Uma equipe multidisciplinar da Universidade Federal da Bahia (UFBA), que reúne o administrador, José Célio Silveira de Andrade, no Núcleo de Pós - Graduação em Administração; a engenheira Márcia Mara de Oliveira Marinho, do Departamento de Engenharia Ambiental da Escola Politécnica e da Rede de Tecnologias Limpa, (TECLIM); Ligia Maria França Cardoso, também da Rede TECLIM e Jamile Oliveira Santos, estudante de Engenharia Sanitária e Ambiental e bolsista de Iniciação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (FAPESB), fizeram uma análise dos Balanços Ambientais de 135 empresas no Estado da Bahia, sob a perspectiva da Produção Limpa. Os Balanços Ambientais (BA) foram elaborados por empresas sediadas no Estado e apresentados ao Centro de Recursos Ambientais (CRA) como requisito para renovação da Licença de Operação.
O CRA por sua vez, disponibilizou os mesmos para análise que tem como base a Produção Limpa e seus princípios fundamentais. Segundo o parecer dos analistas, os resultados possibilitaram uma avaliação do conteúdo dos documentos quanto ao atendimento aos requisitos da legislação e as
tendências ambientais das empresas, observando se as ações, metas, resultados e os condicionantes das licenças apresentadas nos BA estão dentro de uma abordagem da Produção Limpa (PL).
Outro item analisado foi o uso de indicadores de PL nesses documentos, como ferramenta para comunicar às partes interessadas, o desempenho ambiental das empresas. Como resultado, verificou-se que as informações contidas nos Balanços Ambientais demonstram que as práticas de fim de tubo ainda são predominantes nas empresas sendo as ações de PL ainda minoritárias, assim como se percebeu que os condicionantes do órgão ambiental necessitam ser mais pró-ativos e estimular a Produção Limpa.
Em linhas gerais, conclui a análise, os resultados da pesquisa demonstram que o uso desse instrumento no sistema regulatório do Estado não está sendo efetivo e que o Balanço Ambiental necessita ser mais bem compreendido e utilizado pelas empresas, órgão ambiental e sociedade.
A jornalista Nádya Argôlo, na Assessoria de Comunicação Social do Centro de Recursos Ambientais, conversou com a equipe multidisciplinar da UFBA, no ato de entrega dos resultados à diretora Geral do CRA, Lucia Cardoso.
Nádya Argôlo - Vocês analisaram o Balanço Ambiental de 135 empresas sediadas no Estado da Bahia. Alguma delas poderia servir de modelo dentro dos requisitos da Produção Limpa, ou seja, no que tange a otimizar os recursos e reduzir a geração de resíduos nos processos produtivos?
Equipe Multidisciplinar – Não encontramos nenhum Balanço Ambiental que possa ser citado como referência por ter demonstrado uma ênfase na Produção Limpa e que tenha utilizado indicadores de eco eficiência e desempenho ambiental. Acreditamos que a grande maioria das empresas não compreende o papel do Balanço Ambiental, como um instrumento de comunicação com o público do desempenho ambiental da sua atividade. As informações contidas nos Balanços Ambientais são, de modo geral, precárias e não quantificadas, não permitindo o acompanhamento por parte do público da evolução desse desempenho ambiental, o que contribuiria, ao nosso juízo, com a Produção Limpa. Percebe-se que os Balanços Ambientais ainda são percebidos como
um documento para o órgão ambiental ao invés de um documento para o público. Alguns Balanços Ambientais reconhecem a necessidade da utilização e apresentação de indicadores de desempenho ambiental, mas declaram não ser possível a sua utilização no momento da elaboração do referido documento.
NA - Sabemos que a Bahia é um dos poucos estados do Brasil que exige a apresentação de um Balanço Ambiental (BA), como requisito para a renovação da Licença Ambiental (LA), mais especificamente, a Licença de Operação (LO) das empresas. Como vocês avaliam esse requisito? Essa exigência induz a uma maior atenção e até melhores cuidados das empresas com relação aos seus desempenhos ambientais?
