Por Leonardo Boff*
A questão ambiental deveria preocupar os Governos, em especial o nosso que propõe o crescimento como meta central. Se não previrmos os desequilíbrios, nossos filhos e netos amaldiçoarão nossa geração, que sabia das ameaças e não evitou a tragédia anunciada.
Há uma contradição que afeta todos os países do mundo e que, a persistir, pode nos levar a um generalizado desastre civilizatório. A contradição reside nisso: todos os países precisam anualmente crescer. Crescimento é
fundamentalmente econômico que se expressa pelo Produto Interno Bruto(PIB). Esse crescimento cobra uma alta taxa de iniqüidade social (desemprego e compressão dos salários) e uma perversa devastação ambiental (exaustão dos ecossistemas).
Há bastante tempo que o equilíbrio entre crescimento e preservação do
ambiente foi quebrado em favor do crescimento. O consumo já supera em 25% a capacidade de reposição do planeta. Consoante o PNUD [Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento], se quiséssemos universalizar o bem-estar dos países industrializados, precisaríamos dispôr de outros três planetas como a Terra, o que é absurdo. Sabemos hoje que a Terra é um sistema vivo auto-regulador no qual o físico,o químico, o biológico e o humano se entrelaçam (teoria de Gaia). Mas ela está falhando em sua auto-regulação. Daí as mudanças climáticas e o aquecimento global que nos atestam que estamos já profundamente dentro da crise.
A Terra poderá buscar um equilíbrio novo subindo sua temperatura entre 1,4 e 5,8 graus Celsius. Começaria então a era das grandes devastações com a subida do nível dos oceanos, afetando mais da metade da humanidade que vive em suas costas. Milhares de organismos vivem não teriam tempo suficiente para adaptar-se e morreriam. Grande parte da própria humanidade, em até 80% segundo uns, poderia apenas subsistir.
Com acerto afirmava Washington Novaes, um dos jornalistas que no Brasil
melhor acompanha as questões ecológicas: "Agora não se trata mais de cuidar do meio ambiente, mas de não ultrapassar os limites que poderão pôr em risco a vida". Muitos cientistas sustentam que nos acercamos já do ponto de não mais retorno. Podemos diminuir a velocidade do processo, mas não a sustar.
Essa questão deveria preocupar os governos, em especial o nosso que propõe o crescimento como meta central. Em seu discurso, o presidente Lula não disse sequer uma palavra sobre a questão ambiental. Se não tomar em conta os dados acima, as taxas alcançadas poderão ser totalmente perdidas em duas ou três gerações. Nossos filhos e netos amaldiçoarão nossa geração, que sabia das ameaças e nada ou pouco fez para escapar da tragédia anunciada.
O erro de todos foi seguir ao pé da letra o conselho de Lord Keynes para
sair da grande depressão dos anos trinta:"Durante pelo menos cem anos
devemos simular diante de nós mesmos e diante de cada um que o belo é sujo e o sujo é belo porque o sujo é útil e o belo não o é. A avareza, a usura, a desconfiança devem ser nossos "deuses", porque são eles que nos poderão guiar para fora do túnel da necessidade econômica rumo à claridade do dia. Depois virá o retorno a alguns dos princípios mais seguros e certos da religião e da virtude tradicional: que a avareza é um vício, que a exação da usura é um crime e que o amor ao dinheiro é detestável" (Economic Possibilities of our Grand-Children). Só que esse retorno não está acontecendo, antes se distanciou.
Porque escolhemos meios maus para fins bons chegamos ao ponto a que
chegamos. Ou redefinimos fins mais altos do que simplesmente produzir e
consumir ou então devemos aceitar um destino trágico. Remendos não são
remédios.
*Leonardo Boff é teólogo e escritor
(
Agência Carta Maior, 13/01/2007)