O Rio dos Sinos, um dos mais importantes da Região Metropolitana de Porto Alegre, sofreu um novo desastre ambiental neste fim de semana. Segundo estimativa da Fundação Estadual de Proteção ao Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (Fepam), entre 10 e 15 toneladas de peixes morreram. A nova mortandade foi descoberta sábado. Já é o terceiro caso desde o desastre ambiental de outubro quando morreram outras 80 toneladas de peixes de várias espécies.
Segundo o diretor técnico da Fepam, Jackson Muller, a temperatura da água na faixa dos 30°C (seis acima da média), o baixo nível de oxigênio e a reduzida vazão do rio contribuíram para que a poluição ficasse mais concentrada e provocasse a nova mortandade de peixes. Em alguns pontos, acrescentou, o nível do rio está mais de um metro abaixo do nível normal. Nesta segunda, a Fepam volta a ativar injetores de oxigênio em Sapucaia do Sul e São Leopoldo para tentar reduzir o estrago.
A poluição que está matando o Rio dos Sinos é resultante de um conjunto de fatores: resíduos resultantes da intensa atividade industrial na região que é um pólo produtor de couro e calçado, falta de tratamento adequado de esgotos domésticos e captação da água do rio para irrigar lavouras de arroz. O problema é crônico e só vem se agravando nos últimos anos.
Autoridades públicas e empresários ficam jogando a culpa uns nos outros e a população também não se mobiliza para pedir medidas enérgicas que interrompam a morte do rio. Agora, no final de 2006, a situação está chegando a um ponto crítico. A quantidade de peixes mortos nos últimos meses já se aproxima de 100 toneladas. O baixo índice de chuvas registrado nas últimas semanas contribui para o agravamento do problema, uma que vez que causa – juntamente com a captação da água para irrigar lavouras – a diminuição da vazão do rio.
Ninguém assume responsabilidade
No dia 23 de novembro, os conselhos de Infra-Estrutura e de Meio Ambiente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs) emitiram um parecer isentando as empresas da região pelo desastre ecológico no rio e atribuindo toda a culpa ao setor público que não teria investido o que deveria em saneamento básico. Na época, o coordenador do Grupo temático de Saneamento da Fiergs, Edgar Cândia, disse que o prejuízo causado pelas indústrias era “pouco acima do zero”.
Segundo ele, as empresas têm plena consciência de seu papel e estão trabalhando para reduzir a poluição na região. Se estão trabalhando, a eficácia desse trabalho deixa muito a desejar pois a mortandade de peixes continua. Além de culpar o setor público, a Fiergs apontou como responsáveis pelo desastre ambiental a baixa vazão do rio, a piracema e a temperatura alta desta época do ano, que acelera o consumo de oxigênio.
A atuação fiscalizadora da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), no entanto, autuou seis indústrias da região por irregularidades no tratamento de efluentes, contestando a tese de que o prejuízo causado pelas indústrias era “pouco acima do zero”. Além disso, no dia 28 de novembro, o Ministério Público de Estância Velha ajuizou uma ação civil pública contra a empresa Utresa, que trabalha com tratamento de resíduos industriais dos setores coureiro-calçadista, de alimentação, celulose e metalurgia, acusando-a de ter contribuído decisivamente para a tragédia ambiental no rio dos Sinos.
Atendendo solicitação do Ministério Público, a Justiça decretou a prisão do engenheiro químico e empresário Luiz Ruppenthal. Segundo a investigação feita pelo MP, a unidade da empresa em Estância Velha lançou produtos tóxicos diretamente em arroios que deságuam no rio dos Sinos. O empresário permanece foragido e o MP nomeou um interventor na empresa.
Sucateamento dos órgãos ambientais
Desde agosto de 2004, a Utresa vinha sendo investigada por práticas irregulares no depósito e disposição dos resíduos sólidos recebidos. Recentemente, segundo o MP, a empresa foi atuada pela Fepam por lançamento clandestino e irregular de percolado sem tratamento adequado no Arroio Portão em um período compatível com a mortandade de peixes. Os promotores consideram que essa poluição “foi causa determinante, eficiente e suficiente para que tal evento pudesse ocorrer”.
As medidas adotadas pelas autoridades ambientais do Rio Grande do Sul vêm se revelando incapazes de deter o processo de destruição do rio. A combinação do alto nível de poluição industrial e doméstica com a diminuição da vazão do rio segue matando milhares de peixes. Os peixes estão buscando um lugar para a reprodução, mas não estão encontrando nem água, nem oxigênio. Após a mortandade de outubro, a Fepam constatou a presença de metais pesados no Sinos, entre eles zinco e cobre.
O enfraquecimento da capacidade fiscalizadora dos órgãos ambientais do Estado é outro fator que contribui para o agravamento do problema. Durante o governo Germano Rigotto (PMDB), houve uma redução do número de fiscais da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema). Hoje, o Departamento de Controle da secretaria tem cerca de 100 técnicos para fiscalizar todo o Estado. A Fepam, por sua vez, tem cerca de 250 servidores no total.
Segundo funcionários destes órgãos, os laboratórios de monitoramento estão sucateados, inviabilizando uma série de análises que garantiriam provas técnicas para investigar problemas de poluição e apoiar a fiscalização nas indústrias e outras fontes de poluição. Os funcionários da Sema ficaram dois anos sem qualquer reajuste salarial e chegaram a paralisar por dois meses a emissão de licenças ambientais em protesto contra essa situação. Enquanto isso, o rio dos Sinos segue sua lenta e mortal agonia.
(Por Marco Aurélio Weissheimer,
Agência Carta Maior, 18/12/2006)
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