O governo do Chile quer que o futuro aeroporto internacional da nona região se destaque na celebração do bicentenário do país, em 2010. Porém, cerca de 500 famílias mapuches se opõem à sua construção por causa de seus potenciais danos sociais e ambientais. No dia 15 de novembro, a governamental Comissão Regional de Meio Ambiente (Corema), da nona região da Araucanía aprovou por 12 votos contra quatro (dos representantes da comunidade) e uma abstenção o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do aeroporto que será construído na localidade de Freire.
Durante 2007, pretende-se expropriar 495 hectares na localidade de Huilquilco e realizar a licitação internacional. As obras começariam em 2008 e terminariam no final de 2010. No dia 18 de setembro de 2010, serão comemorados os 200 anos de vida independente do país e o aeroporto é uma das principais “obras do bicentenário”, iniciadas na administração anterior e retomadas pelo governo de Michelle Bachelet. “Este projeto pretende dotar a região da Araucanía de um aeroporto de categoria internacional, gerando igualdade no desenvolvimento territorial”, explicou ao Terramérica o secretário regional ministerial de Obras Públicas, Marco Antonio Vásquez.
O novo terminal aéreo, que substituirá o atual aeroporto de Maquehue – distante mais de 20 quilômetros – terá um edifício de cinco mil metros quadrados e pista de 2,44 quilômetros de comprimento, ampliável para 3,2 quilômetros. Calcula-se um investimento privado de US$ 50 milhões. Segundo Vásquez, a demanda de passageiros aumentará significativamente até 2010 e Maquehue, cuja pista é de 1,7 quilômetros, não pode ser melhorado. Além de estar ao lado de uma colina e ser afetado pela neblina, sua ampliação implicaria expropriar terrenos da etnia mapuche, a principal do país. Na nona região, 600 quilômetros ao sul de Santiago, residem 23,5% dos 604.349 descendentes desse povo.
O lugar escolhido para o novo terminal está a apenas 15 quilômetros da capital regional, Temuco, fica perto da rodovia e as 12 famílias donas dos terrenos não pertencem a esta etnia. Entretanto, oito comunidades mapuches – das 23 limítrofes ao futuro aeroporto – formaram o grupo Ayún Mapu (Terra Alegre, na língua mapuzungun) para coordenar sua oposição ao anteprojeto apresentado pelo governo. Negam-se a sofrer a poluição sonora e a absorver os gases emitidos pelos aviões, e acreditam que o EIA aprovado não incluiu todos os estudos necessários para avaliar os reais impactos econômicos, sociais e culturais da obra.
“A Corema votou o EIA de um anteprojeto onde faltam análises hidrogeológicas, acústicas, de mecânica de solo e dinâmica da água”, disse ao Terramérica Richard Caifal, da Ayún Mapu. A prefeita de Freire, Maria Gricelda Campos, concordou. “Perguntei diretamente ao intendente (Eduardo Klein) da nona região por que se fez um anteprojeto e não um projeto, e ele me disse que o aeroporto será construído com ou sem eles”, denunciou ao Terramérica. Entretanto, Vásquez assegurou que o EIA inclui todas as análises requeridas e que a empresa que ganhar a licitação será encarregada de elaborar o plano definitivo.
A concessionária deverá certificar o aeroporto com a norma ISO 14.001 e assumir todas as responsabilidades por eventuais prejuízos. Não haverá compensações econômicas, mas um “plano integral de desenvolvimento territorial na área de influência do projeto”, onde – independente do que fizer a concessionária – todos os serviços públicos serão colocados à disposição das cinco mil pessoas que integram as 23 comunidades que, em média, se localizam a 1,5 mil metros do lugar onde será erguido o aeroporto.
Segundo a prefeita de Freire, localidade de oito mil habitantes, o terminal causará transbordamento do estuário Pelales, prejudicará os criadores de gado e os produtores de leite – “que serão expropriados de suas propriedades orgânicas” – e deixará sem trabalho e moradia uma centena de famílias. “Os mapuches realizarão suas cerimônias religiosas com aviões passando sobre suas cabeças”, acrescentou. Além disso, há quatro meses a localidade de Fermín Manquilef começou a tramitar títulos de propriedade na região.
Campos exortou as autoridades a reformar a Lei sobre Bases Gerais do Meio Ambiente, de 1994, que permite ao governo ser “juiz e parte” nos EIA. “Propusemos quatro lugares em Freire onde estes problemas não ocorreriam, mas optou-se pelo mais econômico”, afirmou a prefeita. O Ayún Mapu apresentará um recurso contra a decisão do Corema, um recurso de proteção nos tribunais chilenos e outro no Tribunal Interamericano de Direitos Humanos. Não se atrevem a anunciar medidas mais radicais. “As comunidades estão intimidadas, já que qualquer manifestação de mapuches é qualificada de ato terrorista”, disse Caifal.
(Terramérica, 27/11/2006)