Em nota de repúdio divulgada ontem, órgãos de defesa do meio ambiente condenaram as declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, feitas na última terça-feira, de que a legislação ambiental brasileira seria um entrave ao desenvolvimento econômico do país.
O texto, intitulado "Crescer, sim. De qualquer jeito, não", é assinado por 51 entidades e faz referência ao discurso do presidente realizado durante a inauguração de uma usina de biodiesel associado ao álcool em Barra do Bugres (MT).
Na ocasião, Lula afirmou que "as questões dos índios, quilombolas, ambientalistas e Ministério Público" são entraves que impedem que sejam feitos investimentos no país, sobretudo na área de energia. Declarou ainda que pretendia analisar esses obstáculos, preparar um pacote e chamar o Congresso para dizer que a questão é um problema nacional.
"Informações do governo atestam que a morosidade na tramitação de alguns projetos de infra-estrutura se devem à sua má qualidade ambiental, ao não-cumprimento de prazos por parte dos empreendedores e à insuficiência de quadros e de recursos nos órgãos públicos responsáveis pelo licenciamento", diz a nota, em referência ao levantamento realizado nesta semana pelo Ministério do Meio Ambiente que contesta a avaliação de que o atraso na concessão de licenças ambientais seria obstáculo ao país.
Essa análise provocou, inclusive, a reação do secretário-executivo do ministério, Cláudio Langone, conforme noticiou a Folha ontem.
Segundo Langone, culpar a questão ambiental pelo baixo crescimento do país e fazê-la de bode expiatório seriam formas de justificar incompetências de outras naturezas.
Na nota divulgada ontem, as entidades afirmam que destravar "o desenvolvimento não deveria significar a supressão de direitos ou de garantias legais". E completa: "Ao atacar minorias, o presidente recorre a um pretexto obviamente inconsistente e comete inominável injustiça".
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, existem atualmente apenas quatro processos de licenciamento ambiental de usinas hidrelétricas pendentes de decisão do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). Outros 14 projetos dependem de ações dos empreendedores -desses, seis já têm autorização para iniciar as obras e poderiam gerar 1.072 MW de energia.
Penduricalho
O Cimi (Conselho Indigenista Missionário) também divulgou nota ontem em reação às recentes declarações de Lula.
A entidade diz estar indignada com a afirmação do petista de que pretende "destravar todos os penduricalhos que atrapalham a agilidade de quem é prefeito, de quem é governador e de quem é presidente", realizada durante encontro com governadores, anteontem.
Sobre o discurso em Mato Grosso, o conselho afirmou: "É inaceitável que a maior autoridade do país, com este tipo de afirmação, reforce o alto grau de preconceito existente contra negros e índios e também desrespeite o trabalho do Ministério Público, que tem por função fiscalizar o cumprimento das leis do país".
No texto, o Cimi lembrou ainda que Lula foi eleito com votos de indígenas e negros e pede que "o país seja colocado numa rota de um desenvolvimento sustentável, que respeite a diversidade étnica e cultural existente no Brasil".
(Por Matheus Pichonelli, Folha de S. Paulo, 25/11/2006)