Investimentos anunciados no Espírito Santo vão aumentar desigualdades sociais e agravar questão ambiental
2006-12-20
Uma análise do anúncio de que o Estado receberá R$ 47,1 bilhões nos próximos seis anos mostra que o momento de crescimento econômico, propagandeado pelo governador Paulo Hartung, favorece principalmente as grandes empresas, ao mesmo tempo em que cria mais desemprego e desigualdades sociais dentro do próprio estado e aumento da poluição decorrente dos grandes projetos industriais e da monocultura do eucalipto. Os dados levantados pelo Instituto de Pesquisa Jones dos Santos Neves mostram a desigualdade da divisão geográfica dos investimentos no Estado e a dependência do governo dos grandes investimentos em siderurgia e mineração das companhias Siderúrgica de Tubarão e Vale do Rio Doce e a nova dependência que começa a ser formar com o crescimento da indústria do petróleo. Segundo os dados apresentados, o setor de petróleo e gás representa a maior parte dos investimentos, com 36,4% do total, o que representa R$ 17,1 bilhões. Esses investimentos são decorrentes da implantação dos terminais de exploração de petróleo e gás natural no litoral capixaba.
A Petrobrás, além de ser a maior contribuinte de ICMS do Estado - pagou mais de R$ 560 milhões em 2005 -, é a responsável pelo crescimento das receitas estadual e municipais graças aos royalties pagos pela extração.
O grande problema é que a distribuição desses royalties é feita de acordo com a posição geográfica com que são encontrados as reservas. Essa distribuição cria um grande desequilíbrio nos caixas dos municípios do Estado. Até novembro de 2006 o governo do Estado e os municípios capixabas já haviam recebido mais de R$ 176 milhões provenientes de royalties do petróleo. Somente o governo do Estado já recebeu R$ 85 milhões de janeiro a novembro deste ano. O valor recebido já ultrapassa em R$ 30 milhões o que o Estado recebeu no ano de 2005.
Municípios pequenos e de pouca expressão na economia capixaba estão recebendo cifras milionárias, enquanto outros, com grande população e inúmeros problemas sociais, recebem pouco. No ranking per capita o município de Presidente Kennedy lidera arrecada R$ 768,08 por habitante, enquanto, na outra ponta, aparece o município de Cariacica, com apenas R$ 0,69 por habitante.
Prefeitos de grandes cidades capixabas e especialistas em economia defendem a divisão dos royalties no Estado tendo como base de cálculo, principalmente, a população dos municípios e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Do jeito que a divisão é feita hoje irá criar desigualdades futuras entre municípios do próprio estado.
Vale lembrar que o aumento dos recursos dos royalties acontece de forma exponencial a cada ano, já que a produção está aumentando e o petróleo e o gás são combustíveis não renováveis, ou seja, uma hora vai acabar. Por isso, a correção na divisão deve ser feita com urgência. Segundo o prefeito de Cariacica, Hélder Salomão, o assunto deve ser tratado na reforma tributária. "É injusto um município que pertence ao mesmo Estado receber uma grande quantidade de dinheiro, somente porque teve a sorte de ter petróleo nas suas terras, enquanto Cariacica, que tem a terceira maior população do Estado e inúmeros problemas sociais, receber muito menos".
Ainda segundo os dados divulgados pelo Instituto Jones dos Santos Neves, o segundo setor que irá receber mais investimentos nos próximos seis anos é o da indústria, com 33,5% do total. Um montante de R$ 15,8 bilhões que irá beneficiar, principalmente os grandes projetos das empresas poluidoras do Estado, como as companhias Vale do Rio Doce e Siderúrgica de Tubarão e a Aracruz Celulose.
Esses investimentos são mais prejudiciais ao estado do que a extração do petróleo, já que, como exportam grande parte da produção, pagam quantias irrisórias de ICMS. Além disso, a monocultura do eucalipto da Aracruz Celulose degrada o meio ambiente, cria desemprego no campo e tira a possibilidade de diversificação do agronegócio, setor presente em 61 dos 78 municípios capixabas.
Os investimentos anunciados pela Vale estão dentro do programa da empresa de expansão para atender ao mercado chinês, grande consumidor. Para isso, está licenciando a construção de sua 8ª usina de pelotização na Grande Vitória, e criará um novo pólo siderúrgico em Ponta Ubu, no município de Anchieta, tão grande ou maior do que o da Ponta de Tubarão. Na prática, os capixabas pagarão caro para permitir o crescimento da Vale.
Juntas, a Vale, a CST e a Belgo Arcelor-Mittal produziram poluição do ar na Grande Vitória que provocou danos à saúde, exigindo investimentos bilionários da população para tratamento das doenças (entre R$ 3,7 bilhões e R$ 4,4 bilhões em pouco mais de três décadas). Cada morador da Grande Vitória gasta, em média, R$ 100,00 por ano para se tratar dessas doenças, entre as quais males respiratórios, alérgicos e cânceres. Os mandos e desmandos da Vale no Espírito Santo sequer geram contrapartida em arrecadação: no ano passado, o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pagos pela CVRD ao governo do Estado foi pouco superior a R$ 10 milhões, valor equivalente ao de uma média empresa.
