Outra batalha contra a mineração em Pascua Lama, fronteira entre Chile e Argentina
2006-12-08
A companhia de mineração Barrick Gold, do Canadá,
será alvo de uma nova campanha civil internacional por causa de seu projeto
Pascua Lama de exploração aurífera na fronteira entre Chile e Argentina. A empresa obteve no último dia 5 autorização ambiental das autoridades da
província argentina de San Juan, onde já explora a mina de Veladero e tem
projeto pronto para a mina de Famatina. Um Tribunal Cidadão, realizado no
dia 26 de novembro em Santiago, por ocasião do II Fórum Social do Chile,
declarou a Barrick Gold Corporation “responsável por graves atentados
ambientais, sociais, culturais e econômicos, produto de suas políticas, seu programas e ações nos territórios e povoados da Argentina, do Chile e do Peru”.
Por trás do simbólico processo estiveram cerca de 20 organizações chilenas.
A companhia foi citada, mas, se desculpou, através de fax, argumentando que
seu representante não se encontrava no país. “O tribunal conseguiu
consolidar a coordenação dos três países contra a Barrick Gold. A sentença é
o eixo que orientará nossa campanha de denúncia”, disse à IPS Lucio Cuenca,
diretor do não-governamental Observatório Latino-americano de Conflitos
Ambientais (Olca). Cuenca adiantou que os ativistas pretendem estabelecer um
dia internacional contra a Barrick Gold Corporation, que tem 12 explorações
mineiras em quatro continentes, e fortalecer a oposição ao projeto Pascua
Lama durante o verão austral.
Pascua Lama é uma das maiores fontes auríferas intocadas do mundo, com
reservas de 18,3 milhões de onças de ouro e 685 milhões de onças de prata.
No Chile, está localizada 150 quilômetros a sudeste da cidade de Vallenar,
na terceira região de Atacama, e na Argentina fica a 300 quilômetros de San
Juan, capital da província de mesmo nome. O investimento previsto é de US$
1,5 bilhão. Apesar da oposição exercida durante anos por grupos
ambientalistas e cidadãos chilenos, a Comissão Regional do Meio Ambiente
(Corema) da terceira região autorizou sua exploração, no dia 15 de fevereiro
deste ano, ao aprovar o Estudo de Impacto Ambiental preparado pela empresa.
Entretanto, a Corema fixou algumas restrições: proibiu remover as três
geleiras (Toro I, Toro II e Esperança) próximas à mina, exigiu a proteção da
flora e fauna da região e o tratamento de resíduos oriundos de suas
atividades, que poderiam afetar os moradores do vale do rio Huasco, em sua
maioria pequenos agricultores. Na sentença, os quatro membros do júri
reclamaram “ao novo Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações
Unidas que aplique as normas de direitos humanos da ONU às empresas e, em
virtude delas, crie e execute procedimentos de fiscalização, através de
observadores internacionais para a Barrick Gold e para todas as empresas de
mineração transnacionais que operam da mesma maneira que a firma canadense”.
O advogado chileno Jaime Gallardo, que atuou como defensor da empresa no
tribunal a pedido dos organizadores, disse à IPS que foi utilizada a
informação disponível no site da Barrick Gold, cujo lema é “Mineração
Responsável”. Gallardo apresentou três argumentos: “Em primeiro lugar, a
companhia assegura que monitora permanentemente a quantidade e qualidade da
água dos rios e seus afluentes, o que tornaria improvável uma eventual
contaminação”, afirmou. “Em segundo lugar, a empresa destaca o investimento
feito em infra-estrutura na região e o apoio a escolas e centros de saúde.
Por fim, cita a criação de quatro mil a cinco mim empregos diretos, sem
contar os indiretos”, afirmou o advogado.
“Depois de participar do julgamento cidadão fico com a impressão de que, se
nos centrarmos nos testemunhos, a Barrick Gold é culpada eticamente das
acusações que lhe são feitas. Mas, um tribunal de justiça formal não a teria
condenado porque, pelo menos no Chile, os impactos ambientais, econômicos e
sócio-culturais não estão tipificados como delitos”, acrescentou. “Eu me
desliguei de responsabilidades com a companhia, passando-as às autoridades
governamentais, porque são elas que permitem a instalação das mineradoras e
são elas que não aperfeiçoam as legislações ambientais”, disse Gallardo.
Durante vários dias a IPS procurou obter respostas da companhia, que se
limitou a informar que aguardava a aprovação do projeto na Argentina.
“O projeto Pascua Lama está sujeito a uma ampla e profunda revisão tanto no
Chile quanto na Argentina e já houve uma saudável discussão sobre ele”,
respondeu através de correio eletrônico o vice-presidente de comunicação
corporativa da Barrick Gold, Vincent Borg, desde o Canadá. A empresa informa
em seu site que Pascua lama continua em desenvolvimento e estará em operação
em 2009. Mas, Mario Mautz, agricultor do Vale do Huasco e uma das
testemunhas do Tribunal Cidadão, garantiu à IPS que os trabalhos estão
paralisados.
“Há algum tempo começaram a demitir dezenas de trabalhadores que tinham
contrato indefinido para o projeto Pascua Lama, argumentando ‘fim das
tarefas de estradas”, disse o produtor legumes orgânicos. Os agricultores
asseguram que também deixaram de perceber o escurecimento das águas do rio
Chollay. O projeto enfrentou obstáculos por causa de denúncias feitas no
Chile sobre irregularidades na compra de terrenos necessários para construir
a mina, que estão aguardando resolução judicial. Mas, a partir da
autorização concedida em San Juan, a empresa disse em um comunicado que
estava pronta para retomar as obras. A Barrick Gold ainda precisa obter
autorizações setoriais, e os dois países deverão resolver aspectos fiscais
relativos ao projeto.
(Por Daniela Estrada, IPS, 07/12/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=25586&edt=1