EM - Acreditamos ser um requisito importante e que pode fomentar a prática da transparência na divulgação de informações ambientais para o público, se for melhor entendido por todas as partes envolvidas: órgão ambiental, empresas, ONGs, acadêmicos e o público em geral. Infelizmente, não foi isso que encontramos na nossa pesquisa e por isso achamos importante a divulgação desse instrumento. É preciso
entendê-lo não como um instrumento burocrático ou mais uma exigência legal, mas como uma oportunidade de prestação de contas sobre a abordagem ambiental das empresas, o seu desempenho, a sua gestão e responsabilidade. Estas questões hoje são atuais e interessam a todos. As empresas se preocupam com a sua imagem perante a sociedade. O Balanço Ambiental pode ser um aliado do órgão ambiental, das ONGs ambientalistas e das empresas.
NA - Vocês ponderam que as empresas precisam ter uma maior preocupação com a melhoria e a demonstração do seu desempenho ambiental considerando que divulgam o Relatório ou Balanço Ambiental muitas vezes associado à publicação de informações sociais e financeiras. Qual seria a melhor maneira de uma empresa informar sua atuação
para que governo, órgãos ambientais e sociedade tomassem conhecimento dos procedimentos adotados?
EM - Existem diversas formas. O Balanço Ambiental é uma delas, assim como Relatórios Socioambientais, disponibilizados, por exemplo, na Internet, nas home pages das empresas ou dos órgãos ambientais.
NA - Após a pesquisa exploratória dos 135 Balanços Ambientais, a análise geral dos documentos e a identificação dos requisitos das legislações estaduais, em especial a resolução do CEPRAM - 2933 (Bahia, 2002), foram selecionados 81 BA. Elas correspondem a 60% das empresas analisadas por apresentarem ações de redução na fonte e reciclagem, requisitos que são as mais indicadas para reduzir a prevenir a poluição. Por que as demais empresas foram desprezadas?
EM - Foram desprezados esses Balanços por os mesmos terem informações muito precárias, sem possibilitar qualquer análise sobre a Produção Limpa. Estes documentos em geral, apresentavam apenas metas relacionadas ao controle da poluição e o atendimento aos condicionantes da licença anterior, os demais itens não eram respondidos. Em alguns BA determinados campos traziam a seguinte mensagem: vide ALA.
NA - O que elas teriam que fazer para terem, pelo menos, um desempenho ambiental regular em termos de Produção Limpa?
EM - Deveriam integrar os seguintes princípios da Produção Limpa nas suas políticas organizacionais: prevenção (mudança na fonte de produto e/ou processo para evitar o tratamento de resíduos no fim de tubo, mudança de tecnologia e/ou de boas práticas operacionais); precaução (na falta de dados seguros, evitar produto ou material com
indícios ou suspeitas de causar danos ao homem ou ao ambiente); acesso público à informação (transparência da informação sobre segurança de processo de produção, bens e serviços oferecidos); controle democrático da tecnologia (informar trabalhadores e moradores do entorno sobre segurança e riscos de processos e produtos); visão holística (visão do berço ao túmulo e do berço ao berço, com fechamento de ciclos upstream e downstream); e ecomarketing (conduta ética e de base socioambiental responsável).
NA - Sabemos que os princípios de Produção Limpa (Clean Production) foram propostos nos anos 80 pela ONG Greenpeace e previam que os processos, dentro dessa abordagem, deveriam utilizar somente matérias-prima renováveis. Sugeriam ainda a prática e a conservação dos recursos, como energia, água, entre outros. Recomendava também a não utilização ou produção de químicos perigosos assim como a não geração
de resíduos tóxicos. Essas observações continuam valendo?
EM - Sim. Não só continuam valendo, como os princípios da PL vêm sendo cada vez mais difundidos nos setores produtivos e na sociedade de uma maneira geral.
NA - Vocês sinalizam que a prática de publicação de Relatórios ou BA tem sido crescente por parte das empresas, principalmente, àquelas mais proativas, como forma de responder as pressões da sociedade no que diz respeito à proteção ambiental e responsabilidade social. E reforçam, citando (Furtado, 2000), que o “Princípio do Controle Democrático” fortalece o direito de acesso à informação, que é um pré-requisito
do desenvolvimento sustentável e elemento essencial para a produção
sustentável. Como este instrumento pode ser um meio para estimular as empresas a uma melhoria do seu desempenho ambiental e propor práticas de relacionamento com as partes interessadas?
