Contratado por Zero Hora, o Laboratório Green Lab analisou amostras de água dos rios dos Sinos e Gravataí - que desembocam no Guaíba - e do sedimento do fundo do Arroio Portão, todos na Região Metropolitana. O material averiguado revelou um ambiente hostil à vida, segundo padrões estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), na resolução 357 de 17 de março de 2005.
Foram detectados nas amostras recolhidas nos rios dos Sinos e Gravataí índices de oxigênio dissolvido na água abaixo do padrão e altas concentrações de nitrogênio amoniacal, elemento encontrado na urina. Isso pode indicar o despejo de grandes quantidades de esgoto doméstico no trecho de onde as amostras foram retiradas. A análise também indicou a presença de cromo no fundo do Arroio Portão.
Segundo os técnicos, a reação do nitrogênio amoniacal com o cloro usado nas estações de tratamento é a responsável pelo odor forte da água sentido pelos consumidores. Essa condição também contribui para a proliferação de algas, responsáveis pelo gosto ruim, queixa comum durante os meses de verão. O cromo encontrado no Arroio Portão, afluente que gerou a recente mortandade de peixes no Sinos, pode ser nocivo ao homem se ingerido em grandes quantidades. O metal é utilizado por curtumes e outros tipos de indústrias.
Apesar dos elementos encontrados nas análises, a água servida à população da Região Metropolitana é de boa qualidade graças à limpeza feita por meio de produtos químicos e à contenção mecânica dos resíduos sólidos realizadas nas estações de tratamento.
O temor dos técnicos é de que, a persistir o atual ritmo de despejo de esgotos domésticos e industriais no Sinos, no Gravataí e no Arroio Portão, a tecnologia usada para eliminar a poluição se torne ineficiente.
- Os resultados desses testes mostram uma realidade só percebida pelas pessoas quando acontecem tragédias ambientais, como a recente mortandade de toneladas de peixes no Sinos ou nas ocasiões em que água da torneira sai com odor e gosto insuportáveis - comenta o superintendente de tratamento da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), Marinho Emílio Graff.
Caso permaneça o atual quadro de poluição dos rios Gravataí e Sinos, há a possibilidade de futuramente a Corsan transferir para o Arroio das Garças, em Canoas, as captações para abastecer os municípios de Esteio e Cachoeirinha.
Poluição chega ao canal de navegação do Guaíba
Há 18 anos, devido à impossibilidade de tratar a água, a empresa transferiu para o Arroio das Garças uma das suas captações no Gravataí que levavam água para Canoas.
A poluição dos Sinos e do Gravataí é despejada no canal de navegação do Guaíba. No local, há a captação de água para duas estações de tratamento, a Moinhos de Vento e a São João, do Departamento Municipal de Águas e Esgotos, da prefeitura de Porto Alegre, responsáveis por 50% do abastecimento da Capital.
- Acompanhamos desde 1970 a qualidade da água trazida pelos rios que abastecem o Guaíba. E ela piora a cada dia - diz Iara Conceição Morandi, diretora da Divisão de Pesquisa do Dmae.
Qual é a saída?
Apenas uma decisão política poderá evitar que a poluição sufoque os rios dos Sinos e Gravataí, segundo avaliação de especialistas ouvidos por Zero Hora. Para o engenheiro Valtemir Bruno Goldmeier, presidente do Conselho Estadual do Meio Ambiente e assessor da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), os danos causados por elementos encontrados no esgoto doméstico e industrial, como os detectados nas amostras de água analisadas em laboratório, reforçam informes técnicos de pesquisadores.
- Temos leis, tecnologia e sabemos a causa da poluição. Falta uma decisão política para resolver o problema - diz Goldmeier.
Muito do conhecimento técnico sobre os efeitos da poluição no rios dos Sinos e Gravataí foi adquirido por meio de pesquisas do engenheiro químico Enio Henriques Leite, da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). Ele chamou a atenção para o fato de os exames laboratoriais solicitados por ZH terem revelado um fator que vem crescendo ano a ano: a carência de oxigênio dissolvido na água.
- Baseado nos 10 anos que tenho de pesquisas no Sinos, posso afirmar que o rio está ficando sem oxigênio. Está morrendo - diz.
De acordo com Leite, suas pesquisas mostram que a poluição industrial tem se mantido controlada na região, mas crescem os danos causados pelo despejo de esgoto doméstico. De acordo com ele, há trechos no rio, como a foz do Arroio Portão, em que a carência de oxigênio transformou o lugar em um cemitério da vida aquática.
Embora existam pesquisas a respeito das águas do Sinos e do Gravataí, há escassez de estudos sobre o sedimento de afluentes dos dois rios usados para despejos industriais.
O cromo encontrado na amostra do leito do Arroio Portão pelo exame de sedimento mandado fazer por ZH preocupou a engenharia química da Fepam Maria Lucia Kolowski Rodrigues, que conclui doutorado na UFRGS sobre análise de metais pesados em cursos da água na região dos curtumes e de indústrias calçadistas.
- Por ser apenas o exame de uma amostra, não podemos fazer comentários abrangentes. Mas o fato é que ele foi encontrado. E costumamos dizer que o cromo é a digital dos curtumes - diz a engenheira.
(Por Carlos Wagner,
Zero Hora, 10/12/2006)