Pode ser extrato bancário, cartão de visitas, catálogo de produtos, convite de casamento ou simplesmente um papel para impressão que a indústria chama de "cut size" e o consumidor de sulfite. Até mesmo o Post-it, o famoso bloquinho de recados da 3M, ganhou um modelo "ecologicamente correto". Nos mais diferentes formatos e, em alguns casos, cores, o papel reciclado conquistou o mercado corporativo, cresce no varejo e muda a estratégia de produção das fabricantes de papel.
A International Paper (IP) passou a dedicar parte de sua produção para fabricar papéis reciclados e, mais recentemente, o seu tradicional papel sulfite Chamequinho - que nasceu em 1979 - ganhou essa versão. A marca Chamex foi além: tanto o papel, batizado de Chamex ECO, quanto a embalagem são reciclados. "O consumidor quer imprimir textos, trabalhos e apresentações em papel reciclado", diz Antonio Gimenez, diretor de marketing da IP. Mas a empresa também produz papel reciclado para atender grandes clientes, como bancos.
O grupo Bignardi, fabricante de papel e da marca de cadernos Jandaia, associou-se há cinco anos ao Greenpeace para entrar firme no mercado de reciclados. Colocou no varejo a linha de papéis Eco Milênium e uma extensa gama de produtos de escritório, como agendas e cadernos. No primeiro ano, produzia modestas 100 toneladas por mês. Agora, são 1,5 mil toneladas mensais. "Nos últimos cinco anos, a demanda deu um enorme salto e o mercado cresce cada vez mais", diz Ivan Duckur Bignardi, diretor industrial da empresa que fatura R$ 300 milhões.
Se para o consumidor passou a ser um desejo, para o mercado corporativo o reciclado tornou-se uma poderosa estratégia de marketing - muito mais social, aliás, do que ambiental. Mesmo reciclado, o papel recebe tratamento químico, assim como o papel virgem. Do contrário, não seria possível ter produção em escala industrial. Em sua composição, o reciclado é 70% de aparas pré-consumo - refugo de papéis não utilizados em gráficas, por exemplo - e 30% de aparas pós-consumo. Aí, sim, papéis coletados por cooperativas de catadores.
Do ponto de vista prático, segundo especialistas, os principais benefícios da substituição do papel virgem pelo reciclado estão em minimizar a carga dos aterros sanitários, que passam a receber menos resíduos, e abrir uma fonte de renda para o catador de papel.
A Suzano, dona do "Reciclato", por exemplo, compra aparas de papel de 3,7 mil cooperados, beneficiando 13 mil pessoas. Quando estreou no segmento, em 2001, era atendida por três cooperativas e produzia 400 toneladas por mês. Hoje, são 3,3 mil, o equivalente a 4% dos negócios da companhia. "A renda média mensal de um catador da Suzano passou de R$ 150 para R$ 600", diz Ana Paula Pinheiro, gerente de produto.
Ao ganhar escala, o papel reciclado tornou-se mais acessível na ponta do consumidor. Na Suzano, a diferença do preço de custo entre o papel virgem e o reciclado era de 20% e hoje está na casa dos 5%. O ABN Amro Real, que lançou a moda no setor financeiro e foi seguido pelos concorrentes, teve custos maiores quando migrou do papel branco para o reciclado.
"Agora os custos se equivalem", diz Fábio Pando, superintende do banco. Das 2,1 mil toneladas de papel usadas pelo banco por ano, 1,7 mil são recicladas. No Bradesco, 90% do papel consumido (aproximadamente 600 toneladas ao mês) é reciclado.
Quem aderiu à onda garante que os motivos são genuinamente de preservação ambiental e inclusão social. No Brasil, diferentemente dos Estados Unidos, os usuários - indústrias, bancos e consumidores finais - fazem questão de "mostrar" que estão usando um papel ecologicamente correto. Daí, a preferência pela cor, meio amarronzada e com ranhuras, que se tornou um apelo de marketing.
Mas, para ser reciclado, o papel não necessita, efetivamente, ter esse aspecto que remete ao rústico. Pode muito bem ser branco. "Depende do processo de fabricação", explica Ivan Bignardi. A sua empresa, por exemplo, exporta para os Estados Unidos cadernos com folhas brancas e recicladas.
Independentemente de cor, o mercado está em evolução. As vendas da linha de reciclados da Tilibra, fabricante de cadernos controlada pela norte-americana MeadWestvaco, tem crescido, em média, de 10% a 12% ao ano, segundo Wagner Jacod, diretor comercial da empresa.
Para Rodrigo Belluco, diretor de marketing de serviços globais da Xerox, porém, o negócio é ainda embrionário e restrito. A multinacional, que vende papéis com a sua marca, também imprime documentos, como talões de cheque, para terceiros. "O grande mercado existiria efetivamente se houvesse uma migração das empresas de telefonia e energia elétrica, que imprimem grandes volumes de contas por mês."
Mas esse movimento já está começando a acontecer. A Sabesp, companhia de saneamento básico de São Paulo, adotou, recentemente o uso do reciclado em algumas regiões do Estado, como no interior e litoral. Desde o ano passado, a Natura passou a imprimir seus catálogos, com 1,2 milhão de exemplares a cada 21 dias, em papéis ambientalmente corretos.
(Por Chris Martinez,
Valor Econômico, 18/01/2007)