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2006-11-29
Furacões são fenômenos espetaculares, mas transformações no clima de maior impacto podem passar despercebidas pela maioria das pessoas. São, por exemplo, alterações no regime de chuvas. Erroneamente consideradas menos importantes por leigos, elas têm força para afetar a agricultura, a geração de energia (hidroelétricas), a saúde e o bem-estar. Para um número crescente de cientistas, essas mudanças já estão em curso no Brasil e no mundo, devido ao aquecimento global.

- Já estamos num regime de aquecimento global. Precisamos discutir agora como reduzir seu impacto - diz José Marengo, do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/Inpe), que dará uma palestra sobre mudanças climáticas no Brasil e na América do Sul no XIV Congresso Brasileiro de Meteorologia, esta semana em Florianópolis.

Modelos climáticos do grupo de Marengo sugerem alterações em todas as regiões brasileiras. Porém, o impacto maior será sentido nas próximas décadas na Amazônia e no Nordeste, diz o pesquisador, que coordena o Projeto Uso de Cenários de Mudanças Climáticas Regionais em Estudos de Vulnerabilidade e Adaptação no Brasil e na América do Sul, financiado principalmente pelo Global Opportunity Fund (GOF), britânico.

A Amazônia sofrerá mais devido à perda de biodiversidade - um número muito grande de espécies poderá não se adaptar a padrões de temperatura e chuva diferentes dos atuais. Já no Nordeste o cenário para as próximas décadas é de intensificação da seca.

- O Nordeste tem uma população muito pobre e sem condições de enfrentar um clima ainda mais hostil. Teremos mais refugiados ambientais - diz o cientista.

Ele participa do Painel Inter-governamental de Mudanças Climáticas (IPCC), um comitê internacional integrado por mais de mil especialistas de todo o mundo. O próximo relatório do IPCC, esperado para fevereiro de 2007 deverá ser o mais contundente já lançado. O IPCC acredita que durante este século a temperatura subirá pelo menos 2 graus Celsius. Mas a elevação poderá ser de 4,5 graus Celsius "como resultado da duplicação das concentrações de dióxido de carbono na atmosfera em relação aos níveis pré-industriais, devido a emissões por atividades humanas". O IPCC considera provável que a esse aumento se some mais 1,5 grau Celsius como conseqüência do derretimento do gelo marinho e do permafrost (o solo congelado de regiões árticas).

- Estamos no início de um processo irreversível. Os níveis de CO2 na atmosfera são os maiores já registrados. Mudanças no clima podem ser fruto de ciclos naturais, mas o homem acentuou esse ciclo - explica.

Segundo ele, um dos sinais evidentes de mudança são chuvas intensas e invernos mais quentes, observados em todo o planeta. Uma elevação de 2 graus já muito grande:

- É o suficiente para mudar o regime de chuvas e nos levar para uma era de extremos.

Extremos significam mais dias de tempestades intensas e mais dias de seca, com períodos muito chuvosos intercalados por outros sem uma gota sequer. É como se o clima funcionasse em espasmos, com conseqüências desastrosas, em especial, para a agricultura e a geração de energia.
(Por Ana Lucia Azevedo, O Globo, 28/11/2006)
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