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2006-12-08
O rio Lerma, o mais extenso do México e que fornece água potável para a sua capital, agoniza por causa de poluição de origem variada e em razão de falidos planos de recuperação que somente serviram para engolir centenas de milhões de dólares. A bacia deste rio de 1.270 quilômetros de comprimento abrange cinco Estados antes de desembocar no oceano Pacífico, mas os 47 quilômetros mais afetados ficam no distrito estadual de México, onde nasce e recebe o esgoto dos 33 municípios vizinhos, segundo um estudo do movimento ecologista local.

As águas limpas de outrora continuam carpas, rãs-touro (Rana catesbeian) e camarões de água doce, entre outras espécies. Agora, esse rio está em “estado de coma”, embora ainda vivo, segundo o coordenador da Comissão para o Saneamento da Bacia Lerma-Chapala-Santaigo, Jorge Jiménez Campos. Entretanto, a estatal Reciclagua Sistema Ecológico de Regeneração de Águas Residuais Industriais admitiu que o rio já não é capaz de digerir por si só os dejetos que recebe.

Há 20 anos, o governo do Estado do México, vizinho da capital do país, gastou US$ 714 milhões em estações de tratamento de esgoto e somente conseguiu “sanear” 27% dos 125 quilômetros que o rio ocupa nesse distrito. Diante disso, foi criada uma comissão de saneamento para impulsionar obras destinadas à recuperação das águas, que terminou por construir lagoas de oxidação, também conhecidas como lagoas de estabilização.

A construção dessas estações de tratamento começou em 1990 por iniciativa do então governador estadual Ignácio Pichardo PAgaza (1989-1993), obra que depois teve prosseguimento nas administrações dos que o sucederam, Emilio Chuayffet Chemor (1993-1995), César Camacho Quiroz (1995-1999) e Arturo Montiel Rojas (1999-2005) até completar 31 delas nos 33 municípios. O compromisso desses governos acabou com a entrega das lagoas às prefeituras, sem que se responsabilizassem por sua operação de maneira satisfatória.

Nenhum organismo público do Estado do México controlou o funcionamento das estações de tratamento, das quais apenas 40% estão ativas atualmente, segundo Luis Eduardo Mejía Pedrero, encarregado da subgerência de engenharia da direçao da Comissão Nacional da Água (Conagua) do México, e porta-vozes da Secretaria da Água e Obra Pública. Hoje em dia, o governo estaudal de Enrique Pena Nieto não tem interesse na reativação das lagoas de oxidação, porque ajudam a provocar inundações, explicou seu secretário da Água e Obra Pública, David Korenfeld Federman.

Por outro lado, especialistas da Conagua e da Comissão para o Saneamento da Bacia responderam ao governo do Estado dizendo que as estações de tratamento carecem de bombas, não têm pessoal capacitado para operá-las nem recursos para pagar a energia elétrica que consomem. Perdeu-se o trabalho e também os investimentos na área, e os únicos com capacidade para recuperar estes sistemas de tratamento são os municípios, afirmaram. Mas, no México os municípios nasceram “anões” economicamente. Possuem muitas obrigações em matéria ambiental e escasso orçamento, disse José Marcos Aguillar, delegado nesse Estado da Comissão Nacional da Água.

Como se não bastasse, a tecnologia de lagoas de oxidação, ou estabilização, não foi a melhor opção, segundo o presidente e fundador do Movimento Ecologista do Estado do México, Roberto Gómez. A explicação dada pelos documentos oficiais do governo estadual é que as lagoas consistiam em utilização das zonas mais baixas do rio Lerma, para concentrar ali toda água da região e fazê-las funcionar como vasos ecológicos e de regulagem. Com isso, mediante sistemas de drenagem, pretendia-se livrar de inundações o restante das terras, incorporando-as à agricultura e à pecuária com grandes benefícios para o Estado do México, pelo alto potencial produtivo que chegariam a ter.

Luis Eduardo Mejía, subgerente da Conagua, disse que as lagoas de estabilização não foram as mais idôneas, e agora especialistas alemães estudam novos métodos. Nesse período, todos os governos do Estado do México asseguraram que a bacia estava sendo saneada, mas, “lamentavelmente, investiu-se nos efeitos e não nas causas”, admitiu Aguilar. Nas publicações sobre a suposta restauração da Comissão Coordenadora para a Recuperação Ecológica da Bacia do Rio Lerma, criada em 1990 e dirigida inicialmente pelo ex-governador Jorge Jiménez Cantú (1075-1981), não só a duplicidade de ações é notória, mas, também a mistura de obras que nada têm a ver com a preservação do meio ambiente.

Na maioria dos avanços reportados pela Comissão está o número de obras e o valor do investimento. Além disso, incluem-se gastos em outras áreas, com construção de estradas e canalização de canais. Preocupa o fato de o falido projeto de Pichardo Pagaza agora irá se duplicar, alertam ambientalistas. Eles asseguram que o governo atual do Estado pretende seguir a estratégia de seus antecessores, apesar de estar diante de um dos rios mais contaminados do México, segundo concorda a própria Comissão para o Saneamento da Bacia Lerma.

O governador Nieto falou no final de 2005, quando assumiu o cargo, de sua intenção de construir mais estações de tratamento, embora não informasse sobre o tipo de tecnologia. O primeiro projeto de tratamento de águas residuais no Estado do México foi estabelecido em 13 de abril de 1989, com a assinatura de um acordo entre o governo do Presidente Carlos Salinas de Gortari e os Estados de Guanajuato, México, Jalisco, Michoacán e Querétaro, por onde passa o rio Lerma. O ativista Gómez desqualificou essas tentativas.

“Estes propósitos foram expostos de forma idêntica em agosto de 1990 em Toluca, no que foi chamada de Primeira Reunião do Conselho Consultivo para o Ordenamento e Saneamento da Bacia do Rio Lerma”, recordou. Ali se tentou reciclar esgoto de 40 municípios e de 175 empresas do corredor industrial da bacia com estações que não funcionavam, entre elas duas entregues em concessão às companhias Ecosys I e Ecosys II, explicou. Agora, pretende-se construir outras 40 “sem vontade política nem recursos”, mas, provavelmente, com vistas a beneficiar, em todo caso, a empresa privada, alertou Gómez.

Federman confirmou estes planos. Nos próximos cinco anos não haverá capacidade para construir sistemas de tratamento em cada um dos 125 municípios do Estado do México, mas, sim para a instalação de 40 estações novas do tipo regional, isto é, que atendam às prefeituras em conjunto. Os custos por sistema, sem considerar o pagamento pelo terreno, serão de, aproximadamente, US$ 9 milhões, dependendo da tecnologia, disseram especialistas. A expectativa governamental é tratar 50% dos esgotos, disse o secretário da Água e Obra Pública.

Em outra entrevista, o vogal executivo da Comissão de Água do Estado do México, José Manuel Camacho Salmón, afirmou que a meta é tratar 20 litros por segundo. O funcionário disse que todas as estações serão concessões sob o esquema financeiro denominado Projetos de Prestação de Serviços, que implica a entrega em concessão ao setor privado por até 30 anos. Carlos Díaz, coordenador do Centro Interamericano de Recursos da Água, da Universidade Autônoma do Estado do México, denunciou que as autoridades locais não solicitam a participação dos especialistas, apesar dos investimentos milionários em pesquisas do rio Lerma. A contaminação não parece ter trégua no rio. Os ambientalistas calculam que 90% de suas águas já estão afetadas e prevêem que não haverá recuperação se a estratégia não for mudada.
(Por Patricia Veja Villavicencio, IPS, 07/12/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=25584&edt=1

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