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2007-01-17
Para que a Amazônia não seja acometida por intensas transformações no seu bioma, será necessário que até 2060 os níveis de emissão dos gases provocadores do efeito estufa sejam reduzidos em 50%. Ainda assim, muitas alterações climáticas e ambientais serão inevitáveis, já que o aquecimento da Terra alcançará, pelo menos, 2ºC nas próximas cinco décadas. Essa avaliação é sustentada por um dos principais órgãos de pesquisa do Brasil, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que no fim do ano passado divulgou um estudo em que afirma que a floresta tropical mais rica em biodiversidade do mundo pode ter uma parcela transformada em savana nos próximos 70 a 100 anos.

De acordo com o pesquisador do Inpe Carlos Nobre, as causas do aquecimento global se devem ao consumo crescente de energia. “O uso de energia está subindo globalmente. Há mais gente no planeta, a população está crescendo e esse crescimento só deve estabilizar em 9 bilhões de habitantes. Ainda teremos um aumento de 3 bilhões de pessoas. Além disso, o consumo per capita aumentou mais do que o de 50 anos atrás. Esse crescimento de energia per capita tem sido maior do que o ritmo de crescimento populacional”, explica Nobre. Isso ocorre, segundo o pesquisador, devido ao modelo de vida que as sociedades estão seguindo: “Há uma grande queima de combustível fóssil para produção de energia e isso faz com que haja mais liberação de gases de efeito estufa na atmosfera. Essa energia não é renovável e, cada vez mais, o nosso modo de vida exige energia”.

Nobre explica que, a partir dos estudos, é possível traçar dois cenários para o futuro da Amazônia. Numa primeira situação, o planeta teria sua temperatura aumentada entre 4ºC e 6ºC. “Esse é um cenário pessimista e que traria uma alteração muito significante para a Amazônia”, afirma o pesquisador do Inpe. Nesse caso, é previsto que cerca de 30% da Amazônia sofram um processo de savanização. “A vegetação da floresta se tornaria semelhante ao do Brasil Central”, compara Nobre.

Uma segunda situação prevê que a Terra eleve sua temperatura entre 2ºC e 4ºC. “Apesar de ser um cenário mais otimista, ele também é preocupante. Nessa situação, uma área menor se tornaria savana: cerca de 10 a 15%. Em nenhum dos dois cenários, a Amazônia sai incólume, pois as mudanças ocorrem em uma velocidade muito grande e a maioria delas não tem mais volta”, afirma o pesquisador. Segundo ele, a mudança climática hoje é inevitável. “Não dá para retirar os gases do efeito estufa rapidamente da atmosfera e eles vão continuar agindo. Algum aumento de temperatura será inevitável”.

Diante dessa situação, Nobre diz que o objetivo da comunidade científica é fazer com que o planeta não tenha um aquecimento maior do que 2ºC para que as alterações naturais sejam minimizadas. Para isso, ele afirma que é preciso reduzir ao máximo as taxas de emissão tanto por países desenvolvidos como os em desenvolvimento. “É preciso que entre 2050 e 2060 haja redução de, pelo menos, 50% dos níveis dos gases de efeito estufa no planeta. Esse é o maior desafio ambiental”, afirma Nobre.

Há cerca de uma semana, a União Européia propôs redução de pelo menos 20% das emissões de gases causadores do aquecimento global até 2020 em relação aos níveis de 1990. Marcelo Marquesini, da campanha de florestas da organização não-governamental Greenpeace, explica que os países determinam o que é viável mediante aos seus parâmetros econômicos e de desenvolvimento e ressalta que ainda há aqueles que não se comprometeram a reduzir as suas taxas de emissão. “O Estados Unidos e a China nem cogitam essa possibilidade”, diz Marquesini.

De acordo com Nobre, há três vetores que são responsáveis diretos pelo processo iminente ao qual a Amazônia está sujeito. Além do aquecimento climático que, segundo o pesquisador, atinge níveis globais, a Amazônia enfrenta problemas locais, como o desmatamento e as queimadas das suas florestas.

Marquesini cita a seca prolongada do ano passado na região como uma das conseqüências do processo de aquecimento global. De acordo com ele, determinadas alterações são inevitáveis e irreversíveis independentes de medidas que tentam frear o processo. “O Estado do Mato Grosso, por exemplo, perdeu muita vegetação ao longo dos anos e houve mudanças no seu regime de chuvas”.

O processo de savanização da Amazônia é lento e não é perceptível num curto espaço de tempo ou a olho nu. “Apesar de a transformação ser lenta, na escala de evolução, décadas são equivalentes a segundos. Mas o fato de a maioria das pessoas não perceber as alterações, não significa que elas não sejam afetadas diretamente”, diz Nobre. Ele menciona a ocorrência de furacões cada vez mais intensos na região do Caribe, os quais, segundo estudos, são influenciados pelo aquecimento global que incide sobre os oceanos, lugar de origem desses fenômenos climáticos.

Marquesini destaca que ações pessoais e cotidianas podem ter efeito positivo. Economizar o consumo de energia e de água e o não financiamento de madeira ilegal são algumas medidas possíveis de serem adotadas.

Conseqüências
De acordo com Nobre, há duas conseqüências decorrentes do processo de savanização da Amazônia, que têm efeitos tanto no âmbito global, como local. A perda de floresta tropical contribui para o efeito estufa, aumentando o problema do aquecimento global. A razão disso é que o bioma da Amazônia tem capacidade de armazenar mais gás carbônico do que os demais. “Com a perda da floresta, há perda de biomassa e, conseqüentemente, aumenta-se o gás carbônico na atmosfera, porque ele é menos absorção”.

O segundo efeito é a perda de biodiversidade. Florestas tropicais, especialmente a Amazônia, contam com uma grande diversidade de espécies da fauna e da flora, muitas delas, até hoje desconhecidas. “O cerrado tem um terço da biodiversidade da floresta tropical. Se a Amazônia se savanizar, teremos uma erosão da biodiversidade e uma perda enorme de material genético. Muitas espécies entrarão em extinção para sempre”, afirma o pesquisador do Inpe.
(Por Natália Suzuki, Agência Carta Maior, 16/01/2007)

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