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2006-11-21
A vitória do Partido Democrata nas eleições legislativas dos Estados Unidos e o compromisso, assumido por países industrializados e países em desenvolvimento, de discutir a partir de 2008 novas metas para o Protocolo de Kyoto, deram um tom otimista ao encerramento da 12ª Conferência das Partes da Convenção sobre Mudanças Climáticas da ONU (COP-12), que aconteceu em Nairobi, no Quênia.

O encontro de cúpula reuniu mais de 70 ministros, entre eles a brasileira Marina Silva, e, é verdade, não apresentou nenhum resultado prático imediato. Dessa vez, no entanto, os governantes não postergaram indefinidamente a discussão e estabeleceram um calendário de negociações que começa no ano que vem, o que pressupõe um engajamento verdadeiro dos países.

De acordo com a decisão da COP-12, os países devem, já no início de 2007, “discutir internamente os prós e os contras do Protocolo de Kyoto” e iniciar as reuniões multilaterais de negociação com vistas à COP-13 que acontecerá em Bali, na Indonésia. O objetivo é já ter traçadas em 2008 as linhas gerais das metas e compromissos a serem estabelecidos para a segunda fase do protocolo, que deverá começar a ser posta em prática em 2012.

A expectativa é que os 35 países industrializados que hoje assinam o protocolo (Japão, Nova Zelândia e União Européia), assumam compromissos ainda maiores na luta contra o aquecimento global. Da parte dos países em desenvolvimento, o que se espera é que os mais expressivos (e maiores emissores de gases de efeito estufa), como China, Brasil e Índia, assumam também metas concretas de redução para suas emissões a partir de 2012.

Muitos temiam que a pressão política dos países industrializados que não assinam o Protocolo de Kyoto (Estados Unidos, Austrália e Canadá) pudesse influenciar os demais países ricos que assinam o documento a abandoná-lo de vez, mas não foi isso o que aconteceu, apesar de não ter sido realizada em Nairobi a revisão do Protocolo prevista em seu Artigo 9.

Para o ambientalista Mark Lutes, que é integrante da rede Climate Action Network (CAN) e acompanhou a COP-12 como representante da ONG brasileira Vitae Civilis, a conferência “teve alguns avanços”, apesar do “processo ser muito lento”. Ele se diz otimista pelo simples fato de não ter ocorrido retrocesso nas discussões: “As discussões concretas foram jogadas para mais tarde, mas pior seria se houvesse alguma decisão que impedisse a revisão das metas do Protocolo. Felizmente, isso não ocorreu”.

Lutes ressalta que o calendário de discussões estabelecido no Quênia prevê reuniões das comissões preparatórias já em março do ano que vem, numa rapidez que, segundo ele, torna viável o avanço das negociações: “Esse calendário torna possível, em tese, terminar um pacote global de compromissos e contribuições dos países industrializados e terminar a negociação até 2008, que é o limite para evitar interrupções do Protocolo depois de 2012”, disse.

O ambientalista afirma considerar importante que os países se preparem de fato para fazer as negociações avançarem: “É preciso iniciar as discussões sobre a revisão prevista no Artigo 9 do Protocolo já na COP do ano que vem”.

Brasil muda de rumo
O Brasil foi um dos destaques da COP-12 e marcou sua presença com uma notável mudança de rumo no meio da conferência. Autor da proposta de criação de um mecanismo de incentivos financeiros para estimular os países em desenvolvimento a reduzir as emissões de gases de efeito estufa causadas pelo desmatamento de suas florestas, o governo brasileiro, inicialmente, não queria nem ouvir falar em assumir metas concretas de redução de emissões para si enquanto os países mais industrializados não adotassem novas metas para eles próprios. Com o avanço das negociações, no entanto, o Brasil foi um dos países que concordou com a proposta de revisão do Protocolo de Kyoto em 2008.

Mark Lutes vê a mudança de atitude do Brasil como fundamental para o acordo selado em Nairobi: “O Brasil, no início, só admitia uma revisão breve e reduzida do Artigo 9, mas depois aceitou a proposta de revisão, que se pretende mais ampla, em 2008. Agora o Brasil está mais bem posicionado para cobrar com mais intensidade os países industrializados”, disse. Lutes, no entanto, parece não levar muito a sério a proposta do governo brasileiro para estimular a redução do desmatamento nos países em desenvolvimento: “O Brasil preferiu apresentar sua proposta num fórum, o de diálogos, que não interfere diretamente no Protocolo de Kyoto e apenas sugere medidas de longo prazo a serem aplicadas no âmbito da Convenção sobre Mudanças Climáticas da ONU. Uma das resoluções desse fórum de diálogos é não criar nenhum novo compromisso. Por isso, enquanto continuar aí, a proposta pode ser um blá-blá-blá que não vai dar em nada”.

EUA de volta?
Um fator externo que parece ter contribuído para que as negociações na COP-12 chegassem a bom termo foi o resultado das eleições legislativas nos Estados Unidos. A vitória do Partido Democrata na Câmara e no Senado reacendeu a esperança de que os EUA voltem a assumir compromissos com o Protocolo de Kyoto. Os representantes do governo norte-americano presentes a Nairobi chegaram a informar os colegas de que três parlamentares democratas já estariam redigindo uma carta na qual pediriam ao presidente George W. Bush que assumisse metas de redução dos gases de efeito estufa compatíveis com o Protocolo: “O resultado das eleições nos Estados Unidos foi considerado por todos em Nairobi como muito positivo e seu impacto sobre as negociações foi claro”, avalia Mark Lutes.

As pesquisas de opinião realizadas antes das eleições nos EUA mostraram que um dos pontos de maior insatisfação da população com Bush diz respeito à política ambiental do governo. Esse recado pode fazer com que os Democratas ajam em favor da adesão do país ao Protocolo de Kyoto. Uma mudança de opinião dos EUA poderia ter influência decisiva nos outros países considerados vilões do aquecimento global. Na Austrália, a ocorrência neste verão da maior seca dos últimos 100 anos, um efeito das mudanças climáticas em curso, só deverá reforçar a opinião pública também majoritariamente contrária ao alinhamento do primeiro-ministro John Howard com a política ambiental de Bush. No Canadá, a pressão da oposição e de parte da população pela volta ao Protocolo é forte sobre o recém-eleito primeiro-ministro conservador Stephen Harper.
(Por Maurício Thuswohl, Agência Carta Maior, 20/11/2006)

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