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2007-01-10
O Supremo Tribunal Federal vai decidir se os créditos de carbono produzidos por empresas de geração de energia limpa pertencem à própria empresa ou à estatal que compra a sua produção. A ação que provocou o questionamento na corte envolve uma geradora independente de energia limpa e o decreto que regulamentou o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa).

A Goiasa Goiatuba Álcool, que produz energia elétrica a partir do bagaço de cana, contesta a interpretação que o governo faz do Decreto 5.882/06, segundo o qual os créditos de carbono resultantes da produção de energia limpa dentro do Proinfa pertencem ao Estado que compra a energia. De acordo com este entendimento, ao comprar a energia, o Estado leva de graça o seu subproduto, que é o crédito de carbono. Se a empresa geradora de energia quiser ficar com esses créditos, eles serão abatidos dos preços contratados com a estatal.

A empresa quer ter o direito de explorar os seus créditos de carbono sem qualquer redução dos preços pagos pela Eletrobrás. O Proinfa tem o objetivo de incentivar geradores de energia a investir em tecnologias com emissão reduzida ou nula de gases poluentes na atmosfera, como energia eólica, pequenas centrais hidrelétricas e biomassa. A produção da chamada energia limpa gera créditos de carbono, que podem ser comercializados com países que têm altas taxas de emissão de gases.

Acontece que o decreto que regulamenta o Proinfa pode estar indo de encontro aos seus próprios objetivos. Especialistas entendem que a estatização dos créditos de carbono será um desincentivo ao desenvolvimento de tecnologia e produção de energia limpa. O decreto destina os recursos advindos das atividades relacionadas ao Mecanismo de Desenvolvimento Limpo ou outros mercados de carbono à redução dos custos do Proinfa, visando modicidade tarifária.

Para o especialista Pedro Baracuí, do escritório BKBG, a política de absorver os créditos de carbono gerados não é muito auspiciosa. “A Eletrobrás não pode confundir modicidade tarifária com incentivos ao desenvolvimento de energia limpa”, afirma ao criar a hipótese de que esta seja a política do governo.

O dispositivo prevê ainda que a Eletrobrás vai administrar a Conta Proinfa, composta por benefícios financeiros provenientes do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo ou outros mercados de carbono.

Os advogados Fábio Rosas e Maysa Verzola, do escritório Tozzini Freire Advogados, entendem que o referido decreto é inconstitucional, uma vez que ultrapassa os escritos da lei que criou o Proinfa (10.438/02). Para eles, um exemplo disso é o fato de o decreto determinar que os processos referentes ao Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, estabelecido no Protocolo de Kyoto, sejam desenvolvidos pela Eletrobrás. Além de conceder exclusividade à estatal para comercializar as reduções certificadas de emissões, geradas pelos projetos incluídos no Proinfa.

Pedro Baracuí segue a mesma linha. Ele entende que o decreto pode ter extrapolado as disposições da lei que institui o programa. E ressalta que “o Poder Público não pode criar obrigações”. São as leis que obrigam e o decreto só regulamenta as leis que já foram criadas. Observa ainda a necessidade de garantia do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, que no caso da Goiasa, tem duração de 20 anos.

Segundo o advogado, se o contrato foi fechado antes da promulgação do decreto, a mudança de regras causa insegurança jurídica. “Mudar as regras no meio do jogo não parece uma boa forma de regulamentar um setor que precisa de tanto investimento”, declara.

O mercado
O mercado de créditos de carbono ainda dá seus primeiros passos, mas tem pela frente uma perspectiva de enorme crescimento. Ele surgiu da exigência imposta aos países desenvolvidos pelo Protocolo de Kyoto de cumprir metas de emissão de gases. Se ultrapassarem estas metas, têm de comprar créditos de países em que a emissão está abaixo do limite ou que produzam efeitos compensadores às emissões. Os Estados Unidos, maiores emissores de gases no planeta, ainda não entraram neste mercado, já que se recusam a assinar o Protocolo de Kyoto.

A divisão do papel dos negociantes acontece dessa forma porque os países que têm baixo desenvolvimento e industrialização produzem menos gases nocivos para a camada de ozônio. Por isso, não precisam reduzir a produção. Eles vão acumulando créditos e vendem aos países com produção acima do permitido como forma de compensação e para evitar multas e sanções.

Esse mercado foi criado como forma de não onerar demais os países que têm produção de gases acima do sustentável. Se não houvesse esse sistema, teriam de gastar muito mais dinheiro para investir em mudanças no seu sistema de produção do que comprar os créditos excedentes de outros países. As multas aplicadas também têm valor muito maior que os créditos.

Cada nação tem a sua política ambiental. Para comprar créditos da China, por exemplo, é preciso investir 65% do valor do contrato de compra e venda em projetos de energia limpa, dentro do país. Dados de 2005 revelam a comercialização de 2 milhões de toneladas de créditos de carbono. Cada tipo de crédito tem o seu valor, mas, em média, cada tonelada vale US$ 16,6.
(Por Lilian Matsuura, Revista Consultor Jurídico, 07/01/2007)

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