Pequena empresa ‘verde’ ganha mercado
2006-12-27
Apostar em negócios sustentáveis tem sido o meio encontrado por muitas pequenas empresas não só de entrar no mercado, mas também de conquistar grandes clientes. Um bom exemplo é a Adespec, que fabrica colas sem solventes, que não fazem mal à saúde e não causam danos ao meio ambiente. Com esse diferencial, a empresa encontrou um nicho do mercado inexplorado e, com apenas cinco anos de existência, já espera faturar seu primeiro milhão de reais.
Uma das idealizadoras do projeto é Wang Shun Chen, que acredita ter sido fundamental apostar em um negócio sustentável para criar uma empresa que pudesse crescer. “As grandes empresas estão muito preocupadas com isso hoje. Essa preocupação é ainda maior entre as companhias que lidam com pessoas, como hospitais e shoppings, que precisam usar materiais que não afetem a saúde”. Para a idealizadora do projeto, adquirir produtos de qualidade e ecologicamente corretos virou um fator decisivo na disputa para virar fornecedor de grandes companhias.
Vocação
De acordo com Sérgio Risolla, gerente-executivo do Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec), que fica dentro da Universidade de São Paulo (USP), um número cada vez maior de projetos e empresas têm essa vocação. “É um movimento de mercado que não tem mais volta. Os pequenos negócios que pensam nisso desde o início pegam uma carona incrível nessa tendência porque todo mundo está preocupado em não agredir o meio ambiente.”
Não é à toa que entre os principais clientes da Adespec está a multinacional de origem francesa Saint Gobain, que fabrica vidros e espelhos. A cola feita pela Adespec - que começou na incubadora de empresas do Cietec e hoje tem a própria sede, de 1 mil metros quadrados - já vai encartada nos espelhos vendidos pela grande multinacional. “Além de tudo, temos uma legislação ambiental e trabalhista fortes, ninguém quer correr risco de ser processado. Ter um produto não agressivo já é importante até para se conseguir crédito no mercado, pois isso mostra que a empresa se preocupa com o seu futuro.”
A cola da Adespec é diferente porque não utiliza solvente. Em colas comuns - como a de sapateiro - até 80% da composição é de solvente altamente tóxico, que, além de causar danos à saúde, evapora e contamina o meio ambiente. “Fizemos uma pesquisa mundial e vimos que na Europa já não se usa mais cola tóxica e percebemos o potencial do mercado brasileiro, já que aqui não havia nada parecido”, conta Wang.
Reciclagem
Já a Tramppo apostou no mercado de reciclagem e também tem sentido grande procura por parte de empresas interessadas em ter um manejo correto de seus resíduos. Especializada em reciclagem de lâmpadas, a empresa consegue recuperar todas os componentes, como mercúrio, vidro e latão.
“Grandes empresas já têm certificação ISO 14 mil (de gestão ambiental) e estão preocupadas com o descarte correto de suas lâmpadas. Não havia nenhum equipamento desenvolvido no Brasil para fazer isso”, diz Elaine Menegon, sócia da Tramppo.
Com o apoio da Fapesp, a Tramppo conseguiu criar, com US$ 100 mil dólares, uma máquina que, se fosse comprada fora, custaria US$ 1 milhão, diz Elaine.
Como eles desenvolveram um equipamento de baixo custo, conseguem atuar em vários pontos do Estado e atender a muito mais clientes. “Além disso, nós vendemos lâmpadas novas para nossos clientes, o que reduz nossos custos de logística, pois o transporte é um dos fatores que mais pesa no nosso negócio.”
Desafios
No entanto, mesmo quem quer trabalhar com produtos socialmente responsáveis pode encontrar desafios no meio do caminho. Além dos impostos serem pesados para todo tipo de microempresa, alguns itens, como a obtenção de certificações, sempre estão envolvidos em empresas que desejam trabalhar com o meio ambiente. “Existem negócios tão inovadores que não há nem legislação para guiá-los e as entidades acabam demorando para aprovar a regulamentação desses novos negócios”, conta Risola.
Quem passa por esse desafio é a Tramppo, que espera há mais de um ano pela aprovação da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). “Já temos uma lista de mais de 300 clientes, mas não há nada parecido no País e ainda estamos esperando a licença de atuação da empresa; existe muita burocracia”, conta Elaine.
Para a falta de recursos de quem está começando, uma das alternativas é buscar financiamento público. Só no Cietec, a Fundação do Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), investiu R$ 12,2 milhões entre 2002 e novembro de 2006.
Mesmo assim, ter capital exige fôlego de quem está começando: “Investimos cerca de R$ 300 mil próprios, depois conseguimos apoio da Fapesp e agora estamos para receber um investimento de uma empresa de capital de risco”, conta Wang. Com isso, ela espera aumentar a distribuição da Adespec e, em 2008, lançar um produto para consumo do grande público, que poderá ser vendido em supermercados e farmácias.
(Por Marina Faleiros, O Estado de S. Paulo, 26/12/2006)
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