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2006-11-29
Responsável pelo tratamento e destino final de resíduos gerados por cerca de 3,5 mil indústrias, a empresa Utresa, de Estância Velha, é apontada pelo Ministério Público (MP) Estadual e pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) como a principal responsável pela mortandade de 86,2 toneladas de peixes no Rio dos Sinos, no mês passado.

O diretor-presidente e responsável técnico da empresa, Luiz Ruppenthal, teve a prisão preventiva decretada pela Justiça, na manhã de ontem (28/11), a pedido do MP. Policiais civis fizeram buscas na região mas, até a noite, o empresário não havia sido localizado. Ele é apontado como autor de crime de poluição e teria cometido 13 infrações ambientais.

Conforme relatório apresentado pelo MP e pela Fepam, resultado de mais de 30 dias de investigações, "a carga poluente que atingiu o Rio dos Sinos, gerando a maior mortandade de peixes da história do Vale, partiu da Utresa." A empresa recebe resíduos de indústrias dos setores metalmecânico, coureiro-calçadista e de celulose e estaria despejando no Arroio Portão, afluente do Sinos, metais pesados como cromo, cádmio, chumbo e alumínio, substâncias encontradas no estômago de peixes mortos.

Os dados, que têm por base análises da água em diversos pontos do arroio, foram apresentados cinco dias depois de a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs) isentar as empresas pelo maior desastre ecológico da história do Sinos, com base em relatório da Fepam de 2001.

A Utresa foi uma das seis autuadas pela Fepam no dia 18 de outubro, quando a fundação apresentou, em São Leopoldo, relatório sobre a mortandade. Ontem à tarde, a Justiça aceitou o pedido de intervenção e nomeou o biólogo Jackson Müller, diretor-técnico da Fepam, e o geólogo Sandro Vertei como gestores da empresa.

O objetivo é mensurar danos causados ao ambiente e cessar o despejo irregular de efluentes. As atividades da Utresa não serão suspensas porque ela é uma das poucas empresas da região a armazenar restos de indústrias sem estação de tratamento.

- Sua interdição traria um colapso ainda maior ao ambiente, pois faltaria local para destinar os resíduos - afirma o promotor Marcelo Tubino.

Entenda o caso
7 de outubro: os peixes mortos no Sinos impressionam um grupo que percorria o rio de barco. A Fepam é informada sobre a mortandade por volta das 18h 8 de outubro: Fepam coleta água e peixes mortos (foto) e diz que mortandade pode ser a maior da história do rio
10 de outubro: Fepam anuncia três medidas emergenciais para conter a poluição - autuação das três primeiras empresas flagradas despejando efluentes de forma irregular, prazo de 180 dias para os municípios apresentarem plano para o esgoto doméstico e a redução, por parte das indústrias, de 30% da vazão de resíduos no Arroio Portão
18 de outubro: no primeiro relatório sobre a mortandade, a Fepam inclui o esgoto doméstico como um dos fatores que contribuíram para a morte dos peixes. Seis empresas são autuadas por despejo irregular de resíduos
23 de novembro: a Fiergs se manifesta sobre o desastre e afirma que a falta de investimento em saneamento básico é a principal responsável pela mortandade
Ontem: MP e Fepam afirmam que as investigações apontaram a Utresa como principal responsável pela mortandade. As investigações continuam

O relatório
Veja alguns dados do relatório apresentado ontem pela Fepam e pelo Ministério Público:
> Os peixes teriam começado a morrer no dia 6 de outubro
> No dia 21 de outubro, o MP e a Fepam identificaram pontos de lançamento de efluentes da Utresa no Arroio Portão. A empresa não tem autorização para despejar resíduos
> Amostras de sedimentos e água recolhidos nos cinco pontos de lançamento apontaram a presença de grande quantidade de alumínio, arsênio, chumbo, cobre, cianeto, cromo, cádmio e cálcio
> Na comparação entre um ponto do Arroio Portão anterior à Utresa e o local de lançamento dos efluentes, foram encontrados, no ponto de lançamento, 10,4 mil vezes mais alumínio, 133 vezes mais chumbo e 16.543 vezes mais sulfeto
> Para diluir um litro do efluente despejado pela Utresa, seriam necessários 32.538 miligramas de oxigênio. Ou seja, seria preciso 108,4 mil litros de água para cada litro do poluente.
> Os locais de lançamento teriam sido lavados com água limpa para mascarar a irregularidade

Medida não isenta outras empresas
O pedido de prisão do responsável técnico da Utresa foi embasado, segundo o MP, na continuidade do crime de poluição depois da mortandade, na destruição de provas da poluição por parte do empresário e na possibilidade de fuga.

O diretor técnico da Fepam, Jackson Müller, salienta que a medida não isenta a participação das demais indústrias autuadas pela fundação e também flagradas despejando efluentes de forma irregular. A falta de tratamento de esgoto doméstico por parte dos municípios ainda é apontada como a principal fonte de poluição, mas não como causadora da morte dos peixes.

- Quem causou a mortandade dos peixes foi a Utresa. As demais empresas poluidoras contribuíram para o estado do rio, assim como o esgoto não-tratado - acrescenta o promotor Paulo Eduardo de Almeida Vieira.

O despejo teria ocorrido num momento de fragilidade do Sinos, em que o teor de oxigênio encontrava-se em 0,3 miligramas por litro em alguns pontos (quando o ideal é pelo menos cinco miligramas por litro).

Contraponto
O que diz Fernando Couto, advogado da Utresa e do diretor Luiz Ruppenthal
Sobre a participação da Utresa no episódio da mortandade:
"A Utresa não trata resíduos líquidos. Os resíduos que trata são sólidos, e a mortandade não está atrelada à Utresa. O foco da empresa é a preservação ambiental, pois trabalha há mais de 20 anos para evitar que resíduos tenham um fim inadequado. A Utresa sempre trabalhou em conformidade com as exigências legais dos órgãos ambientais."
Sobre o pedido de prisão do diretor-presidente da Utresa, Luiz Ruppenthal:
"Acho absolutamente excessivo esse pedido de prisão, pois não se trata de um bandido. Esse pedido de prisão está dentro de um inquérito civil e me causa estranheza o fato de que ele (Ruppenthal) não foi intimado a depor dentro desse inquérito. Trata-se de um empresário que tem residência e trabalho fixo e que jamais se opôs a qualquer tipo de investigação. Tanto que prestou declarações, sempre que solicitado, à Polícia Civil de Sapucaia do Sul."
(Por Carla Dutra, Zero Hora, 29/11/2006)

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