Cabeludinha, panã, baru e uvaia são algumas das quase 80 variedades plantadas e estudadas, com investimento próprio, pelo empresário Douglas Bello em seu sítio em Paraibuna, no interior paulista. "Essas frutas só existem hoje em um ou outro quintal e na memória das pessoas", diz. "Quero resgatar a memória e agregar valor a ela".
Para os desavisados, algumas descrições: cabeludinha e uvaia são parentes da jaboticaba e têm cor amarela. A panã é da família da fruta-do-conde, mas de tamanho maior. O baru lembra a castanha e é servido como amendoim.
A idéia surgiu nos anos 90, quando Bello observou um crescente mercado de frutas exóticas em São Paulo, onde variedades do Norte e Nordeste ganhavam espaço. "Há um mercado emergente de frutas como açaí, cupuaçu e acerola. Mas ninguém se mexia para resgatar frutas que estavam desaparecendo aqui da Mata Atlântica".
Por um ano o empresário viajou pelo interior do Estado para levantar informações que norteassem seu trabalho. Usou como ponto de partida familiares em Marília, Limeira, Ribeirão Preto e Matão para chegar até os moradores mais velhos e questioná-los sobre hábitos de alimentação do passado. "Assim foram chegando nomes como cabeludinha e uvaia, que eram comuns nessa região", diz. "Descobri que São Paulo já teve buriti e jenipapo, associadas ao Nordeste".
Os dados colhidos em campo foram cruzados com informações da Embrapa. Mas Bello não encontrou pesquisas sobre como cultivar as variedades - locais para plantio, necessidades de água e adubo e se são plantas que gostam mais de sombra ou locais ensolarados.
O empresário paulista garimpou as sementes em viveiros do interior e na Ceagesp, e aprendeu no dia-a-dia sobre a engrenagem da natureza. "A feijoa, fruta da mesma família da goiaba, não é polinizada por abelhas. Quem carrega suas sementes é o sanhaço, um pássaro comum na Mata Atlântica e que sumiu com o desaparecimento da floresta", conta. "Provavelmente, o desaparecimento da feijoa está ligado a isso". Da cobertura original de 1,1 milhão de quilômetros quadrados da Mata Atlântica, hoje restam só 6,98% de área vegetal.
Desde 1999, quando comprou o terreno de 10 hectares para iniciar o projeto pessoal, foram quase 10 mil mudas e um investimento de R$ 600 mil. Quase três mil delas não vingaram, como o açaí. "Tudo é na base da tentativa e erro", diz.
Bello conta que procurou universidades e instituições como Embrapa e Esalq que lhe ajudassem a estudar essas plantas nativas. Não obteve resposta positiva por questão de prioridades, diz, já que há problemas mais urgentes.
O resultado de mercado ainda é tímido, com um faturamento anual de R$ 50 mil e 10 toneladas de frutas colhidas. O Sítio do Bello vende suas frutas e a de seus parceiros para "pessoas engajadas" como ele, como restaurantes e lojas de produtos naturais e o Cerealista Helena. Chegou a vender para a fashion Casa Santa Luzia, supermercado em São Paulo. "Mas aí foi mais pelo exotismo das frutas que pela filosofia do nosso trabalho".
O trabalho de formiguinha com as frutas da Mata Atlântica cresceu para outras regiões. Bello procurou parceiros com a mesma filosofia, como o Feito por Nós e Sabores da Amazônia, ambas de Belém do Pará, e a Cooperativa Agro-Extrativista Grande Sertão, de Minas Gerais, um projeto de agricultura familiar financiado pelo Funbio que tem como foco polpas de frutas do cerrado. "É uma forma de nos ajudarmos. Meu trabalho é convencer as pessoas a tornar isso algo mais que um simples projeto pessoal".
(Por Bettina Barros,
Valor Econômico, 03/01/2007)