Os camponeses e camponesas da Cloc (Coordenação Latino-americana de Organizações do Campo), da Via Campesina e outros movimentos sociais da América Latina estão reunidos na Cúpula Social pela Integração dos Povos, que teve início nesta quarta-feira (6/12), em Cochabamba, na Bolívia, para discutir as formas de preservar os recursos naturais, como água, as terras, as sementes e a biodiversidade.

Serão discutidos casos, experiências e propostas para preservar a água e garantir seu acesso a todos os seres vivos. Os países presentes no evento expuseram suas problemáticas em relação ao tema, que se refere não apenas a diminuição das fontes e reservas de água, mas também ao domínio territorial e dos recursos naturais da América Latina.

Contaminação do solo e água, deformidades físicas em crianças e doenças diversas são conseqüências de atividades como mineração e exploração petroleira, feitas em larga escala nos países latino-americanos. As monoculturas, como soja, e o florestamento de espécies atípicas, cultivadas na sua maioria por empresas de capital internacional, geram grandes problemas ambientais, enfraquecem os solos, secam as fontes de água e expulsam milhares de camponeses e indígenas de suas terras.

“O controle da água é político, um controle de território e não apenas de recursos naturais, onde as instituições internacionais nos impõem um pacote de desenvolvimento com planos acabados”, disse Luis Navoa, da Rede Brasil.

Pablo Viellagas, do Fórum Boliviano de Meio Ambiente, diz que há uma oligarquia de empresas, que são responsáveis por reproduzir na América Latina políticas voltadas para a satisfação das necessidades dos países desenvolvidos. Para ele, este modelo não serve para a sociedade.

Propostas serão construídas neste encontro para fortalecer as organizações e movimentos sociais, buscando alternativas e formas de resistência aos problemas comuns enfrentados.

Terra
A concentração de terra e renda em todos os países da região é o centro do debate. Aurélio Soares, da Associação Nacional pela Salvação da Agropecuária da Colômbia, acredita que os países precisam de um amplo processo de Reforma Agrária. “Precisamos construir uma aliança social que democratize a propriedade rural para o desenvolvimento da agricultura, garantindo a soberania alimentar aos países que produzem alimentos para suas nações”.

No Brasil, explicou José Luiz Rodrigues, um dos integrantes do MST no encontro, o capital financeiro internacional e as grandes empresas transnacionais passaram a dominar a exploração das riquezas e dos trabalhadores no campo, e não mais o latifúndio. “As empresas estão controlando a terra, o créditos e biodiversidade, desenvolvendo monocultivos como a soja, eucalipto e cana-de-açúcar”, afirma.

Segundo Rodrigues, a mudança desse cenário depende dos movimentos sociais exigirem um amplo processo de Reforma Agrária, inclusive das áreas pertencentes às transnacionais, que contemple a maioria da população e garanta também o acesso à educação e a construção de um comércio internacional solidário.

Comercialização
Reinaldo Sosa, camponês da Venezuela, apresentou a experiência do país, que atualmente precisa importar 60% dos alimentos. Para mudar esse quadro, os venezuelanos desenvolveram uma política institucional de incentivo a produção de alimentos.

Além da soberania alimentar, os movimentos sociais acreditam que é necessária uma nova forma de comercialização. Hoje a exportação e importação vêm sendo usadas pelos países desenvolvidos como um instrumento para frear os preços dos produtos agrícolas das regiões mais pobres.

Para Renato Garcia, da Cioec (Coordenação de Integração de Organizações Econômicas Camponesas da Bolívia), os países precisam criar políticas nacionais com incentivos de créditos para proteger os preços dos alimentos, a agricultura familiar, a diversificação da produção e o meio ambiente.

O governo boliviano, disse ele, criou uma lei que proíbe a produção e comercialização de produtos transgênicos no país. Para ele, isso tem sido fundamental para manter os camponeses no campo. No mesmo sentido, o camponês Pedro Cuimbiana, do Equador, analisa que os países não têm como garantir a soberania alimentar sem fazer Reforma Agrária. Por isso, defende a realização de uma Reforma Agrária integral, que também ajude a resolver o problema da comercialização dos produtos.

Para Francisca Rodrigues, integrante da Anamuri (Associação Nacional de Mulheres Rurais e Indígenas do Chile), mesmo com todas as dificuldades os camponeses e camponesas do campo estão resistindo aos processos de dominação econômica. Ela acredita que a divisão das terras também deve garantir o processo de integração entre os povos. “A Reforma Agrária tem que conservar o processo cultural, pois hoje as sementes estão prisioneiras nos bancos de sementes das grandes empresas”, explicou.
(Por Solange Engelmann e Ângela Vargas, Via Campesina, 07/12/2006)