Índios vão a Brasília cobrar de Bastos portaria que devolve suas terras
2006-12-08
Os índios das tribos Tupinikim e Guarani do Estado irão a Brasilia na próxima semana para cobrar do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, a assinatura da portaria que oficializa a demarcação das terras indígenas usurpadas pela Aracruz Celulose. Eles querem que a portaria seja assinada até o próximo dia 20/12. Segundo o cacique Werá Kwaray, da aldeia de Boa Esperança, a comunidade está se sentindo "enrolada".
O responsável pelo "rolo", segundo o cacique, é o ministro Thomaz Bastos, que prometeu a assinatura para antes do período eleitoral e não cumpriu a promessa.
"A comunidade está apreensiva e está pressionando os caciques. O Ministério já fez inúmeros ajustes nos prazos e isso vêm prejudicando muito a nossa luta. Essa terra é nossa por direito e esperávamos que o ministro pudesse compreender isso, como quando prometeu a portaria para nós antes do período eleitoral", ressaltou Werá Kwaray.
Ele lembrou que o ministro veio ao Espírito Santo no dia 30 de novembro e afirmou que não necessitava de mais prazos para assinar a portaria. No entanto, desde o dia 21 o processo se encontra na mesa de Márcio Thomaz Bastos e ninguém sabe informar quando a portaria será assinada.
Todo o processo que permitirá a devolução das terras indígenas aos Tupinikim e Guarani, inclusive o parecer da Advocacia Geral da União (AGU), está concluído e, por isso, os índios cobram agilidade do ministro.
Os Tupinikim e Guarani reivindicam 11.009 hectares de terras indígenas que atualmente são utilizadas pela Aracruz Celulose para o plantio de eucalipto. Ao todo a Fundação Nacional do Índio (Funai) confirmou que 18.070 hectares são terras indígenas, mas a empresa ainda ocupa 11.009 hectares destas terras.
A Aracruz Celulose vem lutando para se manter na área indígena através de campanhas publicitárias, uma cartilha difamando a cultura indígena da região - motivo de ação no Ministério Público Federal (MPF) - e através do apoio do Sinticel, o sindicato dos trabalhadores da empresa.
A luta dos índios vem recebendo apoio de amplos setores da sociedade brasileira. Um abaixo-assinado está circulando com o objetivo de pressionar o governo a assinar a portaria demarcatória e deverá coletar 100 mil assinaturas. Além disso, a própria comunidade de Aracruz fez denúncias sobre a forma discriminatória como os índios vêm sendo tratados no município devido à pressão da Aracruz Celulose.
Os índios também recebem apoio do exterior. Este ano, receberam manifestações neste sentido na Europa. E, agora, nos Estados Unidos, onde o cacique Jaguareté, da aldeia de Caieras Velhas, denunciou a opressão da Aracruz Celulose sobre o seu povo e os Guarani.
O cacique fez conferência no Fórum Internacional sobre Globalização (IFG), no último dia 18 de novembro, em Nova York. Foi o único representante índio do Brasil. A política da Aracruz Celulose foi denunciada ainda na Organização das Nações Unidas (ONU), inclusive junto ao embaixador dos EUA na ONU, John Bolton.
Terras indígenas no Estado
Os Tupinikim e Guarani capixabas lutam há anos pela devolução de suas terras usadas pela Aracruz Celulose. Em maio de 2005, essa luta se acentuou depois da autodemarcação de 11.009 hectares do território indígena reconhecido pela Fundação Nacional do Índio (Funai).
Desde então, uma série de conflitos entre a empresa e os índios se sucederam até o início de 2006, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, estiveram no Estado e prometeram aos índios que suas terras seriam devolvidas ainda este ano. Representantes da Funai também garantiram que os prazos seriam cumpridos e que o parecer seria favorável aos índios, pois as terras já haviam sido reconhecidas pelo grupo de estudo do órgão em outras ocasiões.
Assim, um novo estudo foi feito reiterando que os 11.009 hectares de terras usadas pela Aracruz Celulose no norte do Estado são tradicionalmente indígenas, ou seja, pertencem à União e por isso são inegociáveis. Devem, portanto, permanecer com as comunidades indígenas. Este processo já está nas mãos do ministro da Justiça que garantiu pessoalmente aos índios que acataria a decisão da Funai até o mês de setembro, o que não aconteceu.
Desde a chegada da Aracruz Celulose ao Espírito Santo, os índios vivenciam a destruição de seu habitat, de sua cultura, religião e costumes, e a morosidade da Justiça no que diz respeito ao cumprimento dos direitos indígenas. A empresa, além de deixar os índios ilhados em seus eucaliptais, utiliza sua milícia armada, a Visel, que segundo os índios, age de má-fé com as comunidades.
(Por Flávia Bernardes, Século Diário – ES, 07/12/2006)
http://www.seculodiario.com.br/arquivo/2006/dezembro/07/index.asp