O inverno na Europa começou na semana passada mas, para desespero dos esquiadores, falta neve nos Alpes. Boa parte das montanhas, que já deveriam estar cobertas de branco, mantém-se nua. Três provas do campeonato mundial de esqui foram canceladas neste mês nas estações St. Moritz, na Suíça, Val d Isere e Megève, na França, por falta de neve.
Os moradores dos Alpes que vivem do turismo de inverno – atividade que atrai 80 milhões de pessoas e rende 65 bilhões de dólares por ano – estão, obviamente, apreensivos. A falta de neve reduz as temporadas de esportes como o esqui e o snowboard e afasta os turistas que querem passar as férias em uma cabana alpina. A escassez de neve é um efeito do aquecimento global. Nas últimas três décadas, o aumento da temperatura nos Alpes foi o triplo da média mundial.
Como conseqüência, 90% dos glaciares alpinos estão literalmente virando água. Um estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), cujos resultados parciais foram divulgados neste mês, concluiu que a redução do gelo nas estações de esqui dos Alpes é um fenômeno que tende apenas a piorar.
A cadeia de montanhas européia é uma das regiões mais afetadas do mundo pela elevação da temperatura global. "Os Alpes são uma barreira geográfica que recebe ventos frios do norte da Europa e correntes quentes vindas do Mediterrâneo", disse a VEJA o suíço Bruno Abegg, pesquisador do Instituto de Geografia da Universidade de Zurique, na Suíça, e um dos autores do estudo da OCDE. "Com o aquecimento global, a influência dos ventos quentes está se sobrepondo à das massas de ar frio", diz Abegg. As estações de esqui da Suíça, localizadas nos pontos mais altos dos Alpes, são as menos prejudicadas. Os efeitos do aquecimento são mais evidentes nas baixas altitudes, até 1 500 metros.
Como a camada de neve é mais fina nessas regiões, basta um pequeno aumento da temperatura para estragar uma perfeita pista de esqui. Esse é o caso das estações da Áustria, país onde o turismo de inverno representa 4,5% da economia. Situação ainda pior enfrentam as pistas da Alemanha.
Para ser rentável, uma estação de esqui precisa ter 30 centímetros de neve em suas pistas durante pelo menos 100 dias do ano. Das 39 estações de esqui alemãs, doze podem ter de fechar permanentemente por falta de condições para a prática do esporte. Caso a temperatura média na região aumente em 1 grau – o que deve ocorrer até 2025, como prevêem os meteorologistas – outros dezesseis resorts de inverno correm o risco de ter o mesmo destino. Para os esportistas, isso é péssimo. Os turistas terão de esquiar em altitudes mais elevadas, acima de 2.000 metros, onde o ar é mais rarefeito, o que compromete o desempenho dos mais velhos.
Em menor proporção, o problema repete-se em estações de esqui em outros continentes. Segundo estimativas da ONU, em 2070 quatro estações australianas não terão mais condições de funcionar, a não ser que optem por neve artificial. Na Cordilheira dos Andes, o clima também não está propício ao esqui. "Nos últimos anos, a queda de neve se tornou mais irregular nas estações de esqui no Chile e na Argentina, prejudicando algumas temporadas", disse a VEJA Ricardo Villalba, diretor do Instituto Argentino de Nivologia, Glaciologia e Ciências Ambientais.
Nos Estados Unidos, no ano passado, sete das dez estações de esqui do estado de Washington, na fronteira com o Canadá, tiveram de fechar em fevereiro, dois meses antes do habitual, por falta de neve. Não há soluções economicamente viáveis para tal situação. Produzir neve artificial sai caro e, como gasta muita energia e água, é desastroso para o meio ambiente. Nos Alpes, é comum cobrir as pistas com cobertores de plástico durante a noite, para evitar a perda de calor. A técnica apenas diminui o ritmo do degelo. O destino de muitas estações de esqui será mudar de ramo. A estação de Gschwender Horn, nos Alpes alemães, já transformou suas antigas pistas de esqui em trilhas para caminhadas e passeios de bicicleta.
(Por Thomaz Favaro,
Veja, 27/12/2006)