Eu produzo, você compra, nós contaminamos: todos os elos da cadeia deveriam compartilhar a responsabilidade pela degradação, avalia China
2006-11-23
Para se defender das criticas de ambientalistas, a China alertou que nos últimos 20 anos exportou grande quantidade de bens para todo o mundo enquanto guardava os resíduos e a degradação para si. Este é o país “onde mais recursos são consumidos e onde mais se contamina, bem como a principal vítima do atual contexto econômico e comercial” mundial, segundo o governamental Conselho Chinês de Cooperação Internacional sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Todas os elos da cadeia, incluindo fabricantes, comerciantes e consumidores, deveriam compartilhar a responsabilidade pela degradação econômica, segundo um informe desse organismo intitulado “Revisão e perspectivas do meio ambiente e do desenvolvimento da China”.
Os autores do estudo consideraram injustas as acusações feitas por organizações ambientalistas de que o processo de destruição que sofrem as selvas tropicais do sudeste asiático se deve à demanda importadora chinesa. De acordo com o documento do Conselho, 70% da madeira transformada em móveis nas fábricas da China terminam em vitrines e lares dos Estados Unidos e da União Européia. “Importamos a matéria-prima, produzimos, enviados os produtos ao estrangeiro e ficamos com os resíduos e a contaminação para nós”, disse um dos autores do documento, o especialista Shen Guofang, ao apresentar o informe.
Shen advertiu que o meio ambiente chinês vai piorar porque muitas indústrias contaminantes, como as do ferro, aço, cimento e da construção, se mudam dos países industriais para a China. “A mudança das indústrias também é a mudança dos contaminadores mundiais”, afirmou o especialista. Os países ricos “têm cada vez menos pressão ambiental e a China tem cada vez mais”, ressaltou. As importações de resíduos utilizados como matéria-prima, entre eles sucata e papel para reciclagem, aumentaram sete vezes em oito anos, passando de 4,58 milhões de toneladas em 1996 para 33 milhões em 2004.
Os problemas ambientais da China e seu impacto mundial são hoje motivo de atenção da imprensa internacional. A dinâmica locomotora econômica do gigante asiático tem um elevado custo ambiental: se converteu no segundo emissor, atrás dos Estados Unidos, de dióxido de carbono, ao qual se atribui o aquecimento do planeta, e no primeiro emissor de dióxido de enxofre, que provoca chuva ácida. Mas os cientistas chineses consideram que estas emissões não são surpreendentes, por causa do acelerado crescimento econômico nacional e sua dependência do consumo de carvão, que cobre 70% de sua provisão de energia.
O último Informe sobre Desenvolvimento Humano da ONU alerta que a situação da água piora na China, bem como sua deposição de resíduos contendo metais pesados. Mais de 300 milhões de pessoas, quase um quarto da população, carecem de acesso à água potável e mais da metade das fontes estão afetadas pela contaminação. “Enquanto as necessidades dos consumidores e a produção agrícola e industrial estiverem em contradição em uma economia em auge, pode-se esperar que estes problemas piorem”, disse na semana passada a representante na China do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, Alessandra Tissot. A contaminação da água é considerado um dos maiores desafios ambientais da China.
As próprias autoridades de Pequim acreditam que as empresas internacionais estabelecidas na China estão entre os piores violares das leis ambientais nacionais. Mais de 30 corporações multinacionais com operações nesse país violaram as normas de controle da contaminação da água, assegura uma investigação baseada em registros oficiais e realizada pelo não-governamental Instituto de Assuntos Públicos e Ambientais. Segundo esse informe, organismos governamentais, tanto locais quanto de nível local, denunciaram por contaminação da água 34 empresas multinacionais, entre elas Pepsi Co. Inc, Panasonic Battery Co. e Foster’s Group Ltd.
Os violadores estrangeiros das normas ambientais são uma pequena fração dos 2,7 mil detectados, mas o fundador e diretor do Instituto, Ma Jung, recordou que quase todas essas companhias são conhecidas por suas declarações públicas em favor da proteção ambiental. “Uma corporação internacional não pode se promover como se fosse uma empresa responsável quando não controla suas emissões”, afirmou. O informe do Instituto foi divulgado pela agência estatal de noticias Xinhua e por outros meios de comunicação nacionais. A agência acusou os governos locais de não controlarem as companhias.
Pequim procura dominar o desenfreado crescimento econômico para reduzir o consumo de energia e a emissão de contaminantes, mas muitos governos locais estabeleceram uma meta de aumento do produto em dois dígitos, muito maior do que o projetado pelas autoridades centrais, de 7,5% ao ano nos próximos cinco anos. Porém a busca pelo crescimento econômico tem um custo interno. Boa parte dos protestos sociais dos ´últimos anos na China estava relacionada com as condições de salubridade da água e com a contaminação. “O paraíso que a China aparenta ser para as empresas estrangeiras não pode ser eterno. Estamos jogando a contaminação em nosso próprio quintal e a população sofre”, afirmou Ma Jung.
(Por Antoaneta Bezlova, IPS, 22/11/2006)
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