EM - No momento que a informação é tornada pública, as empresas teriam maior interesse na melhoria do seu desempenho, para demonstrar à sociedade que tem responsabilidade para com o meio ambiente, que cumpre as leis ambientais, que se preocupam com a sustentabilidade do planeta e com as gerações futuras etc. Estes temas estão hoje na mídia diariamente, orientam opções de consumidores, de clientes internacionais e nacionais etc. Além disso, a publicação de informações expõe a atividade, o que à primeira vista pode provocar reações mas que pode também criar oportunidades de inovação, de se buscar uma produção mais limpa.
NA - Vocês ressaltam em um ponto da análise, que diversas empresas declararam que não fizeram e não pretendem fazer investimentos na área ambiental. Também disseram existirem algumas que descrevem apenas as ações a serem adotadas sem apresentarem os valores monetários e serem investidos. Como vocês observam essa falta de interesse, quase descaso? Alguma delas, pelo menos, formalizam nos seus BA os investimentos realizados e os ganhos ambientais obtidos?
EM - A questão do investimento ainda precisa ser aprimorada. A idéia desse item no Balanço Ambiental é de que o público consiga ter uma demonstração dos compromissos ambientais das empresas através de um indicador que seria qual a proporção dos investimentos ambientais em relação ao faturamento da empresa, incluindo aí ações de prevenção e controle. Sabemos que no Brasil essa não é ainda uma prática, mas o Balanço Ambiental pode contribuir, assim como outras iniciativas
voluntárias nas áreas Sociais e Ambientais. Infelizmente nenhum BA atendeu este item de forma satisfatória conforme a Resolução 2933/02 a qual solicita a descrição dos investimentos feitos (e a realizar) em controle ambiental e a apresentação do percentual aplicado em relação ao faturamento total da empresa.
NA - Dentro da abordagem da Produção Limpa e após análise dos balanços vocês obtiveram os seguintes resultados das empresas: 40% declararam possuir ações de redução de fonte; 41% informaram haver ações de redução e reciclagem e 19% confirmaram ter ações de reciclagem. Que critérios foram adotados para este julgamento?
EM - Os critérios foram construídos baseados no conceito de Produção Limpa nos seus diversos níveis (minimização, redução na fonte, reciclagem interna e externa). As ações das empresas apresentadas nos BA foram distribuídas nestas categorias e além dos níveis citados acima foi acrescentada à categoria de gestão ambiental devido ao elevado número de referências a atividades relacionadas a esse tema.
NA - Verifica-se no Desempenho Ambiental das empresas e nos Balanços Ambientais, a presença de normas como ISO 14001, OHSAS 18001, entre outras. O que vocês acham dessa prática? Será essa a maneira delas sinalizarem para a sociedade seus processos de qualificação?
EM - O fato das empresas adotarem as referidas normas não garante o acesso à sociedade das informações sobre as melhorias contínuas das suas performances ambientais. Para tanto, é necessário que as empresas tenham políticas de prestação de contas ambientais à sociedade, através da publicação de BA ou RSAC.
NA - Além disso, têm-se medidas de gestão do passivo ambiental como a recomposição vegetal e outras intervenções para minimização de impactos. Pelo menos para o Pólo Petroquímico de Camaçari, por se localizar em uma área tão árida, essas medidas são primordiais. Como vocês observam estas questões?
EM - As medidas acima citadas se referem à recuperação de áreas degradadas. São importantes, mas não são medidas de prevenção da poluição mas medidas adotadas após o impacto já ter sido gerado.
NA - Finalizando, o que vocês sugerem ao CRA como aprimoramento dessas práticas, ou seja, como a sociedade poderia ter melhor acesso a estas informações e documentos? E para as empresas, no que seria ideal para que, a curto prazo, pudessem melhorar, cada
vez mais, seus desempenhos ambientais?
EM - Para o CRA, a divulgação dos Balanços Ambientais no seu portal, ao invés de colocar na biblioteca do órgão. Também procurarem mecanismos para fomentar a Produção Limpa nas empresas, estabelecendo condicionantes com este enfoque e dialogarem com as empresas, o que tomamos conhecimento que está em andamento no órgão através de grupo de inovação ambiental no NEAMA.
(Por Nádya Argôlo,
Sistema Estadual de Informações Ambientais da Bahia, 28/11/2006)