, mas possivelmente vai ficar nessa região da fronteira, que é onde está plantando a sua base florestal.
AmbienteJÁ - Qual o papel da empresa Biolaw na elaboração do documento do zoneamento florestal?
Müller - A Biolaw é uma empresa de consultoria que foi terceirizada, contratada pelas empresas.
AmbienteJÁ - Quanto as empresas pagaram pelo trabalho da Biolaw?
Müller - Quase 300 mil [reais]... mas quem elaborou o zoneamento foi a Fepam com a Fundação Zoobotânica. A Biolaw fez a compilação, fez o levantamento das informações, fez o trabalho de campo, checou dados, buscou informações, para que nós pudéssemos preparar o zoneamento. A Biolaw não fez o zoneamento. Quem fez o zoneamento foi a Fundação Zoobotânica e a Fepam. A Biolaw juntou os dados técnicos e organizou esses dados.
Veja amanhã: dirigente da Famurs, também presidente do Consema, Valtemir Goldmeier, fala sobre descontentamento do setor empresarial com o zoneamento florestal.
(Por Cláudia Viegas, AmbienteJÁ, 29/01/2007)