Outro investimento da Vale é a construção da terceira usina de pelotização em Ubu. Com as três usinas em operação, a produção será aumentada em 7,6 milhões de toneladas e passará a 21,6 milhões de toneladas anuais de pelotas de ferro. A nova usina deverá entrar em operação no primeiro semestre de 2008. A CVRD também construirá uma usina de placas de aço em Ubu, em parceria com a CST.
A CVRD anuncia que seu complexo industrial e portuário de Ubu será pelo menos igual ao de Tubarão. Em Tubarão, a empresa conta com sete usinas de pelotização que, com capacidade nominal de produção de 25 milhões de toneladas anuais, atingiram a produção de 27,8 milhões de toneladas de pelotas de ferro em 2005. A empresa ampliará sua produção em mais 11,5 toneladas com sua 8ª usina e ainda sua produção nas usinas I e VII.
Em pronunciamento este ano na tribuna da Câmara dos Deputados, o deputado capixaba Marcus Vicente (PTB-ES) disse que os interesses econômicos da transnacional Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) podem transformar Vitória em uma Cubatão, em termos de falta de qualidade de vida. Os interesses do grande capital financeiro são prioridade, em detrimento do enorme capital humano, que é a população capixaba. A destruição ambiental da região levará os atuais políticos a serem julgados por omissão, previu o parlamentar.
O deputado criticou o anúncio feito pela CVRD de que fará investimentos no controle da poluição. Afirmou o deputado: "A Vale ainda anuncia investimentos ínfimos de 3% de seu lucro em meio ambiente, e o faz utilizando-se do espaço público do palácio Anchieta, sede do governo do Espírito Santo, o que causa uma grande confusão na cabeça das pessoas mais humildes". E seguiu: "A sensação que fica é de que a Vale é uma grande benfeitora do Espírito Santo e do País. Mas há uma outra sensação também, a da sujeição do poder político ao poder econômico, o que é profundamente lamentável".
Marcus Vicente citou que "a Associação Capixaba de Proteção ao Meio Ambiente (Acapema) divulgou, recentemente, alguns dados extremamente preocupantes em relação à poluição atmosférica na região". De acordo com esses dados, as grandes siderúrgicas instaladas ao norte de nossa capital lançam cerca de 264 toneladas de poluentes na atmosfera diariamente - o que corresponde a 96.360 toneladas ao ano. Entre os 59 poluentes atmosféricos, 28 são altamente nocivos à saúde, destacando-se micropartículas de ferro e derivados de enxofre. Estes últimos, em contato com a água, produzem ácido sulfúrico.
Com isso "a poluição atmosférica afeta não apenas o meio ambiente, mas também a saúde da população. A incidência de vários tipos de câncer, doenças alérgicas e respiratórias, além da baixa da imunidade às doenças entre os habitantes da Grande Vitória, têm sido associadas à poluição do ar".
Assinala que "cada morador da Grande Vitória gasta, em média, R$ 100,00 por ano para se tratar dessas doenças, bem mais do que os R$ 80,00 que investe a Vale do Rio Doce em seus projetos de meio ambiente, que mais servem ao marketing institucional da empresa do que à saúde dos capixabas.
Estima-se que, em decorrência da poluição atmosférica na região, já tenham sido consumidos de R$ 3 bilhões e 700 milhões a 4 bilhões e 400 milhões, de recursos públicos e privados, para tratamento de saúde da população".
Um estudo do Instituto de Física da Universidade Federal do Espírito Santo aponta a origem dos poluentes lançados no ar. Segundo esse estudo, 50% da poluição do ar na Grande Vitória têm origem nas siderúrgicas implantadas na região: a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) responde por 20 a 25% desses poluentes; a Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) - Arcelor, por 15 a 20%, e a Belgo-Arcelor, por 5 a 8% de responsabilidade pelos danos à saúde dos capixabas da Grande Vitória".
Os bolsões de pobreza devem crescer na Grande Vitória e no sul do Estado por conta dos projetos de expansão das chamadas grandes empresas. Serão contratados mais de 20 mil empregados para os trabalhos de terraplenagem e de construção civil da Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST), da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e da Samarco Mineradora. Os problemas vão começar com a conclusão dos novos projetos, quando só uma pequena parcela dessa mão-de-obra será aproveitada pelas empresas.
O diretor de Comunicação do Sindicato dos Metalúrgicos do Estado (Sindimetal), Edson de Oliveira Santos, o Canário, entende que as empresas não têm preocupação de caráter social, como propagam. Para elas, o que interessa é a contratação de trabalhadores via empreiteiras prestadoras de serviço, o que gera menos encargos trabalhistas e salários mais baixos.
(Por José Alfredo Júnior, Século Diário, 19/12/2006)
http://www.seculodiario.com.br/arquivo/2006/dezembro/19/noticiario/economia/19_12_01.asp