Conservar a floresta pode dar lucro
2006-11-29
Pesquisadores do Brasil e dos Estados Unidos calcularam que o fato do Brasil ter destinado 240 mil quilômetros quadrados em 2004 e 2005 para a preservação na floresta amazônica teve como efeito colateral positivo a prevenção do desmatamento de outros 60 mil quilômetros quadrados. Isso ocorreu porque, com a criação de unidades de conservação, os desmatadores tendem a abandonar a região ou mudar de atividade.
Só esta salvaguarda, de acordo com os pesquisadores, equivale a deixar de emitir 600 milhões de toneladas de carbono para a atmosfera. Segundo o único inventário nacional feito até hoje, de acordo com a Agência Estado, o Brasil emite cerca de 200 milhões de toneladas de carbono por desmatamento todo ano.
Acumulados na atmosfera, o carbono é um dos elementos que promovem o efeito estufa e o aquecimento global. A principal fonte hoje no mundo é a queima de combustíveis fósseis, como petróleo e carvão, especialmente nos países desenvolvidos. No entanto, o corte e a queima da mata convertem o carbono estocado na floresta em um gás-estufa. É justamente essa prática que coloca o Brasil entre os maiores emissores do mundo.
Para os pesquisadores citados pela Agência Estado no âmbito da Convenção do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), prevenir esta emissão tem o potencial de produzir cifrões no futuro. Não apenas pelos produtos florestais, mas simplesmente pela não emissão de mais carbono na atmosfera. Desta forma, a política do governo federal de formar um mosaico de unidades de conservação na Amazônia para frear o avanço da fronteira agropecuária pode gerar dinheiro dentro de um mecanismo que valorize a floresta em pé.
Os pesquisadores destacam que o desmatamento evitado ainda não gera dinheiro, mas esta possibilidade aumenta a cada ano. “Normalmente é bastante difícil calcular quanto vale a floresta em pé e esta pesquisa traz elementos novos”, destacou o biólogo Paulo Moutinho, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
Paulo Moutinho é um dos autores do estudo ao lado de Daniel Nepstad, do Centro de Pesquisa de Woods Hole (EUA), e de Britaldo Soares Filho, da Universidade Federal de Minas Gerais. Os dados foram apresentados na última Conferência das Partes da Convenção do Clima (COP), que aconteceu há duas semanas em Nairóbi, no Quênia. O pesquisador do Ipam é também um dos autores de uma proposta, apresentada na COP de 2003, que inclui no Protocolo de Kyoto o que não foi desmatado nas florestas tropicais, permitindo gerar créditos a serem vendidos no mercado internacional de carbono.
Fundo dos países ricos
Segundo a Agência Estado, em 2006, o governo brasileiro defendeu plano semelhante, mas que desvincula o desmatamento evitado do protocolo, pois o dinheiro viria de um fundo alimentado por países ricos. O presidente Lula esboçou interesse por tal fonte de renda numa reunião sobre mudanças climáticas que aconteceu recentemente na capital federal.
Deixar de cortar a floresta e, conseqüentemente, evitar a emissão de carbono na atmosfera depende, no entanto, da capacidade do governo implantar e fiscalizar as unidades de conservação criadas. Segundo o biólogo Paulo Moutinho, as últimas ações de comando e controle conduzidas na Amazônia mostram vontade, pelo menos. “Ainda está longe do ideal, mas cria uma sensação de insegurança no grileiro”, destacou Moutinho.
Para o biólogo, existe também outra questão, mas esta depende de estudos científicos. Ainda não se chegou a um número consensual de quanto corresponde o desmatamento de florestas tropicais na conta do efeito estufa. Os valores globais variam de 20% a 30%, mas um grupo de cientistas brasileiros acredita que o índice pode ser muito menor, na faixa dos 10%.
Moutinho afirmou que, a despeito da taxa, o desmatamento deve ser reduzido, seja para gerar crédito, seja para contribuir na luta mundial contra o aquecimento global. “A gente tem de buscar acurácia científica, mas do ponto de vista moral continua sendo a principal fonte de emissão do Brasil”, destacou Moutinho, para concluir que se “o desmatamento tropical é parte do problema, então deve ser também parte da solução”.
(KaxiANA, 28/11/2006)
http://www.kaxi.com.br/noticias.php?id=331