O Paraná ganhou um novo – e inusitado –destino turístico ao lado das Cataratas do Iguaçu, do Parque de Vila Velha e da Unidade de Conservação da Ilha do Mel: uma cratera de quase 10 quilômetros formada pelo impacto de um meteorito há até 120 milhões de anos.
Identificada em 2004 por uma equipe de pesquisadores liderada por Álvaro Penteado Crósta, do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a cratera de Vista Alegre foi transformada, em dezembro, em sítio geológico voltado para o turismo e para a divulgação científica.
Com apoio da Unicamp e da empresa estatal de recursos minerais Mineropar, o sítio geológico recebeu painéis ilustrados com informações sobre a formação da cratera e peculiaridades sobre o impacto nos terrenos rochosos da região. “A idéia é difundir as geociências e tornar as formações geológicas mais conhecidas do grande público”, disse Crósta.
A cratera se estende por uma área circular com 9,5 quilômetros de diâmetro no bairro rural de Vista Alegre, município de Coronel Vivida, no sudoeste paranaense. A topografia da cratera, segundo Crósta, é muito diferente do resto da região, que se caracteriza por terrenos acidentados. “O fundo relativamente plano favoreceu a agricultura no local. Hoje, dentro da cratera, há plantações e um bairro rural com várias famílias”, explicou.
Potencial turístico
Um dos painéis foi instalado em um mirante na borda mais íngreme da cratera, com 120 metros de altura, de onde se consegue visualizar toda a extensão da feição geológica.
Elaborados por pesquisadores da Unicamp e da Mineropar, os painéis descrevem, em português e inglês, exemplos de crateras e a localização de cada uma delas no Brasil e no mundo. Um folheto também foi produzido para ser entregue aos visitantes.
Segundo Crósta, a instalação dos painéis é o primeiro passo para associar o turismo à divulgação científica de geociências, seguindo o exemplo de outros países. “Uma das crateras mais conhecidas do mundo, no Arizona [Estados Unidos], é um sítio geológico com um museu privado visitado por dezenas de milhares de pessoas todos os anos. O mesmo ocorre com a cratera de Ries, na Bavária [Alemanha]”, disse.
A cratera de Vista Alegre é a quinta descoberta no Brasil. As outras são as do Domo do Araguainha, com 40 quilômetros, entre Mato Grosso e Goiás; Riachão (MA), com 4,5 quilômetros; Domo do Vargeão (SC) e Serra da Cangalha (TO), ambas com 12 quilômetros.
Choque raro
“Embora esse tipo de fenômeno seja comum na Lua ou em planetas como Vênus e Marte, é raro na Terra, onde os processos de erosão e sedimentação apagam os vestígios. Existem apenas 172 crateras de impacto reconhecidas em todo o planeta”, disse Crósta.
Além de ser um fenômeno raro, a cratera de impacto ajuda a contar a evolução do território onde está situada. “Na época em que ocorreu, o impacto do corpo celeste pode ter causado imensos danos ambientais. Dependendo do local, isso pode resultar na extinção de muitas formas de vida”, disse o pesquisador da Unicamp.
O maior impacto desse tipo em toda a história do planeta ocorreu há cerca de 250 milhões de anos, extinguindo quase toda a vida do planeta, como explicou Crósta. Há 65 milhões de anos, um outro impacto destruiu também boa parte da vida na Terra, levando à extinção dos dinossauros.
“A cratera de Vista Alegre pode ter causado impacto ambiental em boa parte do Cone Sul”, disse. Os estudos sobre a cratera deverão revelar com mais precisão, por meio de estudos isotópicos, a época do impacto. “A datação não é algo simples, mas já sabemos que o impacto ocorreu há, no máximo, 120 milhões de anos.”
300 mil bombas de Hiroshima
De acordo com o cientista, a cratera tem “apenas” 120 metros de profundidade porque sofreu longo processo de erosão. “A liberação de energia de um impacto como esse é algo monstruoso em comparação com as descargas que conhecemos. Para causar uma cratera como a de Vista Alegre, seria necessário um impacto equivalente a mais de 300 mil bombas de Hiroshima”, disse.
Segundo Crósta, as crateras de impacto são diferenciadas de outras formações geológicas principalmente pelas brechas de impacto e feições microscópicas de deformação. “Só um impacto com grande liberação de energia forma esse tipo de marcas, por isso elas são bons indicadores”, afirmou.
A descoberta da cratera de Vista Alegre ocorreu de forma atípica. Ao ler uma matéria jornalística sobre o trabalho de Crósta, um engenheiro florestal entrou em contato com o professor e comunicou que havia visto, no Paraná, uma formação semelhante à descrita na reportagem.
“Isso acontece muito, porque as pessoas vêem as feições circulares e acreditam que seja uma cratera de impacto – mas geralmente se trata de uma formação de origem vulcânica ou de dissolução de calcário. De qualquer maneira, decidi investigar. Consultei imagens de satélite em bacos de dados da Nasa e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Passando pelo Paraná, desviei minha rota e visitei o local. Depois de vários estudos comprovamos que era mesmo uma cratera de impacto”, contou.
(Por Fábio de Castro,
Agência Fapesp, 04/01/2007)